Bolívia deve ter 2º turno com aliado de Evo
Bolivianos vão às urnas em clima de acirramento político, economia enfraquecida pela pandemia e temores de uma nova convulsão social quase um ano após renúncia de Evo Morales; segundo turno deve ser entre socialista Luis Arce e centrista Carlos Mesa
Com um clima polarizado, a economia enfraquecida por causa da pandemia e temores de uma nova convulsão social, os bolivianos foram às urnas ontem com os candidatos pregando paz. A eleição presidencial ocorre quase um ano após uma disputa que, com suspeita de fraude, acabou na renúncia do presidente Evo Morales e sua fuga do país.
A votação, em meio a um cenário de acirramento político, ficou mais tensa poucas horas antes da eleição, quando o Tribunal Supremo Eleitoral (TSE) decidiu que não iria mais divulgar uma apuração preliminar para evitar especulações. Segundo a corte, a decisão veio pela falta de garantias de que os dados oferecidos pelo sistema Divulgação de Resultados Preliminares (Direpre) sejam iguais ao resultado final, que tem a apuração mais lenta. O presidente do TSE, Salvador Romero, disse que o sistema de apuração trará um resultado “seguro, confiável e verificável”.
Luis Arce, ex-ministro de Evo e tido como responsável pelo “milagre econômico” da gestão de Evo, e Carlos Mesa, ex-presidente de 2003 a 2005, despontavam como favoritos nas pesquisas que projetavam um segundo turno, marcado para 29 de novembro.
Os dois principais candidatos reclamaram da medida do TSE, mas acenaram para uma trégua após uma campanha marcada por fortes ataques entre ambos.
Arce afirmou que a iniciativa da corte eleitoral levantava dúvidas sobre os resultados, mas evitou críticas mais assertivas. Após votar em uma seção eleitoral do colégio Miguel de Cervantes, no centro de La Paz, ele disse que seu partido, o Movimento ao Socialismo (MAS), voltará ao poder pelo voto. “Não tomamos o poder com armas, tomamos o poder por essa via democrática.”
Coordenando a campanha de Arce da Argentina, onde vive exilado, Evo pediu que o resultado das eleições “seja respeitado por todos”. “É muito importante que todas e todos os bolivianos, além dos partidos políticos, recebam com tranquilidade cada um dos votos, tanto nas cidades como nas áreas rurais, e que o resultado das eleições seja respeitado”, disse em declaração lida diante da imprensa em Buenos Aires.
Já Mesa, candidato da Comunidade Cidadã (CC), pediu à população para que votasse como parte do compromisso do país com a democracia. “Nosso compromisso com a democracia é inalienável e esse compromisso não pode ser expresso de outra forma se não pelo voto”, disse Mesa, após votar na região de Mallasilla, também em La Paz.
Sobre a mudança na divulgação dos dados, ele pediu aos eleitores paciência. “Não é o ideal. Vamos ser pacientes e pedimos à população que o seja.”
As eleições na Bolívia devem escolher, além do presidente e vice, novos representantes do Legislativo para os próximos cinco anos. Pelo menos 35 mil policiais e militares fizeram a segurança na votação.
Mesmo com o aceno de uma trégua, a população temia ontem uma repetição do que ocorreu no ano passado depois de divulgado o resultado, quando conflitos nas ruas deixaram pelo menos 20 mortos. “Tenho medo do pior. Há boatos que nos assustam”, disse Virginia Luna, de 41 anos, em frente ao colégio Agustín Aspiazu em La Paz.
“É o fim de um ciclo do governo de Evo Morales e da crise política.
Espera-se agora um fortalecimento das instituições”, disse o cientista político Carlos Cordero, da Universidade Católica Boliviana.
Pandemia. A pandemia mudou a forma de votar na Bolívia. Deni Blanco, por exemplo, costumava vender comida do lado de fora das seções de votação em La Paz. Dessa vez, vendeao u canetas. “Minha irmã viu na TV que desta vez cada eleitor deveria trazer sua própria caneta para votar.”, disse Blanco, em um local de votação na Ciudadela Ferroviaria, região pobre de La Paz. Em duas horas, ela vendeu 50 unidades. De acordo com números oficiais, 8.463 bolivianos morreram em decorrência da covid-19. O país tem a 7.ª maior taxa de mortalidade per capita do mundo pela doença.
Com filas de até 3 horas, foi difícil manter o distanciamento em La Paz. Para votar, os eleitores teriam de estar de máscaras. Eles foram divididos em grupos da manhã e da tarde. Os eleitores também costumavam colocar os dedos em uma tinta roxa para tirar a impressão digital. Dessa vez, o próprio eleitor deveria usar uma haste com algodão para passar a tinta. “Pessoas como eu podem molhar o dedo direto, afinal não estou doente”, disse Deisy Mamani, eleitora da zona sul de La Paz.
• Regras Para ser eleito em 1.º turno, é preciso ter mais de 50% dos votos ou 40% com diferença de 10 pontos para o 2º.