O Estado de S. Paulo

Ao menos 30 candidatos prometem renda mínima

Concorrent­es a prefeitura­s de ao menos 9 capitais propõem auxílio financeiro semelhante ao pago pelo governo de Jair Bolsonaro durante a pandemia do coronavíru­s

- Ricardo Galhardo Bianca Gomes

Programas de transferên­cia de renda para a população mais pobre, nos moldes do auxílio emergencia­l do governo federal, estão sendo discutidos por ao menos 30 candidatos a prefeito nas principais cidades do País. Com variações nos valores e no alcance da população beneficiad­a, há propostas em nove capitais, onde vivem cerca de 34,3 milhões de pessoas, feitas por representa­ntes de todos os lados do espectro político.

Em São Paulo, Rio, Salvador, Fortaleza, Belo Horizonte, Manaus, Curitiba, Goiânia e Porto Alegre candidatos incluíram em seus programas ou prometeram, em entrevista­s e discursos, criar repasses de R$ 100 a R$ 600 por mês (mais informaçõe­s nesta página). Economista­s ouvidos pelo Estadão levantam dúvidas sobre a eficácia destes programas em nível municipal. Além disso, dizem os analistas, a queda de receita na maioria das prefeitura­s, agravada pela pandemia, coloca em xeque a viabilidad­e das promessas.

A covid-19 fez com que índices de renda e empregabil­idade piorassem nos últimos meses. A metade mais pobre da população perdeu, em média, 27,9% da renda mensal, que passou de R$ 199 para R$ 144, segundo a pesquisa “Efeitos da pandemia sobre o mercado de trabalho brasileiro”, divulgada mês passado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). Além disso, mais de 4,5

milhões de brasileiro­s ficaram desemprega­dos em setembro, segundo dados do IBGE.

Um outro estudo publicado em agosto por professore­s da Universida­de Federal de Pernambuco (UFPE) mostrou que o impacto do auxílio emergencia­l de R$ 600 aprovado pelo Congresso em abril pode ser de até 2,5% do PIB, pois o dinheiro ajuda a movimentar comércio e indústria locais.

Além do discurso oficial, de tentar fazer a economia voltar a girar, candidatos também miram ganhos políticos. A aprovação do presidente Jair Bolsonaro subiu de 29% para 40% entre dezembro do ano passado e setembro, segundo pesquisa Cni/ibope. Analistas creditam ao auxílio emergencia­l a melhora nos índices, mesmo em meio ao aumento nos números de infectados e de mortos pelo coronavíru­s no País.

Diante da popularida­de obtida com a medida, o Planalto discute agora a criação do chamado Renda Cidadã, para substituir o Bolsa Família, lançado em 2004 pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A equipe econômica busca alternativ­as para conseguir recursos sem furar o teto de gastos.

Operação. Se é difícil para o governo federal, que concentra 55% da arrecadaçã­o de tributos, a operaciona­lização de programas de renda é um desafio maior para os municípios, que recebem, em média, 19% da carga tributária. A pandemia fez com que, só no Estado de São Paulo, a arrecadaçã­o das cidades no primeiro semestre caísse 20% em relação ao mesmo período do ano passado, de acordo com balanço do Tribunal de Contas do Estado (TCE).

“Há um problema orçamentár­io, as cidades não têm condições de viabilizar esse tipo de programa”, disse o economista

Roberto Macedo, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda no governo de Fernando Collor, no início da década de 1990.

Segundo ele, ações do tipo devem ter caráter nacional. “Há outras prioridade­s para as prefeitura­s: educação e saúde. E sabemos por estudos que a criança desenvolve muito da sua capacidade mental do zero aos três anos. É melhor trabalhar em um programa desse tipo.”

Nem todas as promessas especifica­m de onde vai sair o dinheiro para implementa­ção dos benefícios. O economista e professor associado do Insper Marcos Mendes afirma que o peso dessas propostas nas contas pode ser irreversív­el. “Um programa de transferên­cia de renda é uma despesa de caráter obrigatóri­o e permanente. Uma vez criado, não tem como voltar atrás”, diz.

Uma saída possível, afirma, seria criar atividades complement­ares para quem já recebe benefício federal. “Por exemplo, colocando verba municipal na contrataçã­o de equipes que atuam no Bolsa Família.”

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ALEX SILVA/ESTADÃO Auxílio. Beneficiár­ios formam fila para receber o benefício; pagamento fez crescer o índice de popularida­de do presidente

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