O Estado de S. Paulo

MARQUETEIR­O QUER REEDITAR ‘AZARÃO’ DE 1988

Chico Malfitani aposta na experiênci­a da eleição de Erundina para moldar campanha de Boulos

- Ricardo Galhardo

Aescolha de Chico Malfitani, 70 anos, para comandar o marketing da campanha de Guilherme Boulos (PSOL) foi selada durante uma feijoada no boteco em frente à Estação Butantã do Metrô. Nada mais natural. Afinal, Boulos e Malfitani se conheceram nas arquibanca­das do Pacaembu, durante um jogo do Corinthian­s, décadas atrás.

O hoje candidato à Prefeitura de São Paulo era um garoto que frequentav­a o estádio com o pai, o infectolog­ista Marcos Boulos, e Malfitani era fundador da Gaviões da Fiel e paciente do “doutor Boulos”. “Na feijoada, Chico deu uns toques sobre a campanha. A gente tinha uma linha mais de falar das propostas e ele disse: ‘Não, tem que falar de você, da Erundina e dos valores pessoais de vocês dois’”, relata Boulos.

Na campanha, Malfitani é o responsáve­l por fazer a ponte entre o candidato, de 38 anos, e a vice, de 85. O marqueteir­o conduziu a vitoriosa campanha de Luiza Erundina em 1988, pelo PT, e foi secretário municipal de Comunicaçã­o na gestão.

Em conversa recente com o candidato, Malfitani não conteve as lágrimas ao recordar a eleição de 1988 – Boulos chorou com ele. Quase ninguém acreditava na eleição de Erundina, nem o PT. Mulher, nordestina, esquerdist­a “radical”, desconheci­da por grande parte do eleitorado, Erundina foi o azarão que bateu nomes fortes como Paulo Maluf (então no PDS) e José Serra (PSDB). “Foi a coisa mais emocionant­e da minha vida depois do nascimento dos meus filhos”, diz Malfitani.

Para o marqueteir­o, a comparação com a campanha de Boulos é inevitável. O candidato do PSOL também tem estrutura precária, poucos recursos, mas está em terceiro lugar nas pesquisas. Malfitani também enxerga semelhança­s entre os perfis de Boulos e Erundina. “A personalid­ade dos dois é muito parecida. A diferença é que a Erundina veio da Paraíba para São Paulo e o Guilherme fez o caminho contrário, saiu de Pinheiros para ir morar na periferia. Admiro muito isso.”

Essas semelhança­s têm sido exploradas pela campanha. O PSOL tem apenas 17 segundos nos blocos do horário eleitoral. “É uma campanha tão dura quanto a de 1988, mas também não vou subestimar. Tenho 85 comerciais em 30 dias. Isso pode mexer com a cabeça das pessoas”, disse o marqueteir­o.

Jornalista com passagens pela Veja , Folha de S.paulo, TV Globo, Bandeirant­es e Record, Malfitani se aproximou do PT cobrindo as históricas greves do ABC lideradas por Luiz Inácio Lula da Silva e acabou trocando a profissão pela militância. A estreia como marqueteir­o foi em 1984, no primeiro programa nacional do PT na TV, um “latifúndio” de uma hora em horário nobre que serviu de cartão de visitas do partido para o eleitorado brasileiro.

O programa credenciou Malfitani a assumir a campanha de Eduardo Suplicy à Prefeitura no ano seguinte. Ele ficou em terceiro lugar, atrás de Jânio Quadros (PTB) e Fernando Henrique (PSDB), mas o resultado foi fundamenta­l para o cresciment­o do PT nos anos seguintes.

A carreira de Malfitani começou em 1979, em plena ditadura militar. Ele e o também jornalista Antônio Carlos Fon levaram para o Morumbi lotado uma faixa na qual se lia: “Anistia ampla, geral e irrestrita”. A faixa aberta na arquibanca­da à revelia da Polícia Militar escancarou para todo o Brasil a realidade dos exilados políticos e faz parte da história da resistênci­a à ditadura.

Afastado das campanhas nos últimos anos (a última foi a de Suplicy para o Senado em 2018), Malfitani é presença certa em qualquer manifestaç­ão da esquerda desde o impeachmen­t de Dilma Rousseff, em 2016. Segundo Boulos, a participaç­ão dele em sua campanha é mais um ato de militância do que uma atividade profission­al. “Naquela feijoada ele me disse que queria ajudar mesmo que não recebesse um real por isso. É claro que eu topei.”

“A personalid­ade dos dois é muito parecida. A diferença é que a Erundina veio da Paraíba para São Paulo e o Guilherme fez o caminho contrário, saiu de Pinheiros para ir morar na periferia. Admiro muito isso.” Chico Malfitani

MARQUETEIR­O

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DANIEL TEIXEIRA/ESTADÃO Carreira. Malfitani se aproximou do PT ao cobrir as greves do ABC lideradas por Lula e trocou o jornalismo pela militância

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