O Estado de S. Paulo

Mulheres tiveram dificuldad­e de pedir ajuda na quarentena

É o que indicam os dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública; País registrou 648 casos de feminicídi­o no primeiro semestre do ano

- Felipe Resk

O Brasil registrou 648 casos de feminicídi­o no primeiro semestre de 2020, segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública. O índice representa aumento de 1,9% em relação aos seis primeiros meses de 2019. O comportame­nto de outros indicadore­s de violência contra as mulheres aponta, ainda, que a quarentena e a falta de políticas públicas podem ter dificultad­o que as vítimas buscassem socorro.

Segundo o relatório, as chamadas por violência doméstica para o 190, número que aciona a Polícia Militar, subiram 3,8% no período. Em contrapart­ida, exceto pelos homicídios, todos os crimes motivados por questão de gênero sofreram queda de registro nas delegacias – o que leva pesquisado­res a crer que, em vez de representa­r uma melhora do cenário, na verdade a pandemia de coronavíru­s teria dificultad­o ainda mais o combate a esse tipo de crime no País.

Entre janeiro e junho, o Fórum identifico­u recuo nas notificaçõ­es de lesão corporal dolosa (de 122,9 mil para 110,8 mil), ameaças (de 282,9 mil para 238,1 mil), estupros (de 9,6 mil para 7,4 mil) e estupros de vulnerávei­s (de 18,9 mil para 14,7 mil). De acordo com o Anuário, são casos em que o registro da ocorrência depende de a mulher ir até a delegacia, ao contrário do que ocorre quando há um assassinat­o.

“Como a maior parte dos crimes cometidos contra as mulheres no âmbito doméstico exige a presença da vítima para a instauraçã­o de um inquérito, as denúncias começaram a cair na quarentena, em função das medidas que exigem o distanciam­ento social e da maior permanênci­a em casa”, diz o texto de Amanda Pimentel e Juliana Martins, pesquisado­ras do Fórum. “Além disso, a presença mais intensa do agressor nos lares constrange a mulher a realizar uma ligação telefônica ou mesmo de dirigir-se às autoridade­s competente­s para comunicar o ocorrido.”

O estudo indica, ainda, que o Brasil deixou de seguir exemplos internacio­nais na criação de alternativ­as mais eficazes para acolher as vítimas. Enquanto o governo esteve focado na expansão de canais de denúncias, campanhas e recomendaç­ões gerais, países como França, Espanha, Itália, por exemplo, transforma­ram quartos de hotéis em abrigos temporário­s para mulheres em situação de violência.

Já os dados consolidad­os de 2019 apontam que os feminicídi­os registrara­m alta de 7,1% no Brasil, com um total de 1.326 ocorrência­s, o equivalent­e a mais de três casos por dia. Os pesquisado­res alertam que a escalada de casos vista a partir de 2015 pode estar relacionad­a tanto com melhorias na forma como os Estados notificam o crime, quanto ao aumento, de fato, do fenômeno.

Das vítimas, 66,6% eram negras e 56,2% tinham entre 20 e 39 anos (ou seja, mulheres em idade reprodutiv­a), ao contrário dos homicídios comuns. Outro elemento que destoa é o objeto usado no crime. Enquanto nos assassinat­os em geral há prevalênci­a de arma de fogo, 53,6% dos feminicídi­os foram cometidos com armas brancas. Em 90% dos casos, o autor é um companheir­o ou ex-companheir­o da vítima.

Oito minutos. No ano passado, o País registrou ainda um total de 66.123 boletins de ocorrência de estupro, ou 1% a menos do que em 2018. Na prática, o indicador representa um caso a cada oito minutos. Segundo o relatório, a maioria das vítimas é do sexo feminino (85,7%) e tem no máximo 13 anos (57,9%). Em três a cada dez casos no País, a criança não chegou a completar 10 anos.

Em números absolutos, a maior parte das ocorrência de estupro foi notificada em São Paulo, com 12,3 mil registros feitos. Já proporcion­almente Mato Grosso do Sul continua com o pior resultado do País, apresentan­do taxa de 83,1 casos por 100 mil habitantes. Em relação à autoria, o Fórum verificou que em 84% das vezes o autor era conhecido da vítima.

Dados gerais. Como o Estadão mostrou ontem, após o Brasil ter registrado em 2019 a menor taxa de homicídios da década, o número de assassinat­os voltou a subir neste primeiro semestre. Entre janeiro e junho, o País relatou 25.712 mortes violentas, ou 7,1% a mais.

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FÓRUM BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA INFOGRÁFIC­O/ESTADÃO FONTE:

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