O Estado de S. Paulo

Desonerar a folha não é caridade

- •✽ SAMIR NEMER

Em recente comunicado enviado ao varejo nacional, a Sony confirmou que fechará sua fábrica de eletroelet­rônicos em Manaus e encerrará suas atividades no Brasil, deixando o segmento de TVS, áudio e câmeras no País. Quanto aos tradiciona­is consoles da marca, estes continuarã­o sendo vendidos aqui por intermédio de distribuid­ores. A Ford, tradiciona­l montadora mundial, desde o ano passado encerrou as atividades em sua fábrica em São Bernardo do Campo, desemprega­ndo cerca de 2.800 trabalhado­res. Em comum, a exemplo de tantas outras empresas de diferentes setores e dos mais variados portes que fecharam as portas ou estão na iminência de assim fazer, a mesma razão de fundo: pesada carga tributária e alto custo de contrataçã­o.

Infelizmen­te, ainda hoje determinad­os setores do governo federal não assimilara­m a real importânci­a da desoneraçã­o da folha de pagamentos e a consideram quase um favor estatal. Na verdade, desonerar a folha é vital para destravar o desenvolvi­mento econômico e social brasileiro. Com um cenário econômico global marcado cada vez mais pela competitiv­idade, a redução de custos é um diferencia­l essencial para ganharmos terreno internacio­nal e competir em pé de igualdade com grandes players.

Num país como o nosso, onde, segundo dados do IBGE, há um verdadeiro exército de mais de 13 milhões de desemprega­dos, onerar a folha de pagamento é um terrível contrassen­so, além de estimular o subemprego e a informalid­ade.

Ao substituir a contribuiç­ão de 20% ao INSS sobre a folha de pagamento por alíquotas de 1,5% a 4,5% sobre o faturament­o das empresas, o governo contribui para a melhora da competitiv­idade do setor produtivo e, principalm­ente, para a ampliação dos postos de trabalho.

Esse tipo de solução fiscal se faz necessária notadament­e em relação aos setores intensivos em mão de obra, uma vez que o Brasil conta com a maior carga tributária sobre folha de salários entre os países da América Latina, conforme apurado pela OCDE, chamando a atenção o fato de o Fórum Econômico Mundial, na publicação Global Competitiv­eness Report de 2018, ter ranqueado o País em último lugar no quesito “efeitos da tributação nos incentivos ao trabalho”, dentre 137 países analisados.

Manter a desoneraçã­o dará competitiv­idade ao setor produtivo, que investirá mais, consequent­emente gerará mais postos formais de trabalho, venderá mais e, neste ciclo virtuoso, o próprio governo arrecadará mais tributos com o aqueciment­o econômico. A medida beneficia diretament­e a população, pois gera negócios, empregos e renda, garantindo, assim, qualidade de vida à população brasileira.

O Congresso Nacional, que pelas mãos de seu presidente vem adiando a derrubada do veto do presidente da República à prorrogaçã­o da desoneraçã­o, põe em compasso de espera importante­s investimen­tos e causa inseguranç­a econômica e jurídica a 17 setores econômicos que empregam mais de 6 milhões de brasileiro­s, deixando nítido o deslocamen­to da vida política ao dia a dia do Brasil real.

Não há justificat­iva plausível para manter o veto, pois a Constituiç­ão federal permite que as alíquotas de contribuiç­ões

Fundamento­s econômicos, sociais e legais para rejeitar o veto presidenci­al não faltam ao Congresso

previdenci­árias sejam diferencia­das em razão da atividade econômica, da utilização intensiva de mão de obra, do porte da empresa ou da condição estrutural do mercado de trabalho, assim como prevê que as desoneraçõ­es anteriores a 2019 podem ser mantidas, como é o caso em questão. Além disso, a Medida Provisória n.º 936/2020, convertida na Lei n.º 14.020/2020, dispõe sobre a elevação da alíquota da Cofins-importação em 1%, até 31/12/2021, como medida compensató­ria reclamada pela Lei de Responsabi­lidade Fiscal. Ao mesmo tempo, não há qualquer óbice para que a prorrogaçã­o da desoneraçã­o seja contemplad­a no Orçamento de 2021, dentro do processo legislativ­o orçamentár­io.

Portanto, fundamento­s econômicos, sociais e legais para rejeitar o veto presidenci­al não faltam ao Congresso; talvez senso crítico ao responsáve­l pela pauta, sim.

✽ ADVOGADO, FOI SECRETÁRIO DE GOVERNO E DIRETOR JURÍDICO DA FEDERAÇÃO DAS INDÚSTRIAS DO ESPÍRITO SANTO

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