O Estado de S. Paulo

Filho assume vaga do ‘senador da cueca’

Chico Rodrigues amplia licença para 121 dias e suplente pode assumir vaga do pai

- / DANIEL WETERMAN, FELIPE FRAZÃO e BRENO PIRES

Ex-vice-líder do governo, Chico Rodrigues (DEM-RR) pediu licença por 121 dias, o que abre espaço para o suplente, Pedro Rodrigues (DEM-RR), seu filho, assumir.

A cúpula do Senado fez uma manobra para salvar o mandato do senador Chico Rodrigues (DEM-RR), flagrado na semana passada pela Polícia Federal com R$ 33 mil escondidos na cueca. Ex-vice-líder do governo de Jair Bolsonaro na Casa, Rodrigues combinou o jogo e pediu ontem licença de 121 dias, o que levou o Supremo Tribunal Federal (STF) a suspender a sessão marcada para julgar o seu afastament­o.

O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), que tenta aval da Corte para se reeleger ao comando da Casa em 2021, bancou a operação para proteger o colega de partido e, ainda, evitou se compromete­r com a reabertura do Conselho de Ética. O colegiado, paralisado há sete meses por causa da pandemia do coronavíru­s, é responsáve­l por decidir se Rodrigues será ou não cassado. “Eu não posso, por uma conveniênc­ia ou não de um assunto ou outro, decidir sozinho. Tenho que dividir com todos que estão preocupado­s com o coronavíru­s”, disse Alcolumbre.

A licença com prazo de 121 dias também foi necessária para que o primeiro-suplente de Rodrigues seja convocado a assumir o cargo. Com a estratégia, o senador deixou o mandato em casa, já que o “reserva” é seu filho, Pedro Arthur Ferreira Rodrigues, de 41 anos. Pelo regimento do Senado, o suplente só assume quando o afastament­o do titular ultrapassa 120 dias.

Administra­dor de empresas, Pedro vai estrear em cargo eletivo recebendo salário de R$ 33,7 mil. Além disso, poderá herdar o imóvel funcional usado pelo pai em Brasília ou fazer uso de auxílio-moradia (R$ 5,5 mil por mês). Ao deixar Boa Vista (RR), embolsará o auxílio-mudança equivalent­e a um salário. E, no cargo, terá direito a ressarcime­nto de despesas médicas e à cota de R$ 40,7 mil por mês, além de escritório de apoio em Roraima e funcionári­os de gabinete.

Pedro é sócio do pai em empresa de terraplena­gem. A San Sebastian Construçõe­s, Transporte­s, Terraplana­gem e Agropecuár­ia já foi alvo de cobrança de ICMS atrasado pelo governo do Estado e consta na dívida ativa da União, com débitos tributário­s de R$ 497 mil. Ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) ele informou em 2018 um patrimônio de R$ 70 mil, enquanto o pai declarou R$ 2 milhões. O Estadão não localizou Pedro. A expectativ­a no gabinete de Rodrigues é de que a substituiç­ão não ocorra já. A intenção é ganhar tempo para o assunto esfriar.

Alcolumbre não só ajudou a reduzir a pressão da opinião pública sobre o Senado como segura o funcioname­nto do Conselho de Ética. Senadores da oposição e do grupo dissidente Muda Senado já manifestar­am voto a favor da perda do mandato de Rodrigues. Mesmo os petistas, no entanto, apoiam o plano de Alcolumbre para ser reconduzid­o ao comando do Senado – uma articulaçã­o que depende da bênção do Supremo.

Com a licença de Rodrigues, o ministro do STF Luís Roberto Barroso suspendeu a decisão que havia tomado, afastando o senador por 90 dias. Dessa forma, o plenário da Corte cancelou o julgamento sobre o caso.

Suspeito de desviar recursos federais destinados a ações na pandemia, Rodrigues diz que o dinheiro encontrado pela PF tem origem lícita e serviria para pagar funcionári­os. Em mensagem a colegas, ele afirmou ontem que não é corrupto. “Em um ato impulsivo, acordado pela polícia, de pijama, assustado com a presença de estranhos em meu quarto, tive a infelicida­de de tomar a decisão mais irracional de toda a minha vida”, escreveu.

Blindagem. O presidente do Conselho de Ética, senador Jayme Campos (DEM-MT), admitiu que o desgaste com o caso Rodrigues recai sobre todos no Congresso. “A Casa não vai ficar imersa e tomará as providênci­as respeitand­o o devido processo legal”, afirmou Campos, sem dar prazos. “Não adianta a gente fazer o papel de avestruz: enfiar a cabeça na terra e deixar o rabo para fora”, disse o senador Major Olimpio (PSL-SP), um dos que empunham a bandeira anticorrup­ção no grupo Muda Senado, ao cobrar que a Casa discuta o assunto imediatame­nte.

Não é a primeira vez, no entanto, que o Senado protege os seus. Em 2017, a Casa derrubou o afastament­o do ex-senador e atual deputado Aécio Neves (PSDBMG), flagrado no escândalo da JBS. No ano anterior, os parlamenta­res descumprir­am liminar do ministro Marco Aurélio Mello que ordenava o afastament­o do então presidente do Senado, Renan Calheiros (MDB-AL), réu por peculato.

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WALDEMIR BARRETO/AGÊNCIA SENADO - 10/4/2019 Alvo. Rodrigues pediu afastament­o do cargo após ser flagrado com dinheiro na cueca durante operação da Polícia Federal

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