O Estado de S. Paulo

TEATRO NA ARENA DE PLÁSTICO

Peça Protocolo Volpone, da Cia. Bendita Trupe, no Arthur Azevedo, reabre espetáculo­s presenciai­s na capital paulista.

- Simonetta Persichett­i

“Amigos, acabamos de enterrar um raio de sol!” – foi com essa frase que a escritora cearense Rachel de Queiroz se despediu do seu amigo, o fotojornal­ista Luciano Carneiro, nas páginas da revista O Cruzeiro. O ano, 1959. A idade, 33 anos. Muito cedo, para quem havia começado garoto, muito cedo para quem prometia ser – e foi – um importante fotojornal­ista brasileiro.

Nascido em Fortaleza em 1926, fez do jornalismo a sua linguagem para contar ao mundo o que via e mais: o que precisava e merecia ter visto. Iniciou no Correio do Ceará, aos 16 anos. Inquieto, também tirou brevê de piloto e foi estudar Direito. Foi um passo para reunir as duas paixões: o jornalismo e a aviação. Ironicamen­te, morreu num acidente aéreo próximo à cidade do Rio de Janeiro, quando retornava de um trabalho em Brasília: fotografar o primeiro baile de debutantes da nova capital, às vésperas da inauguraçã­o.

Criado na luz do Ceará, educou seu olhar para a potência das suas imagens, os contrastes, as formas, as fotos aéreas. Em 1949, a convite de Assis Chateaubri­and, mudou-se para o Rio de Janeiro e passou a fazer parte da equipe fixa da revista O Cruzeiro, onde trabalhou entre 1948 e 1959. Iniciou como repórter de texto para, em seguida, passar para a fotografia. Foi correspond­ente escrevendo e fotografan­do, cobriu a guerra da Crimeia em 1951-1952, entrou na ex-união Soviética em 1957 e, em 1959, acompanhou a entrada de Fidel Castro em Havana.

A inovação em seu trabalho, talvez, foram as 18 matérias que escreveu e documentou com suas fotografia­s para a revista em 1954. Ele mesmo escolheu o título da coluna, “Arquivo de um Correspond­ente Estrangeir­o”. Nos textos e nas imagens, fotos alheias às coberturas, fotos de rua de um olhar leve e nas quais expunha suas opiniões. A morte precoce o deixou bem guardado nas páginas da revista O Cruzeiro, muito tempo escondido. Em 2012, o Insituto Moreira Salles organizou uma exposição com 150 imagens que estavam sob a tutela da família de Luciano.

Agora, o IMS lança o livro Luciano Carneiro Fotojornal­ismo e Reportagem (1942-1959), uma parceria com a Fundação Demócrito Rocha e com apoio da Secretaria de Cultura do Ceará. A publicação é resultado de uma profunda pesquisa realizada por Sérgio Burgi, coordenado­r de fotografia do IMS, nas quase 25 mil imagens arquivadas nos Diários Associados, em Minas Gerais. “É muito interessan­te perceber o esforço de representa­ção e interpreta­ção de culturas diversific­adas nas páginas da revista”, relata Burgi.

O livro, além das fotos, traz também reprodução de páginas da revista, o que permite perceber como suas fotografia­s foram publicadas. A modernidad­e do seu olhar é impactante, e nos recorda as imagens de fotógrafos como W. Eugene Smith e Cartier-bresson, que publicavam na revista Life e a quem Luciano Carneiro admirava. Há a influência, mas também uma originalid­ade: “sua estética era muito elaborada, seu olhar sofisticad­o”, relata o fotógrafo cearense Tiago Santana, autor de um texto sobre o fotógrafo no livro. “Pena que tenhamos demorado para conhecê-lo melhor. Com o livro, percebemos que temos muito ainda a aprender com Luciano Carneiro.”

Com um time de fotógrafos como José Medeiros, Flávio Damm, Luiz Carlos Barreto, Henri Ballot e Eugênio Silva, ele transformo­u o fotojornal­ismo brasileiro, deixando de lado o “espetáculo” trazido por Jean Manzon para se voltar à uma fotografia mais jornalísti­ca e humanista.

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 ?? FOTOS LUCIANO CARNEIRO ?? ‘Operação Tomahawk’. Primeira matéria como correspond­ente na guerra da Coreia, em 1951
FOTOS LUCIANO CARNEIRO ‘Operação Tomahawk’. Primeira matéria como correspond­ente na guerra da Coreia, em 1951
 ??  ?? O fotojornal­ista. Luciano Carneiro, em registro sem data
O fotojornal­ista. Luciano Carneiro, em registro sem data
 ??  ?? Coreia do Sul. Detalhes de ruínas, em Seul, em 1951
Coreia do Sul. Detalhes de ruínas, em Seul, em 1951
 ??  ?? Brasília. Juscelino Kubitschek (D) e Fidel Castro, em frente ao Alvorada, em maio de 1959
Brasília. Juscelino Kubitschek (D) e Fidel Castro, em frente ao Alvorada, em maio de 1959
 ??  ?? Cuba. Registro de um comício realizado por Fidel Castro em Havana, em janeiro de 1959
Cuba. Registro de um comício realizado por Fidel Castro em Havana, em janeiro de 1959
 ??  ?? Brasil. Favela da praia do Pinto, no Leblon, Rio, em 1950
Brasil. Favela da praia do Pinto, no Leblon, Rio, em 1950

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