O Estado de S. Paulo

UM PALCO POSSÍVEL

Peça ‘Protocolo Volpone’ reabre teatro presencial na capital paulista

- Leandro Nunes

Enquanto aguardava o começo do espetáculo Protocolo Volpone, um grupo de pessoas falava sobre modelos de máscaras para usar no dia a dia. Em outra parte da fila, o assunto era o próximo evento cultural que cada um fará na fase verde de flexibiliz­ação da quarentena. No centro do espaço cênico, o estacionam­ento do Teatro Arthur Azevedo, em São Paulo, o elenco da Cia Bendita Trupe permanecia em silêncio – um misto de concentraç­ão, ansiedade e até emoção.

A espera chegou ao fim. O terceiro sinal toca para o teatro na quarta, 21, com a estreia da montagem, presencial, com público e artistas reunidos pela primeira vez desde março, quando a quarentena foi decretada no País.

No final da fila de todas as atrações culturais, o teatro travou uma longa e dinâmica batalha. Das lives virtuais até agora, os últimos meses movimentar­am a produção de Protocolo Volpone de modo inédito. “Foi um dia após o outro, com uma noite no meio”, lembrou a diretora Johana Albuquerqu­e. Até a data da pré-estreia, na sexta, 16, assistida pela reportagem, o espetáculo havia sido adiado por duas vezes. “Os artistas precisam trabalhar, e a cultura, talvez por perseguiçã­o, foi ficando de lado. Se alguém ficasse doente, a produção teria que parar. Foi o nosso pacto.”

O projeto faz parte da comemoraçã­o dos 20 anos da Cia Bendita Trupe, embora não tenha sido idealizado para estrear regado a álcool em gel e com máscaras coloridas. A comédia de Ben Jonson, de 1606, cruzou o caminho do grupo nos festejos de 70 anos do Teatro Brasileiro de Comédia. “Em uma leitura, percebemos, com o público, que havia diálogo com a atualidade”, conta a diretora. Na trama, Volpone (Daniel Alvim) é um velho rico sem filhos que finge estar à beira da morte para se divertir com os bajuladore­s que o rodeiam.

O elenco formado por Helena Ranaldi, Joca Andreazza, Luciano Gatti, Marcelo Villas Boas, Maurício de Barros, Pedro Birenbaum, Vanderlei Bernardino Sérgio Pardal e Vera Bonilha recria uma arena rodeada de cabines individuai­s, onde fica o público. Ao ar livre, a diretora conta que a peça acabou incorporan­do os protocolos de segurança na linguagem cênica. “O elencotema­ajudadaequ­ipecriativ­a, nas trocas de objetos e adereços.oálcoolemg­elintegrao­figurino e as máscaras precisaram sustentar os microfones”, explica.

De dentro da cabine transparen­te, é impossível não se sentir solitário, reconhece Johana. “A peça se tornou teatro de rua, em que é preciso estabelece­r relação direta com a plateia.”

A cenografia de Julio Dojcsar, a luz de Aline Santini e a música de Pedro Birenbaum sinalizam as dinâmicas da cena, enquanto o barulho dos carros é constante na Avenida Paes de Barros. O palco voltou a ser possível. “Não queremos provar nada”, defende Johana. “A peça é um protótipo de um teatro sem vacina e a cultura precisa reinventar alternativ­as.”

 ?? FOTOS TABA BENEDICTO/ESTADÃO ?? Roupa nova. Máscaras coloridas e álcool em gel foram incorporad­os ao figurino do elenco da Cia Bendita Trupe, na encenação da comédia de Ben Jonson
FOTOS TABA BENEDICTO/ESTADÃO Roupa nova. Máscaras coloridas e álcool em gel foram incorporad­os ao figurino do elenco da Cia Bendita Trupe, na encenação da comédia de Ben Jonson
 ??  ?? Arena de plástico. Plateia assiste ao espetáculo dentro de cabines individuai­s higienizad­as
Arena de plástico. Plateia assiste ao espetáculo dentro de cabines individuai­s higienizad­as

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil