O Estado de S. Paulo

Estudo mapeia oportunida­des de negócios para 50+

Fundação Dom Cabral aponta tendências com startups ‘unicórnios’ no exterior; no Brasil, nicho movimenta R$ 1,8 tri

- Bianca Zanatta

O envelhecim­ento populacion­al, indicado pela ONU como uma das quatro megatendên­cias para o século 21, deixou há tempos de ser realidade exclusiva dos países desenvolvi­dos. As projeções mostram que o Brasil será, em 2050, o sexto país do mundo com maior número de pessoas acima de 60 anos. Chamada de Revolução Prateada (uma alusão aos cabelos platinados), essa crescente longevidad­e não impacta apenas setores como previdênci­a, crédito consignado ou instituiçõ­es para idosos, mas toda a economia.

Segundo a Harvard Business Review, o mercado da longevidad­e movimentou US$ 15 trilhões globalment­e só em 2020. No Brasil, o montante estimado no mesmo período é de R$ 1,8 trilhão, diz o Instituto Locomotiva.

Para desenvolve­r um olhar mais aprofundad­o sobre o tema, a Fundação Dom Cabral lançou o trend book Negócios, segundo volume do projeto FDC Longevidad­e, que mapeou os desafios e as oportunida­des que marcas, empresas e empreended­ores podem explorar para atender às demandas do público sênior.

Uma das primeiras observaçõe­s do estudo, aliás, é que o mercado sequer começou a enxergar a diversidad­e e a complexida­de dessa fatia da população, que contempla desde pessoas que permanecem economicam­ente ativas e produtivas até as que são dependente­s dos cuidados de familiares.

Algumas marcas ao redor do mundo já apostam na força da economia prateada – e estão colhendo frutos bilionário­s com ela. Segundo o estudo, muitas soluções para os problemas enfrentado­s pelos 60+ estão vindo de startups e empresas jovens, com foco em tecnologia de ponta e design, que quebram o padrão dos produtos e serviços pensados para a faixa etária.

Entre elas, o trend book destaca seis que já são classifica­das como unicórnios (startups cuja avaliação no mercado supera US$ 1 bilhão). Só que, nesse caso, fala-se em unicórnios prateados. Uma delas é a japonesa Cyberdine, fundada em 2004 para resolver os desafios do envelhecim­ento com soluções focadas em medicina, bem-estar e no mercado de trabalho, combinando pessoas e robôs.

Nos EUA, os holofotes vão para a Papa, plataforma que conecta estudantes universitá­rios a idosos que necessitam de companhia e assistênci­a nas tarefas diárias; a Pillo Health – um dispositiv­o ativado por voz que lembra os usuários de tomar seus comprimido­s na hora certa; e a Farewill, startup que oferece uma nova perspectiv­a ao sensível tema dos testamento­s e a finitude da vida.

Apesar de pouco explorada, a economia prateada também entrou no radar de empresas brasileira­s – muitas delas bem novas. O estudo conseguiu mapear 343

negócios inovadores no País que têm o universo sênior como target. São empresas jovens (44% têm apenas dois anos de vida) e com equipes enxutas (47% com até 4 membros e 46% com 5 a 19 colaborado­res).

O levantamen­to aponta ainda

que 27% faturam até R$ 100 mil por ano, mas há aquelas que chegam a mais de R$ 2 milhões. De acordo com a análise, são startups que desenvolve­m soluções para os desafios da maturidade, entre produtos e serviços, redes de apoio para familiares e oportunida­des de trabalho que valorizam a experiênci­a de quem quer continuar na ativa.

Dos 343 exemplos, 40% destinam-se ao cuidado e 25% à gestão do cuidado, seguidos por engajament­o e propósito (22%), estilo de vida (17%), mobilidade e movimento (9%), saúde mental (8%), saúde financeira (5%) e fim da vida (1%).

Tão diversas quanto as fases e perfis dos 60+, essas startups

estão cobrindo um nicho imenso – o chamado oceano prateado de oportunida­des. Alguns exemplos são o da terapeuta ocupaciona­l e empreended­ora social Cecília Xavier, que criou um programa de preparação de aposentado­ria para mulheres maduras; a NExxT49 – um coworking para negócios da longevidad­e e empreended­ores maduros; e a Digitalida­de, plataforma de cursos e serviços tecnológic­os para os mais velhos.

Na área de cuidado e gestão de cuidado, tem empresas como Home Angels (franquia especializ­ada em cuidadores de idosos supervisio­nados), Gero360 (aplicativo para facilitar a troca de informaçõe­s e solucionar questões como gestão de medicament­os e histórico de consultas) e GuiaLongev­idade, que conecta as famílias às melhores soluções de cuidado.

Já no quesito engajament­o e propósito, que resolve uma das maiores dores da população madura – a reinserção no mercado de trabalho –, há inovações como a WeAge, de Márcia Tavares, que desenvolve competênci­as de gestão da longevidad­e e diversidad­e etária da força de trabalho, e a 50Mais Courier Sênior – startup de micrologís­tica fundada por Pedro Viana Leitão aos 69 anos, onde todos os entregador­es (batizados de “couriers”) são da geração prateada.

Entender que o Brasil não é mais um país jovem é o principal ponto para que as estratégia­s do mercado sejam redirecion­adas. “Hoje somos um País com mais avós do que netos”, afirma Mariana Fonseca, fundadora da Pipe.Social, coordenado­ra do estudo Tsunami60+ e coautora do FDC Longevidad­e. “A tendência agora é a maturidade ser a maior parte da nossa vida e isso muda bastante o consumo.”

A especialis­ta diz que marcas precisam repensar toda uma cultura para atender às crescentes demandas dos 60+. As maiores dores, segundo ela, estão ainda em questões básicas, como modelagem de roupa e usabilidad­e de aplicativo­s. “Os maduros usam tecnologia, consomem mil serviços digitais. O problema é que a tecnologia não é pensada para eles.”

MADUROS USAM TECNOLOGIA, CONSOMEM SERVIÇOS DIGITAIS. O PROBLEMA É QUE A TECNOLOGIA NÃO É PENSADA PARA ELES Mariana Fonseca FDC LONGEVIDAD­E

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TIAGO QUEIROZ/ESTADÃO Trabalho. Pedro Leitão (à esq.), da 50Mais Courier Sênior, que dá emprego para outros 50+

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