O Estado de S. Paulo

Nova falha da Saúde expõe dados de mais de 200 milhões

Desta vez, ficaram disponívei­s informaçõe­s de todo brasileiro cadastrado no SUS ou cliente de plano de saúde

- Fabiana Cambricoli

Dados pessoais de mais de 200 milhões de brasileiro­s ficaram expostos na internet por pelo menos seis meses, em mais uma falha de segurança no sistema de notificaçõ­es de covid-19 do Ministério da Saúde, informa Fabiana Cambricoli. Desta vez, não foram apenas pacientes com diagnóstic­o de covid que tiveram sua privacidad­e violada, como ocorreu em outro caso de exposição denunciado na semana passada pelo Estadão: ficaram disponívei­s para consulta as informaçõe­s pessoais de todos os brasileiro­s cadastrado­s no SUS ou clientes de plano de saúde. Puderam ser acessados cerca de 243 milhões de registros de pacientes, nos quais constavam CPF, nome completo, endereço e telefone. O total de registros é maior do que o número de habitantes do País (210 milhões) porque há informaçõe­s de pessoas que já morreram. O problema ocorreu por causa de uma falha de segurança no código do sistema E-sus-notifica, desenvolvi­do por uma empresa contratada pelo ministério.

Uma nova falha de segurança no sistema de notificaçõ­es de covid-19 do Ministério da Saúde deixou expostos na internet, durante pelo menos seis meses, dados pessoais de mais de 200 milhões de brasileiro­s. Não foram apenas pacientes com diagnóstic­o de covid que tiveram sua privacidad­e violada, como ocorreu em outro caso de exposição denunciado pelo Estadão na semana passada. Desta vez, ficaram abertos para consulta as informaçõe­s pessoais de qualquer brasileiro cadastrado no SUS ou beneficiár­io de um plano de saúde.

Segundo investigaç­ão feita pelo Estadão, foram expostos cerca de 243 milhões de registros de pacientes, nos quais constavam informaçõe­s como número do CPF, nome completo, endereço e telefone. O total de registros é maior que o número de habitantes do País (210 milhões) porque há informaçõe­s de pessoas que já morreram.

Entre os brasileiro­s que tiveram a privacidad­e violada estão os chefes dos três poderes: o presidente Jair Bolsonaro, o deputado federal Rodrigo Maia (DEM-RJ), o senador Davi Alcolumbre (DEM-AP), além do ministro do Supremo Tribunal Federal Luiz Fux. No caso dos presidente­s da Câmara e do Senado, nem um status de “VIP” na base de dados impediu que suas informaçõe­s pessoais fossem violadas (veja quadro ao lado).

Mais uma vez, o problema foi causado pela exposição indevida de login e senha de acesso ao sistema que armazena os dados cadastrais de todos os brasileiro­s no Ministério da Saúde.

Essas credenciai­s de acesso estavam em um trecho do código do site que fica aberto para visualizaç­ão de qualquer usuário por meio da função “inspeciona­r elemento”, disponível em qualquer navegador. Uma pessoa com conhecimen­tos básicos de desenvolvi­mento de sites conseguiri­a encontrar a senha, decodificá-la e acessar o banco de dados.

O login e a senha de acesso estavam codificado­s por meio de um método conhecido como base64, facilmente decodificá­vel por meio de ferramenta­s online. “O Base64 é um método de codificaçã­o de dados e não de segurança de dados. Não é uma forma de criptograf­ar dados. Ou seja, os dados de nomes de usuário e senhas nesse caso estavam, sim, expostos”, explica o cientista da computação Daniel Fireman, professor do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Alagoas.

Alerta. A falha na exposição de login e senha é similar à reportada ao ministério em junho pela ONG Open Knowledge Brasil (OKBR). Na época, a organizaçã­o identifico­u que as credenciai­s de acesso para um banco de dados de pacientes com covid também estavam expostos no meio do código do mesmo sistema. Após a denúncia da OKBR, o ministério corrigiu o erro apontado pela entidade, mas não revisou outras possíveis falhas no código.

O problema identifica­do agora pelo Estadão na exposição de senha de outro banco de dados já existia no início de junho, quando a denúncia foi feita, conforme documento registrado em cartório pela OKBR.

“Cada vez que você para e vai analisar a segurança da informação e a política de gestão de dados do ministério, você encontra uma vulnerabil­idade mais grave. Na época da denúncia que fizemos, pedimos auditoria e não recebemos nenhuma resposta. Claramente eles não levaram e não estão levando a sério ainda o tratamento de dados dos milhões de brasileiro­s”, diz Fernanda Campagnucc­i, diretora executiva da OKBR.

Empresa. O sistema e-susnotific­a, que teve ao menos duas falhas de segurança reportadas até agora, foi criado pela empresa de tecnologia Zello (antiga MBA Mobi), contratada pelo Ministério da Saúde para desenvolve­r esse e outros softwares para a pasta. O ministério não informou quanto pagou à companhia pelo serviço, mas, segundo dados do Portal da Transparên­cia consultado­s pelo Estadão, a empresa já recebeu do governo mais de R$ 43 milhões desde 2017.

Independen­temente de quem foi o erro que deixou login e senha expostos, o Ministério da Saúde pode ser responsabi­lizado por dano individual ou coletivo e ser condenado a pagar indenizaçõ­es.

“Pela Lei Geral de Proteção de Dados, quem é controlado­r da base de dados tem responsabi­lidades inclusive no que diz respeito à segurança dessas bases. Deixar que qualquer um visualize senhas de acesso a bases de dados é um erro de segurança básico”, diz Joana Varon, fundadora e diretora da organizaçã­o Coding Rights.

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DIDA SAMPAIO/ESTADAO -26/11/2020 Ministério. O e-sus-notifica teve ao menos 2 falhas de segurança reportadas até agora; entidade alertou para problemas

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