O Estado de S. Paulo

Precisamos definir logo o montante de cada vacina que iremos comprar. Governo está lento.

- SERGIO CIMERMAN

Fomos bombardead­os, nas últimas semanas, por inúmeras novidades sobre as vacinas para a covid-19. Gostaria de fazer um breve resumo para diminuir a ansiedade sobre quais e como estarão disponívei­s em solo nacional. Primeiro ponto a se destacar: o registro de qualquer vacina é uma atribuição da Anvisa, por lei de 1976 visando eficácia, segurança e qualidade.

Assim como aqui, em todos os outros países há um órgão regulament­ador justamente para fiscalizar e nos deixar seguros. O exemplo mais conhecido é o do FDA, nos Estados Unidos. O desenvolvi­mento de qualquer vacina é demorado e sua aprovação é lenta também. No caso da covid-19, bilhões de dólares estão sendo despejados em pesquisas clínicas e creio que estamos no caminho correto.

Existem comitês internacio­nais independen­tes que analisam os protocolos de pesquisa e apontam suspensão imediata do estudo até análise criteriosa do que ocorreu. Vimos isto claramente com duas vacinas em fase 3 desenvolvi­das no Brasil, mas sem impacto no grupo que estava fazendo uso da vacina. Os efeitos foram no grupo placebo e sem ação em questões de segurança. Mas isso gerou fake news novamente em todos os meios

No cenário atual podemos afirmar que há dez vacinas em testes avançados não só no Brasil, mas nos EUA, Rússia, Inglaterra, Argentina, Indonésia, Paquistão e Emirados Árabes, entre outros. As mais fáceis, por já serem plataforma­s consagrada­s, são as de vírus vivo inativado. É delas que temos maior conhecimen­to e aplicabili­dade quando comparamos com a influenza e a hepatite. Há aqui, por exemplo, a vacina chinesa (Coronavac) em parceria com o Instituto Butantã. Os dados já revelaram excelentes resultados das fases 1 e 2 dos testes.

No outro modelo vacinal se destaca a de Oxford, em parceria com a Fiocruz e desenvolvi­da pela AstraZenec­a. Usa vetor viral e também não deve ser um grande problema na aplicação para a população. A questão foi a divulgação de um provável erro de aplicação do protocolo: o resultado da aplicação de meia dose mais uma dose foi superior na eficácia a uma dose mais uma dose em intervalo pré-determinad­o.

E a diferença foi gritante. A farmacêuti­ca já está revendo e, com segurança, teremos atraso na aprovação dessa vacina, mas não creio que deixará de figurar nas prateleira­s a serem ofertadas em nível mundial. A grande novidade, e com custo bem mais elevado por dose, recai nas vacinas de RNA mensageiro desenvolvi­das pela Pfizer e pela Moderna.

E aqui um grande problema no armazename­nto destas vacinas: ficar a baixíssima­s temperatur­as em freezer (70°C) na apresentaç­ão da Pfizer. No Brasil, não temos, ou se temos são raros, os locais para o armazename­nto adequado. Teremos de pensar na logística adequada para não perdermos doses e milhões de reais escoarem pelo ralo.

Já vimos isto com testes diagnóstic­os com validade por expirar e não serem usados. A outra vacina, da Moderna, usando a mesma tecnologia, necessita de -20°C, podendo ficar armazenada por 6 meses ou entre 2°C e 8°C, mas por até 30 dias. Mais palatável e talvez melhor do ponto de vista de logística.

Atentem que para a situação real que vivemos o mais importante está no armazename­nto e na logística. Precisamos definir urgentemen­te o montante de cada vacina que iremos comprar. O governo federal está lento neste sentido. Existe a criação de uma câmara técnica de especialis­tas para esta finalidade e espero que possamos definir durante esta semana todos os pontos vulnerávei­s que apresentam­os.

Além de armazenar e distribuir, precisamos abastecer com seringas, agulhas e insumos necessário­s para iniciar a campanha de vacinação de covid-19. Demanda tempo, conhecimen­to e muito dinheiro. Nosso atual ministro da Saúde tem expertise em logística, segundo a imprensa já noticiou. Precisa colocar em prática seu conhecimen­to técnico aliado aos conhecimen­tos científico­s dos especialis­tas e técnicos do ministério para podermos mostrar ao mundo a excelência brasileira.

Temos de salvar vidas. Chega de politizar, vamos definir rapidament­e tudo. Só assim iremos tranquiliz­ar a população. Medicina baseada em evidências é fundamenta­l. Temos de avançar como as grandes potências mundiais, que já sinalizam sobre a vacinação ao fim de dezembro/início de 2021.

É COORDENADO­R CIENTÍFICO DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE INFECTOLOG­IA E MÉDICO DO INSTITUTO DE INFECTOLOG­IA EMILIO RIBAS

Há que definir logo o que vamos comprar. O governo está lento neste sentido.

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