A retomada só começou
O baixo investimento continua limitando o potencial de expansão econômica do País.
Os estímulos funcionaram, o consumo reagiu, a indústria respondeu e o Produto Interno Bruto (PIB) cresceu 7,7% no terceiro trimestre, mas sem anular os danos econômicos causados pela pandemia e, antes da covid-19, pelas falhas do governo. Não basta confrontar o ganho entre julho e setembro com a perda de 9,6% nos três meses anteriores. Para um balanço realista é preciso olhar mais longe. O tombo começou bem antes da crise sanitária. No primeiro trimestre o País havia produzido 1,5% menos que no trimestre anterior, já atolado numa crise made in Brazil e com epicentro em Brasília. A devastação ocasionada pelo coronavírus ocorreu numa economia já enfraquecida e muito maltratada pelo novo governo.
O consumo familiar e a produção industrial puxaram a reação a partir de maio e continuaram a sustentá-la no terceiro trimestre. Mesmo com a reanimação, o PIB de julho a setembro foi 3,9% menor que o de um ano antes. O resultado de nove meses foi 5% inferior ao de janeiro a setembro de 2019. Em 12 meses acumulou-se um recuo de 3,4%.
A convalescença vai ser longa. Como os EUA, a maior parte da Europa e dezenas de outros países, o Brasil deve terminar 2020 com desempenho inferior ao de 2019. Previsões correntes mostram perda de uns 4,5% em relação ao PIB de um ano antes. Projeções para 2021 apontam crescimento próximo de 3,5%. Se nenhum novo desastre ocorrer, em 2022 o País voltará ao patamar de 2019.
Mas o cenário de 2021 é enevoado. Não se sabe como ficará o consumo, no próximo ano, sem o auxílio emergencial. As discussões em Brasília misturam questões de grande importância imediata, como a sustentação dos gastos familiares, e assuntos de interesse eleitoral do presidente Jair Bolsonaro, como a criação de um Bolsa Família com sua marca pessoal. Para resolver a segunda questão será preciso encontrar uma fonte permanente de financiamento, desafio muito mais complicado em termos técnicos e legais.
Enquanto o presidente se concentra em assuntos pessoais, cresce a lista de interrogações. Em outubro, a produção industrial foi 1,1% maior que a do mês anterior. O avanço mensal havia sido de 2,8% em setembro. A perda de impulso em quatro meses consecutivos pode ser algo mais sério que uma “acomodação” – palavra usada por alguns analistas – no ritmo de retomada.
Além do avanço mais lento da indústria, convém levar em conta os efeitos combinados da redução do auxílio emergencial, iniciada em setembro, e do desemprego ainda muito alto (cerca de 13,5 milhões de pessoas em setembro). Mesmo com a animação temporária dos negócios no fim do ano, a economia provavelmente entrará em 2021 ainda carente de boas doses de fortificante. As famílias, convém lembrar, estão mais endividadas e o número das inadimplentes tem crescido.
O Brasil encerra 2020 com uma agenda econômica mais complexa e desafiante que a da maior parte dos grandes emergentes. O País experimentou neste ano os efeitos combinados da pandemia e de problemas acumulados em muitos anos. A crise industrial, iniciada antes da recessão de 20152016, é um dos mais evidentes.
Outro problema crucial e muito conhecido é o baixo investimento produtivo em máquinas, equipamentos e obras, medido como formação bruta de capital fixo. No terceiro trimestre esse investimento equivaleu a 16,2% do PIB, taxa praticamente igual à de um ano antes, 16,3%.
Quando se consideram os terceiros trimestres desde o ano 2000, a taxa mais alta, 21,5%, ocorreu em 2010 e 2015. Taxas iguais ou superiores a 24% do PIB são observadas em outros emergentes, obviamente mais dinâmicos que o Brasil. O País precisa investir muito mais para ganhar produtividade e elevar seu potencial de crescimento.
O maior entrave está nas limitações financeiras e administrativas do setor público. Um dos efeitos é a grave deficiência da infraestrutura. Privatizações e concessões podem ajudar, mas o atual governo pouco avançou nessas tarefas, apesar das promessas, agora repetidas e programadas para o fim de 2021 pelo ministro da Economia.
Baixo investimento continua limitando o potencial de expansão econômica