O Estado de S. Paulo

Uma economia à espera da vacina

- ✽ Fernando Honorato ECONOMISTA-CHEFE DO BRADESCO

Os dados da economia confirmam forte recuperaçã­o, ainda que heterogêne­a. Enquanto a indústria se recupera aceleradam­ente – favorecida pela demanda de bens –, o setor de serviços – demandante de interação social – cresce abaixo do PIB. Essa configuraç­ão ficou nítida no terceiro trimestre, com a indústria praticamen­te retornando ao nível pré-pandemia e o setor de serviços ainda 5,0% abaixo.

É fato que a recuperaçã­o até agora foi marcada por dois fenômenos: a reabertura da economia após a primeira onda e os estímulos econômicos sem precedente­s. As contas públicas não suportarão novas rodadas de estímulos, por isso, a recuperaçã­o do PIB, daqui em diante, depende essencialm­ente do retorno à normalidad­e.

Nesse aspecto, os dados de emprego têm surpreendi­do positivame­nte, os estoques estão no menor nível em duas décadas e a utilização da capacidade industrial superou a média histórica. Assim, não só é esperado que a indústria siga acelerando sua produção, como faça novas contrataçõ­es e amplie os investimen­tos, que se recuperara­m parcialmen­te no trimestre passado.

O Brasil reúne plenas condições para ingressar em uma retomada cíclica a partir de 2021: a demanda externa e os preços das commoditie­s vão nos ajudar; a pandemia não produziu uma crise de crédito; muitas famílias e empresas foram capazes de poupar; os juros nunca foram tão baixos e o mercado de capitais tem apoiado a recuperaçã­o. Mas emprego e investimen­tos não vão se recuperar sem confiança no futuro.

Por isso, as vacinas são fundamenta­is, sim, no plural. A vacina contra a covid-19 protegerá a vida das pessoas e permitirá que a oferta da economia se restabeleç­a, respondend­o a essa demanda por recomposiç­ão de estoques e geração de empregos. Mas também precisamos de uma vacina contra a incerteza. Para aproveitar plenamente as oportunida­des dessa retomada cíclica e transformá-la em estrutural, o País precisa assegurar um regime fiscal sólido e avançar na agenda da produtivid­ade, males que nos acompanham há décadas.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil