Silvia Matos,
Economista do Instituto Brasileiro de Economia, da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV)
1.
O recorde do PIB no trimestre vem de uma base fraca. É um desempenho bom ou ruim?
A gente sabia que alguns setores estariam bem atrás, distantes do patamar do 3.º trimestre do ano passado, mas caso eu não estivesse olhando para o desempenho fraco do 4.º trimestre, os dados do 3.º trimestre até poderiam me empolgar. O recorde do PIB não significa o fim dos problemas. O 4.º trimestre tem sido desafiador e devemos ter um começo do ano que vem ainda muito difícil. A gente está prevendo em torno de 5% de queda do PIB para este ano. Só no 2.º semestre de 2021 o País deve ter crescimento mais forte.
2.
Havia otimismo demais quanto à recuperação?
É preciso ter cuidado ao se vender expectativas, a frustração é muito ruim, ainda mais em um contexto como este. O mercado sobe quando vem a vacina, mas tem um purgatório antes do paraíso. É preciso ter uma agenda mais clara para atravessar esse nevoeiro e os riscos hoje são mais negativos do que positivos, tem mais pressão por gastos do governo, que podem ser ruins para inflação e juros.
3.
O efeito da pandemia é mais complexo do que se previa?
Sim. Havia um otimismo exagerado com o 3.º trimestre. Pandemia é uma coisa demorada. A gente vai começar 2021 mal e podemos nos sair bem, caso o País se mantenha no trilho fiscal. Só que ainda não se sabe o que vai sair desse debate entre as demandas da sociedade e a falta de espaço no Orçamento.
4.
As incertezas sobre a vacinação, por parte do governo, podem postergar a recuperação da economia no ano que vem?
Sim, o que resolve o problema não é a vacina, mas a vacinação. A Europa deve se recuperar rapidamente no ano que vem e isso vai mostrar que quanto mais cedo houver a vacinação, melhor. É um desa- fio logístico e o Brasil não sabe se a nova onda vai demorar a passar, mas é preciso ver se ela será controlada.
5.
Isso aumenta a insegurança?
Planejamento e lideran- ça são importantes, mas falta horizonte e segurança para a população, tanto do ponto de vista da saúde quanto da economia. Vamos pensar no fim do auxílio emergencial: como o País vai enfrentar essa ques- tão no ano que vem? A gente tem o Bolsa Família, um programa bem desenhado, mas nada foi desenhado para os informais. É muito decepcionante, a pandemia expôs mui- tas dessas desigualdades e pre- ciso agir.