Antonio Fagundes lança livro com dicas de leitura
Antonio Fagundes lança livro para quem quer começar a ler, mas não sabe por onde
Há quem tenha começado a se interessar pela leitura por influência dos pais, de um irmão mais velho, de um professor, do Harry Potter. O ator Antonio Fagundes credita sua descoberta do mundo dos livros a uma mononucleose na infância. O tratamento foi com cama e... gibi. A partir daí, foi descobrindo, sozinho mesmo, autores e histórias que o encantavam e foi formando seu gosto pela leitura.
Aos 71 anos, cerca de 65 anos depois de iniciar sua trajetória de devorador de livros, o ator quer ajudar as pessoas que têm vontade de começar a ler, mas não sabem por onde, a dar o pontapé inicial. Algo como Alberto, seu personagem na novela Bom Sucesso, fez – por Paloma (Grazi Massafera) e pelo espectador. Por isso escreveu Tem Um Livro Aqui Que Você Vai Gostar. A obra chega nesta sexta-feira às livrarias pela Sextante.
Trata-se de um guia de leitura, a partir de sua própria experiência como leitor – e de suas memórias. “Se puxar mais, dá para fazer outros nove livros”, brinca Fagundes. Neste volume, ele fala sobre cerca de 150 títulos – de clássicos a contemporâneos, de ficção científica a autoajuda. Ele lê de tudo e sobre tudo (desde que o livro seja bom), tem sempre um livro na mão e a cada ida a uma livraria sai com um presente para alguém. Mas quando alguém pede uma dica, ele titubeia.
“As pessoas sempre me pedem para indicar livros e tenho problemas com isso. É difícil saber mesmo qual é o gosto da pessoa, principalmente de leitura, que é uma coisa de você com você mesmo. Cada um tem o seu interesse e eles são múltiplos. É um universo muito bonito e, ao mesmo tempo, vasto. Mas se você tem um empurrãozinho, fica melhor”, diz. Por isso o livro, e por isso ele é tão eclético.
A obra é dividida em 11 partes, e é aberta por dicas para quem quer começar a ler (veja algumas nesta página). Cada um dos capítulos é encerrado com uma breve biografia dos autores citados e outros títulos deles. Fagundes fala de literatura brasileira clássica e contemporânea – e diz, por exemplo, que está apaixonado pela obra de Ana Paula Maia: “Ela escreve com uma linguagem crua, seca, fascinante”, aponta. Além de comentar as obras que leu, ele conta alguma história por trás da experiência, explica as diferenças entre os gêneros e por aí vai. Tudo numa conversa direta com o leitor, num tom pessoal. Quando fala do poeta Mario Quintana, por exemplo, diz: “Sua obra é de uma delicadeza enorme. Dá uma coisinha no coração da gente”.
Fagundes dedica um capítulo para livros que vão fazer o leitor roer as unhas (mistério, suspense, thriller). Apresenta o que chama de universos fascinantes (distopia, terror, ficção científica). Fala de poesia, de livros premiados, biografias, livros de história, não ficção, autoajuda e obras que refletem sobre o nosso tempo – aqui, ele indica leituras que tratam do feminismo ao crime organizado, por exemplo. No fim, um índice com autores e títulos citados. Um guia mesmo.
Livros sobre feminismo, racismo e intolerância, aliás, têm despertado o interesse do ator. E ele conta que na pandemia teve a chance de “engatilhar num assunto”. Se com a vida correndo seu curso normal ele leria um livro sobre feminismo, no isolamento, disse, pôde emendar vários.
E por que ler? “A vida é muito curta e não nos permitiria o número de experiências que temos quando lemos. Lendo, mudamos de gênero, de raça, viajamos através do tempo para a frente e para trás. A leitura abre universos, nos coloca contra a parede. Por meio dela, nós nos reposicionamos diante da vida. Ela nos coloca em contato com uma realidade diferente, e sempre que isso acontece nós crescemos e evoluímos. E a leitura nos coloca no lugar do outro e passamos a ter compaixão e tolerância.”
Para o ator, este poderia ser um bom momento para mergulhar na leitura e “entrar em contato com outras verdades”. “Quisemos lançar o livro agora por isso: para que as pessoas aproveitem para abandonar um pouco as redes sociais. Elas passam muito tempo ali, grudadas naquele aparelhinho, e é um tempo inútil na sua vida. No fim das três, quatro horas que a pessoa fica no Facebook e no Instagram não sobra nada para ela. Com três ou quatro horas diárias de leitura, é possível ler mais de um livro por semana”, diz.
Seu livro, ele acredita, pode ajudar a despertar o interesse. Ele não resenha as obras, não conta muito sobre as histórias. E isso foi proposital. “Tem gente que se contenta com a resenha ou com a orelha. Busco despertar o interesse. E interesse é a questão central. Se você tem interesse, gosta até de beisebol”, brinca o ator que está lendo um livro sobre astrofísica.
Ele gosta das novidades, mas adora voltar a obras. “Reler é o melhor momento da vida. Borges já dizia que o auge da felicidade é a releitura. Como comecei a ler muito cedo, sinto que perdi algumas coisas de alguns livros. A releitura é sempre muito rica, mesmo quando você aproveitou muito da primeira vez. Isso porque não temos mais a ansiedade da primeira leitura, quando estamos entrando num universo novo sem saber se vamos gostar. Na releitura, buscamos outras coisas. Somos diferentes da primeira vez. Descobrimos coisas novas. É fantástico.”
Na estante de Fagundes moram livros da infância modesta, que ele ganhava ou comprava em sebos e bancas – como os clássicos da Ediouro, que o apresentou a Cervantes, Victor Hugo, Shakespeare. E há um livro que ele guardou em um lugar de destaque, para lembrá-lo de que ele ainda não o havia lido. E quase 50 anos se passaram assim até que ele conseguiu encarar aquela leitura que ele tinha de ter feito na escola aos 12, mas que não fez e por isso perdeu nota e ficou traumatizado. “Descobri, com 60 anos, que O Ateneu é um livro fascinante e maravilhoso.”
Não é ficção científica. Antonio Fagundes está assustado com o rumo das coisas. “As pessoas que vinham se informando sabiam que isso ia acontecer e que vai acontecer outra vez com outros vírus. É importante que a gente aprenda a trabalhar junto em vez de criar departamentos de ódio. Temos de aprender a contribuir um com o outro porque pode ser que na próxima pandemia a gente não escape. Tivemos sorte. Se esse vírus fosse um pouco mais letal, acabava com a humanidade. Uma humanidade que apesar da pandemia ainda não aprendeu a respeitar o outro e a trabalhar junto.” E o que ele aprendeu com essa pandemia, como ela o tocou particularmente? Ele não entende como pessoas bem informadas não percebem o que está acontecendo, nem a postura delas. “Que objetivos são maiores do que a vida da humanidade?”, questiona. “Para mim, o que ficou é que preciso cada vez mais olhar para o outro, entender o outro, trocar com o outro, crescer com o outro e existir com o outro.”