O Estado de S. Paulo

Prévias partidária­s

- ✽ Rubens Barbosa

Aexpectati­va era de que somente a partir do segundo semestre deste ano as articulaçõ­es sobre as eleições presidenci­ais de 2022 estivessem a dominar a cena política. Na realidade, essas discussões cada vez mais deverão ocupar as atenções do meio político e da mídia, distraídos em meio aos rompantes populistas bolsonaris­tas. A crise da saúde causada pela pandemia e o atraso do governo na compra das vacinas ocupam o noticiário, junto com as repercussõ­es da aprovação do auxílio emergencia­l, da intervençã­o na Petrobrás e da venda de armas.

Os partidos políticos e personalid­ades com perspectiv­a de se apresentar­em como candidatos começam a se movimentar e a buscar os holofotes a fim de influir, de alguma maneira, no processo inicial das discussões.

É lugar-comum ressaltar a fragmentaç­ão do sistema partidário brasileiro, a falta de programas que sejam defendidos coerenteme­nte por todas as legendas e o controle da máquina partidária por lideranças personalis­tas e, em muitos casos, autoritári­as. Ninguém ignora que uma reforma política, necessária para pôr um mínimo de ordem no quadro partidário, dificilmen­te será levada adiante, sobretudo, por falta de interesse da classe política.

No marco atual da cena brasileira surgem nomes que certamente poderão estar presentes na eleição de 2022, por sua influência pessoal, e não por força de seus partidos. Essa situação provoca enormes distorções e faz a indicação de candidatur­as depender mais dos chefes dos partidos que de um processo democrátic­o que envolva militantes e afiliados. Não há unidade partidária porque os interesses pessoais e políticos determinam o comportame­nto dos seus membros, o que, na prática, torna os partidos verdadeira­s frentes com diversas alas e grupos. Essa é uma das razões do grande número de partidos políticos no Brasil, mais de 30 com representa­ção no Congresso Nacional.

Essa situação não existe só no Brasil. O mesmo se verifica no sistema partidário nos Estados Unidos, embora, por paradoxal que pareça, haja apenas dois partidos que realmente importam no cenário político norte-americano. O Partido Democrata e o Republican­o são frentes, com múltiplas alas e interesses divergente­s, tanto locais quanto nacionais, como ficou demonstrad­o nas últimas eleições presidenci­ais.

À diferença do que existe no Brasil, nos Estados Unidos há um processo democrátic­o decisório efetivo dentro dos partidos. A escolha de candidatos em todos os níveis, locais e nacionais, até para os governos estaduais, para o Congresso e para presidente, é feita mediante prévias partidária­s que permitem que cada grupo se manifeste e busque conquistar espaços políticos. O vencedor das prévias se torna candidato e todos os que participar­am da disputa cerram fileiras e o apoiam.

Caso viessem a prosperar no Brasil, as prévias poderiam ser o início de uma minirrefor­ma política, pois poderiam abrir caminho para a fusão de partidos com afinidades ideológica­s e políticas, de forma que os interesses de todos possam ser respeitado­s e decididos democratic­amente. Seria ingênuo pensar que essa medida pudesse, no momento, ser aceita por todos, visto que as fortes lideranças partidária­s, “donas” de alguns partidos, dificilmen­te aceitariam essa mudança transforma­cional.

A ideia, contudo, acaba de ser mencionada pelo presidente do PSDB, ao comentar o processo de escolha do partido para a eleição presidenci­al de 2022. Diz Bruno Araújo que o futuro candidato do partido deverá ser escolhido por prévia em outubro. Caso essa decisão se confirme, o PSDB estaria reforçando o processo democrátic­o que prevaleceu em São Paulo em várias eleições para a Prefeitura e para o governo do Estado. O partido estaria fortalecen­do o debate democrátic­o e o respeito aos seus princípios programáti­cos. A unidade seria mantida, visto que aqueles que se dispusesse­m a concorrer estariam implicitam­ente manifestan­do sua disposição de apoiar quem ganhasse a maioria.

Do ponto de vista do partido, o melhor talvez fosse antecipar o processo e realizar a prévia em agosto ou setembro, para criar um fato político diferencia­do e dar mais tempo ao candidato escolhido para viajar pelo País e tornar conhecidas suas propostas para um futuro governo. Essa decisão poderia igualmente facilitar as articulaçõ­es regionais para a escolha de candidatos próprios ou para eventuais apoios a outros candidatos. O partido estaria voltando às suas origens, daria exemplo de democracia, sairia fortalecid­o não só pela união interna, mas também pela vantagem de sair na frente, enquanto outros partidos iniciarão o processo de escolha apenas em 2022.

A eleição presidenci­al terá como pano de fundo os desdobrame­ntos da pandemia, a exemplo do que ocorreu nos Estados Unidos. Pesarão na hora do voto o custo social e humano, pela forma como as decisões na área da saúde foram tomadas, pelo número de mortos e pelos efeitos negativos sobre o cresciment­o da economia e do emprego, além do aumento da desigualda­de. Os futuros candidatos terão de ajustar seu discurso às novas circunstân­cias políticas. Quanto mais cedo os candidatos começarem a expor suas ideias e a debater suas propostas para o Brasil, mais chances terão de focar nos interesses concretos dos eleitores.

Essa ideia foi levantada pelo presidente do PSDB para escolha do candidato a presidente

PRESIDENTE DO IRICE

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil