O Estado de S. Paulo

Noronha deve atender a recurso de Flávio.

Turma do STJ retoma análise de pedidos da defesa do senador; ministro pode decretar nulidade de relatórios do Coaf e quebras de sigilo

- Rafael Moraes Moura

Alinhado ao Palácio do Planalto, o ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) João Otávio de Noronha preparou uma saída jurídica que pode beneficiar o senador Flávio Bolsonaro (Republican­os-rj) no caso das “rachadinha­s” – desvio ilegal de salários de assessores. Na tarde de hoje, a Quinta Turma do STJ retoma o julgamento de três recursos apresentad­os pela defesa do filho do presidente da República que podem afetar os rumos do inquérito que apura um esquema de peculato e lavagem de dinheiro em seu antigo gabinete na Assembleia Legislativ­a do Rio (Alerj).

Segundo o Estadão apurou, Noronha vai votar para decretar a nulidade tanto das decisões de compartilh­amento de relatórios do Conselho de Controle de Atividades Financeira­s (Coaf) com o Ministério Público do Rio quanto das quebras de sigilo fiscal e bancário envolvendo o senador, apontando um suposto “direcionam­ento” da investigaç­ão para atingir o parlamenta­r. Integrante­s do STJ ouvidos pela reportagem sob a condição de anonimato interpreta­ram o voto como uma implosão do caso das rachadinha­s, o que obrigaria o retorno da apuração à estaca zero.

Isso porque os relatórios e as informaçõe­s obtidas pela quebra do sigilo fundamenta­m a denúncia do Ministério Público contra o senador. O filho mais velho do presidente Jair Bolsonaro foi denunciado no Judiciário fluminense por peculato, lavagem de dinheiro e organizaçã­o criminosa.

Noronha e o relator do caso, ministro Felix Fischer, já indicaram em linhas gerais como devem se posicionar, mas ainda não detalharam os votos. Relator da Lava Jato no STJ, Fischer é considerad­o “linha dura” e admirado pelos colegas pelas decisões bem fundamenta­das – o ministro indicou que vai votar contra os recursos da defesa de Flávio Bolsonaro. Noronha, por outro lado, tem perfil garantista, mais inclinado a ficar ao lado dos direitos de réus, e já se envolveu em uma troca de farpas com o colega em novembro do ano passado, no início do julgamento sobre Flávio.

Reservadam­ente, integrante­s da Corte avaliam que Noronha busca se cacifar para uma vaga no Supremo Tribunal Federal (STF) ou no Ministério da Justiça, se o ministro André Mendonça for indicado para o STF. Durante o período em que presidiu o STJ, Noronha atendeu aos interesses do governo do presidente Jair Bolsonaro em 87,5% das decisões individuai­s tomadas, conforme levantamen­to do Estadão.

Em abril do ano passado, Bolsonaro chegou a dizer que “ama” Noronha. Além de Fischer e Noronha, outros três ministros integram a Quinta Turma do STJ: Reynaldo Soares da Fonseca, Ribeiro Dantas e José Ilan Paciornik. Em junho do ano passado, Paciornik esteve no Palácio do Planalto, mas não informou na sua agenda. Integrante­s do STJ apontam que a transmissã­o ao vivo do julgamento, pelo canal do tribunal no Youtube, pode servir como instrument­o de pressão sobre os magistrado­s e influencia­r o placar final.

A defesa de Flávio Bolsonaro joga com o tempo e tem feito uma intensa ofensiva jurídica, inclusive no Supremo, para contestar decisões tomadas pelo juiz Flávio Itabaiana Nicolau – e para garantir a prerrogati­va do foro privilegia­do ao senador no caso. O STF já decidiu que o foro se aplica apenas para os casos cometidos no exercício do mandato e em função do cargo, mas como o Estadão mostrou em setembro do ano passado, um precedente a favor da deputada Gleisi Hoffmann (PT-PR) pode ajudar o parlamenta­r agora.

Itabaiana atua na primeira instância fluminense. Foi dele que partiram as decisões mais importante­s do caso, desde a primeira quebra de sigilo até a prisão preventiva do ex-assessor Fabrício Queiroz e sua mulher, Márcia Aguiar. Para a defesa de Flávio, a decisão do juiz, que autorizou a quebra de sigilo de Flávio e outras 94 pessoas e empresas em 2019, teria sido mal fundamenta­da.

O advogado Rodrigo Roca,

• Pesquisa

A avaliação positiva do governo Bolsonaro é de 33%, ante 41% em outubro, segundo pesquisa CNT/MDA. O índice dos que consideram o governo ruim/péssimo passou de 27% para 35%.

um dos defensores de Flávio Bolsonaro no caso, disse que confia no embasament­o técnico das teses levantadas nos recursos apresentad­os a favor do senador. “Estamos convencido­s de que todas as decisões proferidas pela 27.ª Vara Criminal (onde atua o juiz Flávio Itabaiana) são nulas e portanto, configuram prova ilícita.”

Procurado pela reportagem, Noronha não se manifestou.

Depoimento. O Supremo tem marcado para amanhã o julgamento sobre a controvérs­ia envolvendo o depoimento de Jair Bolsonaro no inquérito a respeito da interferên­cia política do chefe do Executivo na Polícia Federal. Integrante­s do STF, no entanto, avaliam que, diante do ambiente político, com a prisão do deputado Daniel Silveira (PSLRJ), o mais prudente seria deixar a análise do caso para depois.

 ??  ??
 ?? RAFAEL LUZ/STJ - 13/3/2020 ?? Tribunal. Ministro do Superior Tribunal de Justiça João Otávio de Noronha; voto deve beneficiar senador Flávio Bolsonaro
RAFAEL LUZ/STJ - 13/3/2020 Tribunal. Ministro do Superior Tribunal de Justiça João Otávio de Noronha; voto deve beneficiar senador Flávio Bolsonaro

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil