O Estado de S. Paulo

Os vinhos do vulcão

É JORNALISTA ESPECIALIZ­ADA EM VINHOS

- SUZANA BARELLI @SUZANABARE­LLI ✽

Na Sicília, o Etna é o vulcão mais ativo da Itália. Neste início de ano, ele decidiu mostrar sua força, com várias erupções em fevereiro. Numa das mais recentes, sua lava chegou a subir a até mil metros de altura. Por sorte, o rio de lava que se formou atingiu apenas áreas desocupada­s.

Com as erupções, várias vinícolas aproveitar­am para postar fotos de seus vinhos com as lavas ao fundo. É um marketing importante para a Nerello Mascalese, uva pouco conhecida do público, mas que dá origem a vinhos tintos muito interessan­tes na região do Etna.

Autóctone da região do Etna, a Nerello Mascalese, segundo o livro Grapes, da inglesa Jancis Robinson, é um cruzamento da sangiovese, tão popular na Toscana (leia-se Chianti), com a variedade local mantonico bianco. Resulta em vinhos escuros (nerello vem de nero, ou seja, preto), com aromas de frutas negras (amoras e framboesas são exemplos) e de especiaria­s, taninos macios, bom frescor e com um toque mineral. “A vantagem de cultivar vinhas no Etna é obter vinhos com identidade profunda, mineral e saborosa”, afirma o enólogo siciliano Giuseppe Burruano, da Cantine Cellaro.

A Sicília conta com várias vinhas de nerello, muitas delas centenária­s, ao redor do Etna – há vinhedos com a variedade também em outras regiões desta ilha ao sul da Itália. O tinto Micina, o nerello da Cantine Cellaro, por exemplo, vem de Sambuca di Sicilia, quase na costa oposta ao Etna, e tem um estilo mais concentrad­o e menos mineral (R$ 159, na Casa Flora).

Os solos de origem vulcânica são bem escuros e ricos em nutrientes, como cálcio, potássio, ferro, magnésio. Mas o tipo de mineral depende de cada vulcão, o que faz esse solo ter caracterís­ticas diferentes entre, por exemplo, o Etna e o sul do Chile, explica o viticultor chileno René Vásquez, gerente agrícola da Viña Casa Silva. São solos também mais férteis, porque as rochas vulcânicas conseguem armazenar a água da chuva. Há outros exemplos de vinhedos em solos vulcânicos pelo mundo, como a Ilha da Madeira, em Portugal; as ilhas Canárias, da Espanha; Santorini, na Grécia.

Com o Etna em erupção, a fumaça do vulcão atingiu os vinhedos. Nesta próxima safra, diz Vásquez, é esperado que os vinhos tenham notas mais de sulfuroso e da própria fumaça. “As cinzas certamente vão contribuir significat­ivamente para as notas organolépt­icas do vinho”, afirma Burruano. Ele acrescenta que as cinzas se prendem às folhas das vinhas e têm também um papel de proteção contra fungos.

No Brasil, há poucos exemplares de nerello mascalese, muitos comerciali­zados como Etna Rosso DOC. Entre eles, a Zahil traz o fresco e leve Nicosia, por R$ 120. A Mistral importa os vinhos da Tasca D’almerita e da Tenuta dele Terre, com preços a partir de R$ 182, e a World Wine começou a trazer o Fragore, da Donnafugat­a, mas com preço salgado (R$ 940).

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