PF atribui à Vale a ruptura de represa
Laudo sobre Brumadinho menciona perfuração feita pela empresa e refuta ideia de que colapso envolveria chuvas e falhas no terreno
Laudo apresentado ontem pela Polícia Federal aponta que o rompimento da barragem da Vale em Brumadinho, em 25 de janeiro de 2019, ocorreu por perfuração feita a partir da parte superior até a base da represa, onde rejeitos ficam armazenados. A operação foi iniciada cinco dias antes da tragédia e estava em andamento na hora da ruptura.
A perfuração buscava um diagnóstico das condições dos rejeitos depositados na estrutura e posterior instalação de equipamentos para medir a pressão interna da barragem. O laudo refuta as argumentações da Vale de que uma combinação de deformação da barragem, provocada pelo próprio peso, com fortes chuvas teria contribuído para o colapso. O documento mostrou que em 2019 o regime pluviométrico foi inferior ao de anos anteriores.
A perfuração, juntamente com o baixo nível do fator de segurança da estrutura – já comprovado nas investigações –, levou à ruptura por liquefação, que é o aumento do volume de água nos rejeitos sólidos. Conforme o perito da Polícia Federal Leonardo Mesquita, a liquefação ocorreu quando a perfuração atingiu, a 68 metros de profundidade, uma camada da estrutura com maior volume de rejeitos finos, que reúnem mais chances de se liquefazerem. “A perfuração estava ocorrendo no ponto mais crítico da barragem”, disse o perito. Um fluido usado para lubrificar a ponta da perfuratriz aumentou a pressão nesse ponto mais frágil da represa.
Antes de iniciar a perfuração, a Vale contratou empresa terceirizada, cujo nome não foi revelado pela PF, para uma etapa inicial de análise dos rejeitos. Mas, segundo a PF, os dados dessa etapa, que foi de outubro a dezembro de 2018, não foram processados pela empresa, que mesmo assim passou à segunda etapa do processo em janeiro.
“Houve um atropelo”, concluiu o delegado responsável pelas investigações, Luiz Augusto Pessoa Nogueira. “A Vale deveria ter verificado primeiro o que foi diagnosticado pela empresa contratada.”
O laudo divulgado ontem é o mais importante para a possível responsabilização criminal de funcionários e diretores da Vale pelo colapso da estrutura. O rompimento da barragem matou 272 pessoas. Onze permanecem desaparecidas. O delegado, no entanto, afirma que o inquérito continua e ainda não há definição sobre possíveis indiciamentos. “Não descarto nenhum tipo de hipótese”, adiantou. Outras hipóteses levantadas foram descartadas pela PF – entre elas as detonações em mina próxima da represa.
Indagada sobre a razão de não processar as informações obtidas pela empresa contratada, a Vale afirmou, em nota, que “tomou conhecimento nesta sexta-feira do laudo da PF” e que “avaliará o inteiro teor do laudo e oportunamente se manifestará nos autos”.