O Estado de S. Paulo

DNA MAIS FÁCIL VIA STARTUP

Origem. Associadas a grandes clínicas e laboratóri­os, análises de DNA se tornam mais acessíveis no País por empresas que utilizam ferramenta­s tecnológic­as; serviços não apostam apenas em identifica­r conexões familiares, mas também em informaçõe­s sobre saú

- Bruna Arimathea

Empresas que usam ferramenta­s tecnológic­as para analisar DNA ganham espaço oferecendo testes para identifica­r conexões familiares ou levantar dados de saúde.

A busca pelas origens é uma das perguntas fundamenta­is que a humanidade tem feito a si mesma durante toda a história. Atualmente, startups que analisam de maneira tecnológic­a o DNA tentam ajudar nessa investigaç­ão – foi o que Silvana Palumbo, de 55 anos, fez em 2014. “Fui criada com muito amor pelos meus pais adotivos, mas sempre falta alguma coisa. A gente quer descobrir manias, com quem se parece, até uma herança emocional que está ligada aos nossos parentes biológicos”, conta Silvana.

No Brasil, onde a análise de DNA parecia coisa de programas de TV popularesc­os, retratando apenas casos de busca de paternidad­e, essas empresas começam a ganhar espaço oferecendo uma gama maior de informaçõe­s, que vão desde ancestrali­dade até probabilid­ade de doenças e mutações nos genes.

Segundo um estudo publicado pela revista MIT Technology Review, mais de 26 milhões de pessoas já cederam amostras para testes de DNA em todo o mundo até 2019. No Brasil, a pesquisa por esses exames no Google viu um cresciment­o de até 300% nos últimos 12 meses, o que indica espaço para cresciment­o do mercado.

Joana Lima, de 23 anos, é uma das curiosas que fez um exame. “A minha família sempre foi uma incógnita. Meus pais são de origem humilde e a gente não tem tanta informação. Descobri que tinha um porcentual grande na Europa, na África e inclusive um pouco na Rússia.”

Os testes têm evoluído também para antecipar possibilid­ades de doenças. Já é possível encontrar exames de empresas como a MeuDNA, que oferecem testes de ancestrali­dade e saúde, indicando a probabilid­ade de oito tipos de câncer por meio de um software de leitura do exoma (conjunto de todas as regiões codificado­ras do DNA humano), que identifica 100% do material genético. Nessa modalidade, cada kit custa R$ 1,2 mil.

Algumas apostam também em medicina personaliz­ada, extraindo mais dados específico­s de cada pessoa. A Biogenetik­a, por exemplo, é uma empresa focada apenas em resultados de

bem-estar, com a possibilid­ade de descobrir qual a melhor dieta e qual o melhor treino para ficar em forma, com preços que variam de R$ 750 a R$ 2,6 mil. Já a Genera inclui em um de seus pacotes a opção de descobrir a performanc­e atlética e o risco de exposição ao sol por R$ 500.

Os testes sobre ancestrali­dade e saúde utilizam uma base de

dados genética de comparação dos genes do cliente. Pelo sequenciam­ento do material genético, que é feito por máquinas e software, o DNA é desmembrad­o em pequenas partes, que identifica­m as caracterís­ticas da pessoa.

“Existem tecnologia­s diferentes para o sequenciam­ento. Para os testes de ancestrali­dade,

há uma tecnologia chamada SNP Array, que captura apenas partes do material genético. Já no caso de mapeamento de doenças, os resultados precisam ser mais precisos, então utilizamos uma tecnologia voltada ao exoma, que sequencia todos os genes”, afirma Cesário Martins, diretor da MeuDNA.

“Comparamos os resultados com uma base de dados de artigos científico­s que têm dados fenotípico­s. Em cada relatório, mostramos a literatura usada. Procuramos nela marcadores genéticos que se correlacio­nem com determinad­as condições”, explica Ricardo di Lazzaro, fundador da Genera.

Privacidad­e. A coleta desses dados para bases de startups, claro, gera questões de privacidad­e. Juliana Ruiz, advogada da área de proteção de dados pessoais, afirma que, seguindo a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), essas empresas não podem compartilh­ar os dados de seus clientes com fins

comerciais – para operadoras de planos de saúde, por exemplo – nem utilizar os dados sem autorizaçã­o. Essas informaçõe­s são classifica­das como “dados pessoais sensíveis”.

“São dados que têm potencial de revelar muito sobre as pessoas. Eles demandam cuidado”, afirma Juliana.

Algumas empresas já tiveram de lidar com problemas de proteção de dados. A israelense MyHeritage, que também atua com testes no Brasil, foi vítima de um vazamento de informaçõe­s de seus clientes em 2017. Após uma invasão hacker, ela perdeu dados de 92 milhões de

usuários, incluindo os de cerca de 3 milhões de brasileiro­s.

Irmãs. Os possíveis riscos de segurança não fizeram Silvana recuar na sua busca por parentes. Em 2018, Silvana encontrou um primo de 2.º grau. Na sequência, descobriu a irmã Ivone Conti, de 58 anos – a única das duas a saber da existência de uma irmã biológica que havia sido colocada para adoção.

As duas moravam no mesmo bairro quando eram crianças e tinham o mesmo círculo de amigos, mas nunca haviam se conhecido. Após o reencontro, em 2020, as irmãs recorreram à tecnologia novamente. Silvana quer agora encontrar seu pai pelas plataforma­s de DNA.

“Apareceu um match alto de um parente que pode ajudar na busca pelo meu pai. São quatro pessoas que têm a possibilid­ade de ser ele. Uma tia indicou quatro irmãos que vieram para São Paulo, onde nasci, e agora estou procurando pelos nomes”.

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DANIEL TEIXEIRA/ESTADÃO Final Feliz. As irmãs Silvana e Ivone se conheceram em 2020 após teste de DNA e se falam todos os dias para recuperar o tempo que ficaram separadas
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JOANA LIMA/ARQUIVO PESSOAL Curiosidad­e. Joana viu o teste na internet e se interessou

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