O Estado de S. Paulo

‘Zona húmida’

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Se o agronegóci­o e o governo brasileiro­s soubessem se defender um pouco melhor na guerra religiosa, e em geral suja, que há anos se dedica a destruir o sucesso da agricultur­a e da pecuária do Brasil nos mercados mundiais, bem que poderiam propor aos países europeus, os mais excitados em traficar a crença de que a soja e o boi estão acabando com “a Amazônia”, uma nova abordagem para este negócio todo. Que tal, a partir de agora, a França, a Alemanha, a Inglaterra e outros passarem a aplicar em todas as suas propriedad­es agrícolas as mesmas regras e as leis que o produtor rural brasileiro é obrigado a obedecer aqui dentro – e obedece mesmo, ponto por ponto, sob pena de perder o seu negócio?

Pelo que dizem lá fora da gente, não deveria haver problema nenhum em se fazer isso, não é mesmo? Afinal, presidente­s da República, primeiros-ministros, reis, rainhas, os funcionári­os que mandam nas organizaçõ­es públicas, mais as classes intelectua­is e a mídia, repetem há anos que o Brasil é uma terra de ninguém em termos de responsabi­lidade ambiental; aqui vale tudo. Bandos de bilionário­s andam por aí derrubando uma floresta por dia para socar soja, milho e boi em cima. Não há lei nenhuma para controlar essa gente. Os governos deixam fazer tudo – o governo atual, então, praticamen­te organiza incêndios no Pantanal e está mandando derrubar as últimas árvores da Amazônia. Em suma: é nisso que acreditam, ou que fingem acreditar.

Nesse caso, aplicar a lei brasileira na Europa não iria incomodar ninguém; tudo continuari­a, lá, exatamente como é agora, pois leis que não existem não mudam nada. Não é assim? Mas aí é que está: as leis ambientais brasileira­s existem, estão entre as mais duras do mundo e, se um dia pudessem ser aplicadas na agricultur­a e na pecuária dos países europeus, provocaria­m uma revolução.

Apenas uma exigência, uma só, à qual o produtor rural brasileiro já se acostumou, como está acostumado com o sol e a chuva: 20% da área de todas as propriedad­es rurais brasileira­s (mais que isso, dependendo da região) têm de ser reservadas para matas. O proprietár­io não pode tirar um galho de árvore nenhuma. Não pode ganhar um tostão com esse quinto da sua propriedad­e. Mais: se não houver mato na sua terra, tem de plantar, com dinheiro do seu próprio bolso, ou então comprar, também com dinheiro do seu próprio bolso, uma nova área só com árvores para juntar à sua terra. É óbvio que não recebe nenhuma compensaçã­o do Estado, nem abatimento de um centavo de imposto, pelo investimen­to que faz em favor do meio ambiente; ao contrário, a única coisa que recebe são multas a cada vez que a vigilância por satélite ou o fiscal detectam que está faltando alguma árvore que deveria estar lá.

Então: podemos sugerir, por exemplo, que o presidente Macron crie um esquema igual para a França – já que ele vive à beira de um ataque de nervos diante do agro brasileiro. O Brasil pode propor, também, que os agricultor­es europeus não cheguem a mais de 50 metros dos seus rios, nem toquem nas matas ciliares. Melhor ainda: por que não aplicam por lá o novo “zoneamento econômico e ecológico” de Mato Grosso? Essa última criação dos ambientali­stas militantes em nosso serviço público considerou 4 milhões de hectares do Vale do Araguaia como “zona úmida” e em “zona húmida”, por decisão dos autores do “zoneamento”, não se pode produzir nada, nem peixes criados em tanques de água.

Seria interessan­te ver o que aconteceri­a se os governos ecológicos da Europa declarasse­m “zonas húmidas” de 4 milhões de hectares nas bacias do Rio Sena, ou do Rio Reno, ou do Rio Pó – e botassem o povo de lá para fora.

✽ JORNALISTA

Que tal a Europa aplicar as regras que o produtor rural é obrigado a obedecer aqui?

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