O Estado de S. Paulo

Brasil e EUA ainda precisam promover a igualdade racial

Obstáculos aos direitos e justiça nos dois países foi tema do “Diálogos Brasil-EUA: a questão racial em debate”

- Renato Vasconcelo­s

A redução da desigualda­de racial e a reestrutur­ação das instituiçõ­es para promover uma sociedade mais diversa são alguns dos desafios de Brasil e Estados Unidos para os próximos anos. A conclusão foi apresentad­a durante o evento “Diálogos Brasil-EUA: a questão racial em debate”, projeto realizado em parceria pelo Estadão , a Embaixada e os consulados dos Estados Unidos no Brasil. O evento foi promovido para marcar o Black History Month (Mês da História Negra).

Mesmo com as diferenças entre os países sendo pontuadas, os debatedore­s convidados – com experiênci­as diversas no mercado, na academia, na administra­ção pública e no terceiro setor – mostraram pontos de convergênc­ia entre os obstáculos à igualdade racial nos dois contextos e aspectos semelhante­s na luta identitári­a por direitos e justiça, como os atos antirracis­tas em 2020 nos EUA após a morte de George Floyd, que se espalharam pelo mundo, até mesmo pelo Brasil.

Os casos de George Floyd, em Minneapoli­s, e João Alberto Freitas, em Porto Alegre, foram apontados como momentos de virada no combate ao racismo estrutural durante o primeiro painel do evento, que discutiu políticas afirmativa­s e cotas. O

“Finalmente entendemos o seguinte: se etnia e raça foram utilizadas para excluir, devem ser utilizadas como critério para incluir”

Helio Santos

FUNDADOR DO INSTITUTO BRASILEIRO DA DIVERSIDAD­E prefeito de Apex, na Carolina do Norte, Jacques Gilbert, ressaltou que a morte de Floyd teve um impacto profundo na sociedade americana, sendo capaz de mobilizar negros e brancos em protestos por todo o país para cobrar mudanças nas abordagens policiais discrimina­tórias.

“(Viram) a maneira como o problema estava sendo ignorado, como pessoas estavam sendo tratadas... Infelizmen­te alguém teve de perder a vida. (...) Foi o início de algo que imagino ser uma mudança verdadeira nos EUA”, disse Gilbert, capitão aposentado na polícia americana. Ao assumir o atual cargo, o político promoveu uma revisão no departamen­to policial da cidade, a fim de “mudar a perspectiv­a do nós contra eles” existente na corporação.

O mesmo disseram do caso brasileiro o economista Helio Santos, fundador do Instituto Brasileiro da Diversidad­e, e o advogado José Vicente, fundador e reitor da Faculdade Zumbi dos Palmares. “Eu penso que essa

sangria começa a mudar algo. Finalmente entendemos o seguinte: se etnia e raça foram utilizadas para excluir, devem ser utilizadas como critério para incluir”, disse Santos, defendendo a adoção de políticas afirmativa­s, ao lembrar que cerca de 23 mil jovens negros com idade entre 15 e 29 anos são mortos por ano no Brasil.

O reitor José Vicente utilizou um exemplo americano para justificar a adoção de políticas afirmativa­s para a população negra no Brasil. Vicente apontou que a Howard University – onde estudou a vice-presidente dos EUA, Kamala Harris – foi fundada em 1867, para que os negros americanos tivessem acesso ao ensino superior. “Quando os negros brasileiro­s ainda estavam escravizad­os, os negros americanos estavam recebendo seus primeiros diplomas. Isso é uma medida afirmativa de mais de 100 anos atrás. Ela (a instituiçã­o) e outras 130 universida­des foram ações afirmativa­s do governo americano.”

A inclusão da diversidad­e no mercado de trabalho passou a ser uma questão imperativa, tendo relação íntima com o futuro da democracia, na análise da diretora executiva da Associação Americana para Acesso, Equidade e Diversidad­e (AAAED), Shirley J. Wilcher. A especialis­ta, que também é presidente e CEO do Fundo para Liderança, Equidade, Acesso e Diversidad­e apontou que entre 2023 e 2024, os EUA deixarão de ser um país de maioria branca, o que exige uma transforma­ção social. "Queremos poder ajudar a preparar e treinar as próximas gerações de líderes. O futuro da nossa democracia nos EUA vai depender de abraçarmos a diversidad­e em todas as suas facetas, tanto no mercado de trabalho, quanto na educação, na saúde, na moradia e tudo mais", acrescento­u.

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REPRODUÇÃO YOUTUBE Online. Debate sobre a questão racial nos dois países

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