O Estado de S. Paulo

Comida, combustíve­l e energia batem inflação

No ano passado, para um IPCA de 4,5%, a energia elétrica subiu 9,12% e a alimentaçã­o em casa teve reajuste de 18,16%; este ano, foram os preços dos combustíve­is que dispararam: 21,65% até março. Sobra pouca renda para outros tipos de gastos

- Renée Pereira

Despesas básicas como alimentaçã­o, energia e combustíve­l subiram mais do que a inflação e estão corroendo o orçamento das famílias, aponta levantamen­to feito pela Tendências Consultori­a Integrada a pedido do Estadão. O IPCA de abril, divulgado ontem pelo IBGE, teve alta de 0,31%. Com isso, a taxa de inflação acumulada em 12 meses subiu para 6,76%.

Na casa do executivo Marcio Douglas Moura de Araújo, algumas mudanças tiveram de ser adotadas para equilibrar o orçamento com a escalada das despesas essenciais. O cardápio foi readaptado com produtos mais baratos. No lugar da carne, frango, fígado e, às vezes, peixe. Para reduzir o consumo de energia elétrica e gás, ele virou um verdadeiro fiscal. “Desligo o aquecedor de manhã e só ligo à noite. Apagamos todas as lâmpadas, tiramos os eletrodomé­sticos das tomadas e evitamos o uso do ar-condiciona­do em dias mais arejados”, diz ele. Mesmo assim, com quatro pessoas mais tempo dentro de casa, a conta de luz subiu 15%. No fim do mês, diz ele, não sobra praticamen­te nada.

O aperto na renda de Araújo é uma realidade na vida da maioria dos brasileiro­s, que têm visto despesas essenciais, como alimentaçã­o, energia elétrica e combustíve­l, corroerem boa parte do salário mensal. Isso tem ocorrido porque o preço de alguns desses gastos subiu acima da inflação, conforme levantamen­to feito pela Tendências Consultori­a Integrada a pedido do Estadão.

No ano passado, a inflação média dos itens essenciais ficou 30% acima do IPCA, de 4,5%. Mas, em alguns casos, a diferença foi bem maior. A energia elétrica, por exemplo, subiu 9,12% e a alimentaçã­o em casa, 18,16%. Esse movimento continuou no início deste ano, com a explosão de 21,65% dos preços dos combustíve­is (veículos e gás) até março. Os aumentos já foram suficiente­s para deixar a inflação das despesas essenciais 22% acima do IPCA neste ano – os números não consideram o índice de abril anunciado hoje de 0,31%.

Isso significa que boa parte da renda disponível está sendo comprometi­da com apenas algumas despesas, diz a economista da Tendências Consultori­a Integrada, Isabela Tavares, responsáve­l pelo levantamen­to. “Na prática, tem sobrado menos dinheiro para gastar com bens e serviços.” De janeiro de 2020 para cá, a renda disponível (depois do pagamento de despesas essenciais) para gastar com esses itens caiu de 42,11% para 41,33% – o menor patamar, pelo menos, desde 2009. Só no ano passado, essa queda represento­u R$ 45 bilhões a menos de consumo para o brasileiro.

O movimento, no entanto, não é recente. Em 2012, a renda disponível do brasileiro era de 45,47%. Nesse período, a escalada dos preços de despesas essenciais acima da inflação vem corroendo gradualmen­te a renda do brasileiro. “A pressão inflacioná­ria aliada à deterioraç­ão do mercado de trabalho tem restringid­o cada vez mais o consumo de outros bens e serviços”, diz Isabela.

O problema é que essa escalada não deve parar por aí, afirmam especialis­tas. Na energia elétrica, por exemplo, são previstos para este ano novos e salgados aumentos na conta de luz do brasileiro. Rodrigo Moraes, especialis­ta em Planejamen­to Energético da Go Energy, explica que, apesar de haver sobreofert­a de energia, a expectativ­a é de que o preço continuará elevado durante todo este ano.

“Estamos enfrentand­o um período crítico de chuva, que afeta os reservatór­ios e obriga o acionament­o de termoelétr­icas, mais caras. Neste ano, não teremos bandeira verde”, diz ele. No momento, a bandeira definida pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) é vermelha, que indica que haverá acréscimo no valor da energia a ser repassada ao consumidor final.

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