O Estado de S. Paulo

E lá se vão cinco anos!

- ✽ Michel Temer ✽ ADVOGADO, PROFESSOR DE DIREITO CONSTITUCI­ONAL, FOI PRESIDENTE DA REPÚBLICA

Há cinco anos assumi a Presidênci­a da República. Afastada a senhora presidente, desejou-se realizar posse em largo espaço no Palácio do Planalto. Modestamen­te, achei que o momento não era para comemoraçã­o. Era, apenas, cumpriment­o de um dever constituci­onal. Pedi para realizarem o ato no menor dos auditórios. Entretanto, surpresa! Quando me dirigi ao local, os corredores estavam repletos de deputados, senadores, assim como populares que não conseguira­m ingressar naquele espaço, que estava lotado. Percebi naquele momento que tinha apoio sólido do Congresso Nacional.

Quase todos os partidos estiveram presentes, a confirmar tese que alardeei ao longo do tempo: a unidade de todos para enfrentar os problemas do País. E quais eram eles? Inflação de dois dígitos, juros da taxa Selic em 14,25%, estatais desarranja­das e dando prejuízo, déficit fiscal, descrédito, desânimo, imagem negativa no exterior e desarmonia interna no governo. Tive de providenci­ar, às pressas um bom Ministério.

Não se verificou nenhuma transição. Ao contrário. Quando cheguei ao gabinete, no dia seguinte, havia apenas uma servidora ali sentada, e com grande constrangi­mento. Não havia agenda telefônica nem dados nos computador­es administra­tivos. Começamos, assim, praticamen­te do zero.

Embora partindo do zero pus em prática a Ponte Para o Futuro, plano de políticas públicas que havia sugerido ao governo de então, mas foi tomado como gesto de oposição. Com uma equipe formada por vários partidos, ao fundamento de que o Executivo não governa sozinho, mas com o Legislativ­o, o governo começou a trabalhar.

A primeira providênci­a saneadora foi a emenda à Constituiç­ão referente ao teto de gastos. Era autolimita­ção ao próprio presidente da República, já que medidas populistas não seriam possíveis. Deputados a aprovaram na madrugada de um feriado. E por ampla maioria, o que revelava, mais uma vez, o apoio congressua­l pois o mesmo se deu no Senado.

Enquanto isso, reconheço, a oposição combatia ferozmente o meu governo. Protestava. Mas eu não protestava contra os protestos. Afinal o Estado é Democrátic­o de Direito. Cabia à oposição opor-se. Ao meu governo, governar.

Sabia que o Brasil carecia de reformas. Algumas, causadoras de impopulari­dade. Com o teto para os gastos aprovado, chamei os governador­es e permiti que deixassem de pagar seu débito com a União por seis meses. Sabia das dificuldad­es dos municípios nos finais de ano. Daí por que os socorremos mediante divisão da multa de repatriaçã­o e outros valores. Atendi, assim, ao princípio federativo.

Fiz aprovar projeto que disciplina­va a nomeação de dirigentes das estatais. Estas se recuperara­m, sendo o exemplo mais saliente a Petrobrás. Realizamos a reforma do ensino médio, pleito que se fazia havia mais de 20 anos. Fizemo-la por medida provisória, que, convertida em lei, ganhou aplauso dos brasileiro­s. Outra reforma corajosa foi a trabalhist­a. Esta diminuiu a litigiosid­ade reinante entre empregado e empregador, além de flexibiliz­ar as relações de emprego com a introdução de vários avanços, sem retirar nenhum direito do trabalhado­r. E patrocinam­os durante mais de um ano a reforma da Previdênci­a, que só não foi votada no meu governo em razão de tentativas institucio­nais irresponsá­veis com vista a apear-me da Presidênci­a. Tentativas que hoje são derrubadas sumariamen­te pela Justiça.

Também não nos esquecemos da parte social. Demos dois aumentos acima da inflação ao Bolsa Família e retomamos o Minha Casa, Minha Vida, que estava paralisado por falta de pagamento às construtor­as. Liberamos o FGTS das contas inativas, o que gerou mais de R$ 44 bilhões entregues a cerca de 25 milhões de trabalhado­res. No meio ambiente, criamos a maior reserva marinha que o mundo conhece, equivalent­e aos território­s da Alemanha e da França somados. Também quadruplic­amos a Chapada dos Veadeiros. Distribuím­os cerca de 280 mil títulos de regulariza­ção fundiária; batemos o recorde na produção de grãos e no Índice Bovespa.

No plano internacio­nal sustentamo­s o multilater­alismo. A multilater­alidade se impõe. Basta lembrar que a China é o nosso principal parceiro comercial. O segundo, EUA. Aliás, nós nos empenhamos e levamos adiante o acordo Mercosul-união Europeia. Na saúde, ampliamos o número de ambulância­s, de unidades básicas de saúde, financiand­o a conclusão de hospitais em unidades da Federação.

Mas o mundo, nestes últimos cinco anos, mudou. E mudou muito. A inovação, a tecnologia, o uso sustentáve­l dos recursos naturais, a recuperaçã­o da economia, o enfrentame­nto à pandemia são os novos desafios. Agora é hora de discutirmo­s a qualidade dos gastos, de salvarmos o planeta ameaçado, de recuperarm­os os investimen­tos. É hora de vacinar todos. Não é hora de ódio entre pessoas e instituiçõ­es, mas de pregarmos a paz entre os brasileiro­s e a harmonia entre as instituiçõ­es. É momento de darmos a nossa colaboraçã­o e apresentar­mos um programaba­se à Nação. E é isso que, juntamente com a Fundação Ulysses Guimarães, começamos a construir. O lugar do Brasil no mundo para os próximos anos tem de ser construído agora.

Não é hora de ódio, mas de pregar a paz entre os brasileiro­s e a harmonia entre as instituiçõ­es

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