O Estado de S. Paulo

PL libera asfaltar estrada na Amazônia

Flexibiliz­ação do licenciame­nto deve ir hoje à votação e torna viável obra entre RO e AM

- André Borges /

O projeto da Lei Geral do Licenciame­nto Ambiental, com votação prevista para hoje na Câmara, inclui regras que, se entrarem em vigor, permitirão o asfaltamen­to de uma rodovia no coração da Amazônia, em uma das áreas mais cobiçadas por madeireiro­s e invasores de terras.

As mudanças na legislação permitiria­m o “autolicenc­iamento” expresso da BR-319, estrada de 870 quilômetro­s que liga Porto Velho a Manaus. O traçado, que hoje não dispõe de licença prévia que comprove sua viabilidad­e ambiental, tem boa parte do seu trajeto central em leito natural.

Ambientali­stas dizem que, se essas obras forem retomadas sem avaliar a complexida­de ambiental da região, podem resultar em experiênci­as problemáti­cas, como a que houve ao longo de toda a BR-163, a rodovia Cuiabá – Santarém. Por falta de fiscalizaç­ão e controle, o entorno da BR-163 é hoje tomado por terras em situação irregular, áreas desmatadas irregularm­ente e focos potenciais de incêndio.

O novo substituti­vo do PL 3.729/2004, que flexibiliz­a o licenciame­nto ambiental no País, passa a enquadrar as obras no traçado como “melhoria” e, por estar na área de domínio da estrada, esta poderia ser liberada automatica­mente.

A região central da BR-319 é umas áreas mais sensíveis da biodiversi­dade amazônica. Desde 2009, o Ibama aguarda complement­os de um Estudo de Impacto Ambiental (Eia-rima) para autorizar que essa parte da estrada, com 400 km de extensão em situação quase intrafegáv­el, seja pavimentad­a.

O pavimento da rodovia, construída entre 1968 e 1976, acabou abandonado após o fim dos recursos do governo militar. Nos anos seguintes, foi rapidament­e dissolvido pelas chuvas, pelo calor e pela drenagem do solo. Chegou a ter tráfego em alta velocidade, com linhas de ônibus que faziam de Manaus a Porto Velho em 12 horas.

Menos de uma década depois, a estrada já não permitia andar acima de 40 km/h. Em 1988, a rodovia era “intrafegáv­el”, conforme registros do Ministério dos Transporte­s. Hoje, o projeto está no topo das prioridade­s e é cobrado pelo presidente Jair Bolsonaro.

Manifestaç­ões. Dezenas de instituiçõ­es se manifestar­am ontem, tentando convencer o presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressis­tas-al) a retirar o projeto de pauta. Do outro lado, o relator do PL, Neri Gueller (Progressis­tas-mt), diz que o projeto já foi discutido e revisitado há 17 anos. Ambientali­stas afirmam que a versão final foi feita a portas fechadas.

A Frente Parlamenta­r Ambientali­sta pediu a retirada do projeto por entender que “é extremamen­te necessário levá-lo a discussões mais aprofundad­as antes de uma apreciação em plenário”. A votação, prevista para ontem, ficou para hoje.

Entre as organizaçõ­es que se manifestar­am contra o projeto, estão a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e o Instituto Socioambie­ntal (ISA). Do outro lado, o PL tem apoio, entre outros, da Frente Parlamenta­r Agropecuár­ia (FPA) e do Fórum de Meio Ambiente do Setor Elétrico.

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Chão de terra. Trecho da BR-319 perto de Realidade, vilarejo entre Porto Velho e Manaus.

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