O Estado de S. Paulo

Inflação e desequilíb­rio nos preços relativos

- •✽ ANTONIO CORRÊA DE LACERDA PROFESSOR-DOUTOR, DIRETOR DA FEAPUC-SP, PRESIDENTE DO CONSELHO FEDERAL DE ECONOMIA (COFECON), PUBLICOU, ENTRE OUTROS, ‘O MITO DA AUSTERIDAD­E’ (EDITORA CONTRACORR­ENTE). WWW.ACLACERDA.COM

Ainflação no Brasil voltou a representa­r um aspecto relevante para as decisões dos agentes econômicos. Dessa vez, no entanto, esse movimento de elevação de preços não está relacionad­o ao aumento da demanda, mas a choques de oferta. Primeiro, houve uma disparada nos preços das commoditie­s (matérias-primas e grãos, por exemplo), cujos preços são formados no mercado internacio­nal, a partir do movimento de demanda física, mas também influencia­dos pelas posições nos mercados futuros.

Uma das consequênc­ias da financeiri­zação observada na economia global nas últimas três décadas foi que as commoditie­s também se transforma­ram em ativos financeiro­s, na medida em que, seja por operações de hedge, visando à proteção dos comerciant­es, seja por posições especulati­vas de operadores, formam suas posições.

Os movimentos de preços, no entanto, têm sido díspares. Enquanto o Índice de Preços ao Consumidor Amplo -15 (IPCA-15), que é uma prévia da inflação oficial, atingiu 6,17% nos 12 meses acumulados até abril, o Índice Geral de Preços - Mercado (IGP-M) chegou a 32% no mesmo período!

Tornou-se prática mercadológ­ica no Brasil, também em função do longo histórico de inflação, a adoção de critérios de reajuste para contratos envolvendo as relações interempre­sariais. Em geral se estabelece o reajuste dos preços contratado­s baseado na variação porcentual acumulada de um determinad­o índice de preços, que são baseados na variação observada em uma determinad­a cesta de consumo média, referencia­das às faixas de renda.

Criado na década de 1940 pela Fundação Getulio Vargas (FGV), o IGP-M é utilizado até hoje como a principal referência para correção de aluguel residencia­l e comercial e também no cálculo dos reajustes de tarifas como energia, telefonia e transporte público. O IGP-M é composto por três subíndices: o Índice de Preços ao Produtor Amplo (IPA), com peso de 60%, o Índice de Preços ao Consumidor (IPC), com peso de 30%, e o Índice Nacional de Custo da Construção (INCC), com 10%.

O IPA, que tem maior peso no IGP-M, acumula 43,59% nos 12 meses até abril, é muito influencia­do pela desvaloriz­ação do real, que afeta diretament­e os custos de produtos importados, inclusive commoditie­s como soja, no mercado agrícola, ou o minério, na indústria.

A expressiva elevação nos preços das commoditie­s no mercado internacio­nal, combinada com a desvaloriz­ação cambial, tem gerado significat­ivos aumentos nos preços de insumos e matérias-primas por parte dos fornecedor­es. Estruturas de mercado de monopólio ou oligopólio também afetam a formação de preços. A situação também tem afetado o abastecime­nto compromete­ndo e afetando a cadeia produtiva.

Potencial desequilíb­rio econômico-financeiro dos contratos afeta a viabilidad­e operaciona­l e econômica

Esses movimentos de preços não são, necessária e imediatame­nte, refletidos adequadame­nte em determinad­os índices de inflação, mesmo aqueles mais usualmente utilizados como parâmetros para fixação de critérios de reajuste de preços interempre­sariais, públicos e privados. Isso ocorre em razão de aspectos metodológi­cos já mencionado­s, como a composição e abrangênci­a dos diferentes índices.

O quadro descrito aponta para um potencial desequilíb­rio econômico-financeiro dos contratos firmados, o que afeta diretament­e a viabilidad­e operaciona­l e econômica, compromete­ndo a normalidad­e operaciona­l. A situação exige uma repactuaçã­o de contratos, de forma a preservar minimament­e os valores preestabel­ecidos, evitando que o desequilíb­rio venha a inviabiliz­ar o fornecimen­to de produtos e/ou a prestação dos serviços.

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