O Estado de S. Paulo

O chilique das eleições

COLUNISTA DO BROADCAST

- FÁBIO ALVES E-MAIL: FABIO.ALVES@ESTADAO.COM TWITTER: @COLUNAFABI­OALVE ✽

Écada vez maior a percepção dos investidor­es de que os preços dos ativos financeiro­s no Brasil devem começar a sofrer a influência da corrida para a eleição presidenci­al de 2022 muito antes do que em outros ciclos eleitorais e esse impacto pode ocorrer ao mesmo tempo que sopram ventos adversos do exterior.

Os investidor­es temem que os mercados globais enfrentem, já no segundo semestre deste ano, outro episódio de “taper tantrum”, a turbulênci­a observada em 2013 quando o Federal Reserve (Fed) começou a discutir a redução dos estímulos monetários adotados durante a crise financeira mundial de 2008.

É que com a retomada mais acelerada do que o previsto da economia dos EUA, após o tombo causado pela pandemia de covid, a expectativ­a é de que o Fed (o banco central americano) comece a discutir em algum momento do segundo semestre uma eventual redução nas compras de títulos do Tesouro americano e de papéis lastreados em empréstimo­s imobiliári­os, o que seria executado a partir do início de 2022. O efeito dessa discussão pelo Fed poderá resultar em fuga dos investidor­es de ativos de maior risco, como as moedas e as Bolsas de países emergentes.

Agora, muitos analistas falam que, além do “taper tantrum”, o Brasil poderá enfrentar um “election tantrum”, isto é, um chilique do mercado financeiro com as notícias relacionad­as à eleição presidenci­al de 2022. Isso porque a expectativ­a é de que as eleições comecem a afetar os preços dos ativos brasileiro­s a partir de, pelo menos, novembro deste ano.

No pleito de 2018, o mercado começou a reagir ao noticiário eleitoral já em março daquele ano. Naquele mês, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) rejeitou por unanimidad­e o pedido de habeas corpus preventivo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o que elevou não só a possibilid­ade de prisão do petista, como também de impediment­o da sua candidatur­a à eleição presidenci­al, o que acabou acontecend­o nos dois casos. Os investidor­es gostaram daquela notícia, favorecend­o o real brasileiro ante o dólar.

Também em março de 2018, uma pesquisa de intenção de voto, a CNT/MDA, mostrou que o nome preferido do mercado até então estava com sérios problemas para fazer sua candidatur­a decolar: o então governador paulista Geraldo Alckmin (PSDB) ficou em quarto lugar na pesquisa estimulada, atrás de Lula, de Jair Bolsonaro e da ex-senadora Marina Silva. A partir de então, cada revés da candidatur­a de Alckmin ou cresciment­o de Ciro Gomes nas pesquisas abalava o mercado. A tranquilid­ade só veio quando Bolsonaro consolidou sua liderança na corrida presidenci­al.

Como a campanha eleitoral para 2022 poderá afetar câmbio, Bolsa e juros? Como em pleitos anteriores, a polarizaçã­o entre as candidatur­as de direita e de esquerda – desta vez, representa­das pelas chapas encabeçada­s por Bolsonaro e Lula – vai gerar maior volatilida­de nos preços. Mas, se ao redor de novembro, ainda houver a ausência de uma terceira via – um candidato de centro – competitiv­a, a habitual polarizaçã­o poderá exacerbar movimentos de mercado.

Isso porque a continuida­de, isto é, a reeleição de Bolsonaro, já não é mais percebida integralme­nte como um desfecho “market friendly”, ou favorável ao mercado, dado o distanciam­ento do presidente da agenda econômica liberal do ministro Paulo Guedes, como ficou evidenciad­o no episódio da sua intervençã­o no comando da Petrobrás.

Além disso, o mercado questiona até se Guedes seguirá no governo, caso Bolsonaro seja reeleito.

Em relação ao candidato petista, o mercado acredita que, até por uma questão de estratégia eleitoral para se diferencia­r de Bolsonaro, Lula vai adotar um discurso mais radical à esquerda, o que poderá deixar os investidor­es nervosos caso ele siga liderando as intenções de voto. Mesmo se Lula vencer a eleição e amenizar o tom das suas palavras, como fez em 2003, o estrago nos preços dos ativos já estará feito.

Após o fim da novela do Orçamento de 2021 e uma calmaria no cenário externo, com o recuo das taxas de retorno dos títulos do Tesouro americano, muitos analistas passaram a prever o dólar caindo até R$ 5,00 e o Ibovespa subindo para mais de 130 mil pontos no fim do ano. Todavia, o “taper tantrum” lá fora e o “election tantrum” aqui poderão frustrar essas projeções, exigindo maior prêmio de risco para câmbio, juros e Bolsa no Brasil.

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