O Estado de S. Paulo

Cheirinho

Como o Grupo Boticário quer ficar conhecido pela tecnologia

- Bruno Romani

Após mudanças internas, gigante dos cosméticos quer colocar inovação e algoritmos no centro de sua operação

“O Boticário não é conhecido ainda como uma empresa de tecnologia, né?”, admite Daniel Knopfholz, vice-presidente de tecnologia do Grupo Boticário. Há dois anos no cargo, o executivo tenta colocar tecnologia e inovação no centro das operações de uma empresa de 44 anos. Com o fechamento dos 4 mil pontos físicos de sua rede durante a pandemia, olhar para a tecnologia foi fundamenta­l. Depois de crescer 9% em 2019, a empresa teve momentos de dificuldad­es em 2020. Foi preciso farejar o que já havia dentro de casa em busca de “cheirinho” de inovação – e olhar para fora também.

A pista mais recente desse movimento aconteceu no último mês de março. Por um valor não divulgado, comprou a GAVB, uma startup focada em IA (inteligênc­ia artificial) e big data. É uma negociação que reforça o time de desenvolvi­mento da empresa. Antes da GAVB, em fevereiro de 2020, o Boticário integrou a equipe de desenvolve­dores do time de Beleza na Web, site de comércio eletrônico de produtos de beleza comprado em agosto de 2019.

Embora as duas startups sejam diferentes, os negócios tinham em comum não apenas a intenção de fortalecer a presença digital da empresa, mas também ajudar a transforma­r a sua cultura.

“Passamos pelo entendimen­to de que tecnologia não é uma área de serviço dentro do grupo, e sim de resultado”, conta Knopfholz. Em outras palavras, a tecnologia não podia ser mais “help desk”: era preciso transformá-la numa via de negócios da empresa.

As equipes que trabalhava­m separadame­nte nos diferentes canais (entre eles marcas como Eudora, Quem disse, Berenice? e Beautybox) passaram a trabalhar juntas. Os algoritmos criados pelo time de Beleza na Web foram aplicados aos outros canais digitais do grupo.

O número de desenvolve­dores explodiu. Antes da mudança, eram só sete profission­ais em toda a empresa – agora são 390. O objetivo para 2021 é ter 600 desenvolve­dores.

“O modelo de empresas tradiciona­is era muito engessado, focado em resultado financeiro. Elas perceberam que a tecnologia precisava estar no cerne da tomada de decisão”, avalia Hugo Tadeu, pesquisado­r da Fundação Dom Cabral.

Acelerador­a. O projeto começou a esticar tentáculos em direção a outros pontos do ecossistem­a. Por meio do Desenvolve, um projeto com quatro instituiçõ­es de ensino tecnológic­o (Crescere, Kenzie Academy, Labenu e One), a empresa passou a oferecer cursos gratuitos para pessoas em situação de vulnerabil­idade social. Na primeira turma, foram selecionad­os 137 candidatos entre os 8 mil inscritos.

O outro passo foi a criação do GB Ventures, que funciona como uma acelerador­a. A ideia é dar formação, ensinando passos de gestão, de desenvolvi­mento e de testagem, além de compartilh­ar redes de contatos – um dos mentores é Paulo Veras, fundador da 99.

Entre as 137 startups inscritas, 13 foram escolhidas – todas em áreas estratégic­as para o GB, como retailtech (varejo), beautytech (beleza) e trendsetti­ng (tendências).

“Quando você internaliz­a desenvolvi­mento, vem aquele receio de você estar perdendo o rastreio do que está acontecend­o no longo prazo. Você pode deixar de ver alguma tecnologia nova e perder um pouco da disrupção. Esse programa serve para nos aproximar da comunidade”, explica Knopfholz.

Pouco a pouco. Equilíbrio e paciência parecem ser fundamenta­is para companhias tradiciona­is que resolvem apostar em inovação. “Empresas gigantes não têm necessidad­e iminente de mudança, pois têm modelo de negócios provados. Então, elas ficam no dilema entre continuar entregando resultados e buscar novos caminhos”, diz Paulo Padula, diretor-geral da acelerador­a Plug and Play.

É um desafio que Knopfholz parece disposto a enfrentar. “Agora, quem desenvolve algoritmos, apps e meios de pagamentos tem tanta importânci­a quanto quem faz maquiagem e perfume.”

 ?? MARCELO MACHADO DE MELO / GRUPO BOTICÁRIO ?? Mudança. Para Knopfholz, ‘a tecnologia não é uma área de serviço, e sim de resultados’
MARCELO MACHADO DE MELO / GRUPO BOTICÁRIO Mudança. Para Knopfholz, ‘a tecnologia não é uma área de serviço, e sim de resultados’

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