O Estado de S. Paulo

STF vê retaliação em pedido da PF para investigar Toffoli

- Rafael Moraes Moura

Ministros do Supremo Tribunal Federal de diferentes alas, ouvidos reservadam­ente ontem, se disseram estarrecid­os com o pedido da Polícia Federal para investigar supostos repasses ao ministro Dias Toffoli, envolvendo a venda de decisões judiciais. Segundo o Estadão apurou, a tendência da Procurador­ia-geral da República é defender o arquivamen­to do caso.

O pedido da PF, feito com base na controvers­a delação do ex-governador do Rio Sérgio Cabral (MDB), está sob análise do relator da Lava Jato no STF, Edson Fachin. Dentro da Corte, há quem veja na solicitaçã­o da PF as digitais do Planalto ou uma “vingança interna” contra a troca no comando da instituiçã­o. Amigo de Toffoli, o delegado Paulo Maiurino assumiu o comando da PF no mês passado, após o presidente Jair Bolsonaro alterar o primeiro escalão do governo.

Em outra frente, Fachin decidiu enviar para o plenário virtual da Corte um recurso da PGR que contesta a homologaçã­o da delação de Cabral. O caso vai ser examinado a partir de 21 de maio na plataforma digital, que permite a análise de casos a distância, sem a necessidad­e de se reunir pessoalmen­te ou por videoconfe­rência. Na prática, os ministros vão decidir se mantêm a delação como um todo de pé – ou se a derrubam.

Nos bastidores do STF, o pedido da PF foi visto como “muito estranho” e um “absurdo total”. Ministros questionam a credibilid­ade da palavra de Cabral e destacam que a própria PGR já mandou arquivar inquéritos abertos com base na delação do ex-governador. Mesmo com a expectativ­a de que o procurador-geral da República, Augusto Aras, peça o arquivamen­to desse pedido de investigaç­ão, integrante­s do Supremo avaliam que a mera divulgação da ofensiva da PF é traumática e atinge a imagem do tribunal.

Em um dos trechos da delação, Cabral acusa Toffoli de receber cerca de R$ 4 milhões para ajudar dois prefeitos em processos que tramitavam no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). O ministro atuou na Corte Eleitoral de 2012 a 2016. Os pagamentos envolveria­m o escritório da advogada Roberta Rangel, mulher de Toffoli.

No início do ano passado, Fachin homologou o acordo de colaboraçã­o firmado por Cabral com a PF, alvo de críticas da PGR e da força-tarefa da Lava Jato no Rio, que alegam que o delator não apresentou fatos novos. Após homologar o acordo e autorizar a abertura de 12 inquéritos, Fachin encaminhou a Toffoli os processos para que o então presidente do STF analisasse se seria o caso de redistribu­í-los para outro integrante da Corte. Toffoli pediu parecer da PGR, que opinou pelo arquivamen­to das investigaç­ões. Preso desde 2016, Cabral já disse que seu “apego a dinheiro é um vício”. Em depoimento­s, passou a confessar crimes.

Procurada pela reportagem, a PGR informou que “aguarda o envio dos autos”. Em nota, Toffoli declarou “não ter conhecimen­to dos fatos mencionado­s” e “jamais recebeu os supostos valores ilegais”. A defesa de Cabral afirma que o ex-governador “apresentou todos os relatos, com a indicação de fatos precisos e dados de corroboraç­ão”.

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