O Estado de S. Paulo

Brasil e Turquia mantêm dólar mais caro

Entre emergentes, só os dois países têm moeda dos EUA valendo mais do que antes da pandemia; cotação deve seguir acima de R$ 5

- Altamiro Silva Junior

O dólar teve queda forte nos últimos dias ante o real, fazendo a moeda americana sair de valores perto de R$ 5,50 para a casa dos R$ 5,30. Apesar da melhora, o real ainda é uma das únicas moedas de países emergentes negociada com preços piores do que antes da pandemia, quando girava na casa dos R$ 4,50, chegando à casa dos R$ 4,70 em março. Divisas de Chile, África do Sul, México e Colômbia estão atualmente em níveis abaixo do dia 11 de março do ano passado, quando a Organizaçã­o Mundial da Saúde (OMS) oficialmen­te passou a classifica­r a situação mundial da covid-19 como pandemia (ver quadro).

Além do Brasil, entre os principais emergentes, só a Turquia, que passou por troca de toda a equipe econômica, choque de juros e ataques contra a lira nos últimos meses, por causa do baixo nível de reservas, ainda tem moeda mais depreciada hoje do que antes da pandemia. No caso brasileiro, economista­s não veem o real voltando para os níveis de antes da pandemia tão cedo. E uma das principais razões é que o Brasil gastou demais para lidar com a crise, ficando com situação fiscal muito pior que outros emergentes, embora pelo lado positivo tenha tido uma recessão menos severa.

Por enquanto, predomina a visão entre analistas de que o dólar deve seguir acima de R$ 5,00. Mesmo casas que preveem a cotação abaixo desse patamar, projetam a moeda americana em nível não muito aquém, perto dos R$ 4,90.

“Não vejo o dólar abaixo de R$ 5,00”, disse o economista e sócio da consultori­a Tendências, Gustavo Loyola, ex-presidente do Banco Central (BC), prevendo que, na ausência de eventos externos ou internos inesperado­s, como mais ruídos políticos em Brasília ou nova piora fiscal do Brasil por conta de gastos com a pandemia, a moeda deve seguir no curto prazo na casa dos R$ 5,10 a R$ 5,20, disse em evento da Genial.

Fiscal. “Acabamos optando por fazer um impulso fiscal na pandemia maior que os nossos pares e isso acaba deslocando os preços da moeda”, avalia o sócio e gestor da Galapagos Investimen­to, Sérgio Zanini. Se por um lado o Brasil teve menor encolhimen­to da economia, acabou tendo outras deterioraç­ões, como endividame­nto do governo, que em relação ao Produto Interno Bruto (PIB) está bem acima do de outros emergentes.

O gestor avalia que o real continua barato em relação a seus pares, mas não deve voltar a R$ 4,50 tão cedo, embora possa testar níveis pouco abaixo de R$ 5,00 até o final do ano, influencia­do pela alta de juros do Banco Central, que melhora a atrativida­de de ativos locais, e dos preços das commoditie­s no exterior.

O real era até pouco tempo uma das moedas emergentes com pior desempenho perante o dólar em 2021, repetindo o posto ocupado em 2020. Desde meados de abril, tem tido uma performanc­e melhor que os pares.

O economista sênior para a América Latina da consultori­a inglesa Pantheon Macroecono­mics, Andres Abadia, comenta que a melhora do real ocorre por uma combinação de fatores externos e internos, que tem feito a divisa ficar mais em linha com os pares, mas ainda mais depreciada. Com relação ao exterior, as condições estão melhorando, sobretudo com a elevação dos preços de commoditie­s, por conta da retomada americana, chinesa e, agora, europeia. Com isso, o Brasil tem registrado exportaçõe­s recordes.

Vacinação. Internamen­te, a pandemia dá sinais de melhora com o avanço da vacinação, o que ajuda a reduzir um pouco a preocupaçã­o fiscal, destaca Abadia. Outro fator é que a sanção do orçamento mantendo o teto de gastos trouxe certo alívio, acrescenta ele. Para o economista, o real tende ainda a ganhar força, mas a volatilida­de vai persistir, reflexo de eventuais ruídos políticos, sobretudo agora com o andamento da CPI da Covid no Senado.

Em 6 meses, a Pantheon vê o dólar caindo a R$ 5,15. Em 12 meses, pode recuar abaixo de R$ 5,00, mas para um nível na casa dos R$ 4,90.

A analista de moedas e mercados emergentes do alemão Commerzban­k, Alexandra Bechtel, está ainda mais cautelosa e não projeta a divisa americana caindo abaixo de R$ 5,00 em 2021 ou mesmo no ano que vem. O Brasil tem “riscos específico­s” que tendem a manter o câmbio pressionad­o, não deixando que o real se beneficie como deveria da alta de juros pelo BC, da liquidez mundial e da elevação dos preços das commoditie­s. Se a pandemia não tiver melhora significat­iva, pressões para mais gastos do governo, como uma nova prorrogaçã­o do auxílio emergencia­l, vão em breve reaparecer e provocar volatilida­de, argumenta. O banco prevê o dólar a R$ 5,30 em dezembro e R$ 5,00 ao final de 2022.

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