O Estado de S. Paulo

Grupos dos dois lados se beneficiam da instabilid­ade

- ✽ Gunther Rudzit ✽ É PROFESSOR DE RELAÇÕES INTERNACIO­NAIS E COORDENADO­R DO NÚCLEO DE ESTUDOS E NEGÓCIOS EM ORIENTE MÉDIO (NENOM) DA ESPM

Anova explosão de violência entre israelense­s e palestinos se deve a algumas situações de imobilismo, principalm­ente, na política. Desde os Acordos de Paz de Oslo, de 1993, israelense­s e palestinos vêm discutindo a criação de dois Estados. Mas, por motivos internos e externos, essa proposta não se concretizo­u após quase três décadas. Assim, grupos de ambos os lados que se beneficiam politicame­nte deste impasse, apoiam ou incentivam momentos de violência para manter seu status quo político.

Do lado palestino, desde 2007, com a tomada do poder na Faixa de Gaza pelo Hamas, há duas lideranças, uma vez que o líder da Fatah, Mahmoud Abbas, dissolveu o governo de união e decretou estado de emergência. Desde então, há a promessa de novas eleições que nunca se concretiza­ram. Esta realidade faz com que o ressentime­nto cresça entre os jovens palestinos. Os dados de 2017 mostram que a população palestina era de 4,9 milhões, sendo que 58% tinha menos de 24 anos.

Há uma geração que cresceu ouvindo a promessa de um Estado próprio, mas que nunca chega, e se organiza em redes sociais, sem depender da Autoridade Palestina. Portanto, se torna muito difícil conseguir uma negociação para acalmar a situação.

Do lado israelense, uma plena democracia, há um impasse político materializ­ado em quatro eleições gerais em dois anos e a não formação de um novo gabinete. Hoje, o Parlamento tem 13 partidos, com a maior bancada do Likud, com 30 assentos, seguido pelo Yesh Atid, de oposição, com 17. O restante varia entre 9 e 4 deputados, uma fragmentaç­ão muito grande.

Por isso, o primeiro-ministro Binyamin Netanyahu tem precisado buscar apoio em pequenos partidos religiosos e de extrema direita, contrários à concessão dos território­s aos palestinos, além de apoiarem a expansão das colônias judaicas na Cisjordâni­a e em Jerusalém Oriental. Portanto, é muito difícil para o governo israelense conseguir apoio em um tema que não há consenso na sociedade dividida.

Por fim, temos o governo de Joe Biden nos Estados Unidos, que sempre apoiou a solução de dois Estados. No entanto, desde sua posse, a Casa Branca evitou abordar o tema, uma vez que seu foco é a crise interna da pandemia e, no âmbito externo, a China. Assim, o principal ator externo que pode fazer os dois lados voltarem para a mesa de negociação também está imobilizad­o.

Contudo, essa nova onda de violência, em especial entre Hamas e Israel, deve mudar este imobilismo americano e internacio­nal, fazendo com que o conflito aberto termine logo. Os fatores que têm bloqueado o avanço das negociaçõe­s devem permanecer. O imobilismo dos dois lados continuará impedindo ambos de tomarem decisões difíceis para a criação do Estado palestino. Por isso mesmo, o desencanto dos jovens palestinos continuará crescendo, fazendo com que a violência quase diária nos dois lados permaneça, e não chame a atenção do mundo mergulhado em tantas outras crises.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil