O Estado de S. Paulo

MEC admite não ter verba para o Enem

Ofício à Economia fala em falta de dinheiro para pagar 92 mil cientistas; em algumas áreas, atividades já podem parar em julho

- Júlia Marques

O Ministério da Educação (MEC) admitiu em documento ao ministro da Economia, Paulo Guedes, que a verba destinada ao Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) de 2021 é insuficien­te para aplicar a prova em todos os participan­tes. Também vai faltar dinheiro para pagar bolsas de 92 mil cientistas, incluindo pesquisado­res da covid19, médicos residentes e para livros didáticos. Em ofício obtido pelo Estadão, a pasta pede dinheiro para “viabilizar projetos” e fala em impactos pedagógico­s “imensos”.

O documento encaminhad­o anteontem pelo ministro da Educação, Milton Ribeiro, à Economia pede o desbloquei­o de R$ 2,7 bilhões e a suplementa­ção de R$ 2,6 bilhões, sob o risco de deixar sem verba “diversas demandas essenciais à área da educação”, entre elas a realização do Enem. O MEC foi a pasta mais atingida pelo bloqueio de verbas realizado em abril pelo presidente Jair Bolsonaro.

Para aplicar o Enem, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educaciona­is (Inep), órgão ligado ao MEC e responsáve­l pelo exame, prevê gastar R$ 794 milhões este ano. Com R$ 226,7 milhões bloqueados, o orçamento total do Inep é de R$ 1,183 bilhão, mas seria necessário quase o dobro do dinheiro para atender às necessidad­es da autarquia, que também realiza outras avaliações educaciona­is.

“Especifica­mente com relação ao Enem, a insuficiên­cia orçamentár­ia resultaria na inexecução dos serviços, tendo em vista a quantidade de participan­tes prevista para 2021”, aponta o ofício. O Inep estima ter 6 milhões de alunos inscritos nesta edição do Enem, além de 100 mil estudantes na aplicação da prova digital. “O montante disponibil­izado não atenderia a totalidade de aplicações/participan­tes previstas, o que de fato poderia trazer prejuízos às aplicações do Enem e ao Inep”, afirma o MEC.

No mesmo documento, o MEC cita ainda os prejuízos à pesquisa brasileira, com cortes na Coordenaçã­o de Aperfeiçoa­mento de Pessoal de Nível Superior (Capes), fundação que fomenta a pós-graduação. Segundo a pasta, todos os 92.377 bolsistas de mestrado, doutorado e pós-doutorado “não poderão ser pagos” a partir de novembro. “Entre o total de bolsas, cabe destacar a interrupçã­o do pagamento de 795 bolsistas vinculados a 109 projetos de combate à covid-19, com o envolvimen­to de 1.280 pesquisado­res”, destaca o ofício. Além do desbloquei­o de verbas, a Capes precisa de R$ 121,5 milhões para garantir pagamento aos bolsistas.

Faltam ainda recursos para o programa de residência médica. O dinheiro recebido até agora será suficiente para pagamento das bolsas até setembro e o MEC já prevê reduzir o programa. Residentes têm atuado diretament­e no combate à pandemia em hospitais. “O valor atual programado para a ação orçamentár­ia contempla recursos suficiente­s para a manutenção de apenas 10.800 bolsas de residência, de um total de 13.883.” A contrataçã­o de supervisor­es e tutores para o programa Mais Médicos também fica comprometi­da. ofício admite que a partir de setembro não haverá dinheiro para bolsas de permanênci­a no ensino superior. Os recursos são destinados a estudantes de baixa renda. E o “funcioname­nto geral” das universida­des federais também pode ficar comprometi­do, segundo o MEC. As instituiçõ­es falam em paralisar atividades em julho.

Livros e alfabetiza­ção. Até programas considerad­os prioritári­os para a gestão Jair Bolsonaro sofrem impactos dos cortes. Na alfabetiza­ção, a previsão é de atender 16% a menos dos estudantes com cortes na formação de professore­s para essa área. E os livros didáticos podem não ser entregues em 2021 porque um terço da verba está comprometi­do. O investimen­to mínimo é de R$ 3 bilhões, mesmo valor do “orçamento secreto” de Bolsonaro, esquema revelado pelo Estadão.

Procurado, o MEC não se manifestou. Já a Economia disse que o bloqueio visa ao atendiment­o de despesas obrigatóri­as. “Caso novas projeções de despesas obrigatóri­as indiquem queda do valor projetado dessas despesas, os valores bloqueados poderão ser reavaliado­s”, informou a pasta. “Até esta data não existe previsão para eventual desbloquei­o.”

 ?? FELIPE RAU/ESTADÃO–3/11/2019 ?? Teste nacional. Inep estima ter 6 milhões de alunos inscritos na próxima edição do Enem
FELIPE RAU/ESTADÃO–3/11/2019 Teste nacional. Inep estima ter 6 milhões de alunos inscritos na próxima edição do Enem
 ??  ?? Oficial. Economia diz não existir previsão de desbloquei­o
Oficial. Economia diz não existir previsão de desbloquei­o

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil