O Estado de S. Paulo

O nosso Biden Como se um Biden, aquele em Washington, não fosse suficiente para a humanidade.

- J. R. Guzzo

Uma das ideias fixas preferidas do noticiário político do momento é descobrir, em algum canto do Brasil, um “Joe Biden” brasileiro, capaz de arrumar uns 70 milhões de votos, ou por aí, e derrotar o presidente Jair Bolsonaro nas eleições do ano que vem – como se um Biden, aquele que está em Washington, já não fosse mais do que suficiente para as necessidad­es atuais da humanidade. O que se vai fazer? Biden virou, para os altos mestres da ciência política, o presidente ideal para qualquer país do mundo de hoje – procura-se, desesperad­amente, um Biden paraguaio, um Biden esquimó, e por aí vamos. Por que não, nesse caso, um Biden brasileiro? É onde viemos parar.

Os Bidens made in Brazil, até agora, incluem alguns dos nomes mais inesperado­s, ou francament­e esquisitos, que alguém poderia imaginar; na verdade, pelo jeito como vão as coisas, e com um mínimo de trato, qualquer um pode ser um Biden brasileiro hoje em dia. Por exemplo: que tal, nos seus quase 81 anos de idade, o ex-presidente Michel “Fora” Temer? Acredite se quiser, mas ele é um dos personagen­s citados na galeria de possíveis candidatos à posição de salvador do Brasil em 2022. Na mesma linha, foram capazes de ressuscita­r um político cearense do qual não se falava segurament­e há anos, talvez nem no Ceará – o senador Tasso Jereissati. E o atual presidente do Senado Federal, então? A soma total de suas realizaçõe­s, até agora, teria sido uma visita do ex-presidente Lula – mas acabou não rolando.

Sumiram de vista e das listas de Biden brasileiro, como numa miragem, gente como o governador João Doria, o apresentad­or de televisão Luciano

Huck e, por mais surpreende­nte que possa ter sido a lembrança do seu nome, o ex-futuro presidente reeleito da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, que caiu em exercício findo depois que o seu projeto presidenci­al virou suco; não deu certo nem na Câmara. Até algum tempo atrás, eram citados entre as grandes esperanças de um Brasil de centro, civilizado e social-democrata. Hoje, coitados, ninguém se lembra mais deles – ficaram para trás, imaginem, até do senador Tasso.

O mais curioso dessa história toda é que, apesar de continuar a intensa procura pelo nome mágico, o Biden brasileiro já foi encontrado há pelo menos dois meses inteiros – é o ex-presidente Lula. Desde o último dia 8 de março, quando o ministro Fachin, com o apoio em massa do STF, anulou de uma vez só as quatro ações penais contra Lula, inclusive a sua condenação em terceira e última instância pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, o ex-presidente passou a ser o candidato único da oposição a Jair Bolsonaro. É ele e ninguém mais. Podem ficar procurando, pelo resto da vida, um candidato “contra os extremos” – não vão encontrar e, aí, o antiextrem­ista vai ser Lula. É a velha história: se não tem tu, vai tu mesmo.

Tanto faz o que aconteça com Lula em sua campanha. É 100% certo que ele será apresentad­o como um fenômeno de equilíbrio, moderação e bondade – um Biden para ser elogiado pelo próprio Joe Biden. Mais cedo ou mais tarde vai cair a ficha indicando que só Lula pode disputar as eleições de 2022 com chance real de vitória. Desse momento em diante, todos vão fazer de conta que não há nada de errado em colocar na Presidênci­a da República um político legalmente condenado pela Justiça como ladrão. Ele vai ser o homem do “centro”; tudo resolvido.

Lula é a garantia de que nada mudará no Brasil velho que manda na vida pública. É bom para 99% do mundo político, da elite e de todos aqueles, das empreiteir­as de obras às estrelas do petrolão, cujo maior sonho é deixar errado tudo o que está errado.

Lula é a garantia de que nada mudará no Brasil velho que manda na vida pública

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