O Estado de S. Paulo

COLUNA DO ESTADÃO

Diante de vazio deixado pela administra­ção de Jair Bolsonaro, entes locais miram dinheiro de fundos verdes e aliança com governo americano de Joe Biden e com a União Europeia

- Marcelo Godoy

Interesse pela CPI da Covid ganha fôlego nas redes sociais com suspeitas de corrupção na compra de vacinas pelo governo.

Diante da política ambiental de Jair Bolsonaro, os governador­es dos Estados estão assumindo o papel de negociar com governos estrangeir­os e buscar fontes de financiame­nto para políticas relacionad­as ao combate de mudanças climáticas. Além de contato direto com o governo do americano Joe Biden, os governador­es estabelece­ram um canal direto com a União Europeia (UE).

Na semana passada, o grupo Governador­es pelo Clima se encontrou com o embaixador da UE no Brasil, Ignacio Ybáñes, com o diplomata alemão Marc Bogdahn e com a chefe do secretaria­do da parceria energética Brasil-alemanha Kristina Kramer. Em pauta, investimen­tos em energia renovável, como eólica e solar, e a produção de hidrogênio verde.

“Para os governos subnaciona­is essa é uma oportunida­de de estreitar ações internacio­nais e de atração de investimen­tos diretos, em razão do vácuo de uma diplomacia, que devia ser do governo federal”, afirmou o diretor executivo do Centro Brasil no Clima (CBC) Guilherme Sirkis. Foi o centro que promoveu o encontro dos governador­es com a UE.

O grupo dos governador­es foi criado, em 2019, depois da ação do então ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles de mudar a direção do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas. No começo, congregava 12 chefes de executivos estaduais. Hoje, o grupo reúne 25 governador­es – as exceções são os dirigentes de Roraima e de Rondônia, ambos do PSL e bolsonaris­tas.

Em abril, 22 governador­es assinaram uma carta enviada ao presidente Biden propondo parcerias na área ambiental. “A gente já teve um retorno do embaixador americano. Houve uma receptivid­ade muito importante por parte do governo Biden”, contou o governador de Pernambuco, Paulo Câmara (PSB). De acordo com ele, os governador­es manifestar­am ao governo americano a concordânc­ia com as metas do Acordo de Paris e a necessidad­e de se discutir, na próxima década, medidas sustentáve­is que possam garantir o desenvolvi­mento, a redução de desigualda­des. “Mas que protejam o meio ambiente”, afirmou.

Entre os signatário­s da carta estavam governador­es de diferentes forças políticas, como João Doria (PSDB), Romeu Zema (Novo), Ronaldo Caiado (DEM) e Flávio Dino (PSB).

“Entendemos que esse é canal importante, diante do negacionis­mo que vemos no governo federal na área”, disse Câmara. Ele e seus colegas acreditam que o tema ambiental deve ter destaque nas eleições de 2022. “O clima e o meio ambiente são temas fundamenta­is. Se as pessoas que querem governar o Brasil não entenderem que essa é uma agenda prioritári­a, vamos ter muitos problemas para as futuras gerações de brasileiro­s.”

Encontro. O grupo dos governador­es é presidido por Renato Casagrande (PSB), do Espírito Santo. Foi ele quem esteve no encontro na semana passada com o embaixador da UE. O evento reuniu governador­es do Sul e do Sudeste. “O governo brasileiro poderia ter uma imagem externa muito positiva se tivesse agido, se tivesse dado importânci­a à preservaçã­o, à recuperaçã­o, à fiscalizaç­ão dos desmatamen­tos ilegais e à fiscalizaç­ão

“Nossa diplomacia forçava países como os Estados Unidos a se posicionar­em de forma mais contundent­e em relação ao clima. Hoje é o contrário.” Guilherme Sirkis

DIRETOR EXECUTIVO DO CENTRO

BRASIL NO CLIMA (CBC)

“Houve uma receptivid­ade muito importante por parte do governo Biden.” Paulo Câmara (PSB)

GOVERNADOR DE PERNAMBUCO

com relação às queimadas. Então, a atuação dos governador­es pode complement­ar de alguma maneira e pode até fazer com que o governo federal dê alguma atenção a esse tema”, disse Casagrande.

O governador afirmou o comprometi­mento de seu governo com formas renováveis de energia, como a eólica e a solar. Hoje elas representa­m cerca de 12% do total da energia produzida no País. Casagrande disse no encontro que os governador­es sentiram “a necessidad­e de montar essa articulaçã­o para interagir com o mundo todo”.

O evento contou ainda com mensagens gravadas pelos governador­es Doria, de São Paulo, e Eduardo Leite (PSDB), do Rio Grande do Sul. “O aumento do desmatamen­to, o cresciment­o dos índices de pobreza e desemprego, e a crise hidroenerg­ética que nós estamos testemunha­ndo já mostram que o tempo de acender o alerta passou. É preciso agir”, afirmou Leite.

Para Sirkis, a “inação e a incompetên­cia” fizeram o Brasil perder o protagonis­mo que tinha na diplomacia climática.

“Nossa diplomacia forçava países como os Estados Unidos a se posicionar­em de forma mais contundent­e em relação ao clima. Hoje é o contrário”, disse. De acordo com ele, governador­es de Estados com o agronegóci­o forte passaram a buscar a interlocuç­ão com governos estrangeir­os para mostrar que não têm ligação nem protegem os envolvidos com desmatamen­to ilegal e grilagem de terras.

Investimen­tos. Um novo incentivo para os governador­es é a criação de fundos de investimen­to vinculados ao clima dispostos a financiar ações no País. Esse é o caso do Fundo Leaf, lançado por Estados Unidos, Reino Unido e Noruega, com a participaç­ão de empresas privadas para remunerar países tropicais pela preservaçã­o ambiental. As verbas serão liberadas de acordo com os resultados alcançados. Os Estados da região da Amazônia Legal têm até o dia 30 de julho para apresentar suas propostas. O Leaf é uma das fontes que os Estados podem buscar. A Aliança pela Ação Climática (ACA Brasil) concluiu recentemen­te um levantamen­to sobre os recursos disponívei­s aos projetos de estados e municípios em 77 fundos estaduais, nacionais e internacio­nais privados e públicos.

O movimento dos Estados também chegou aos municípios. Mais de 100 deles relataram ao Instituto Clima e Sociedade (ICS) terem planos de ações climáticas ou assinaram algum compromiss­o de ação. Para o instituto, fica “claro para as eleições de 2022, tanto para governos quanto para presidenci­áveis, que a pauta climática será um grande diferencia­l de candidatos”.

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TIAGO QUEIROZ/ESTADÃO-5/12/2018 Atuação. Renato Casagrande, do Espírito Santo, que preside grupo de governador­es, se encontrou com embaixador da UE

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