O Estado de S. Paulo

Em ano de isolamento social, País tem 1.350 feminicídi­os

Alta é de 0,7% ante 2019; caem registros de outros crimes contra mulheres, mas pandemia agrava risco de subnotific­ação

- /F.R. e JOSÉ MARIA TOMAZELA

Sete meses após o assassinat­o da filha, a dona de casa Adriana Cristina Forte, de 50 anos, não consegue tirar os símbolos do luto do celular e nas redes sociais. Em dezembro, Bruna Giovana, de 24 anos, foi morta pelo ex-marido, na frente do filho do casal, de 4 anos, em Bauru (SP). Em meio ao isolamento social, o Brasil registrou 1.350 feminicídi­os em 2020 – um a cada seis horas e meia.

O total é 0,7% maior comparado ao total de 2019, diz o Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Ao mesmo tempo, o registro em delegacias de outros crimes contra mulheres caiu no período, embora haja sinais de que a violência doméstica, na verdade, pode ter aumentado, com subnotific­ação de agressões.

Os homicídios motivados por questões de gênero subiram em 14 das 27 unidades federativa­s. Houve cresciment­o acentuado em Mato Grosso (57%), Roraima (44,6%), Mato Grosso do Sul (41,7%) e Pará (38,95). Em Rondônia, os feminicídi­os saltaram de sete ocorrência­s, em 2019, para 14 ano passado.

Assim como Bruna, três a cada quatro vítimas de feminicídi­o tinham entre 19 e 44 anos. A maioria (61,8%) era negra. Em geral, o agressor é uma pessoa conhecida: 81,5% eram companheir­os ou ex-companheir­os.

Adriana conta que Bruna já havia registrado dois boletins de ocorrência contra o agressor, Luiz Antônio Félix, de 26 anos, de quem estava separada havia oito meses. Nos dois casos, a jovem foi machucada com violência. “Na última agressão, quando a Bruna saiu de vez do apartament­o em que moravam, ele deu um mata-leão tão violento que ela ficou desacordad­a 40 minutos”, conta a mãe.

Bruna foi morta com golpes de faca. Diferentem­ente dos homicídios comuns, em que há maior prevalênci­a de arma de fogo, as armas brancas foram mais usadas contra as mulheres. Em 55,1% das ocorrência­s, as mortes foram provocadas por facas, tesouras, canivetes ou instrument­os do tipo.

Os registros de lesões corporais e de estupros feitos na polícia caíram: 230.160 agressões contra mulheres – 7,4% menos em relação ao ano anterior.

“Neste contexto, ainda é cedo para avaliar se estamos diante da redução dos níveis de violência doméstica e sexual ou se a queda seria apenas dos registros em um período em que a pandemia começava a se espalhar, as medidas de isolamento social foram mais respeitada­s pela população e muitos serviços públicos estavam ainda se adequando para garantir o atendiment­o não presencial”, escreveram as pesquisado­ras Samira Bueno, Marina Bohnenberg­er e Isabela Sobral.

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