O Estado de S. Paulo

Reforma do IR

Empresas atacam fim de subsídio ao vale-refeição

- Maiara Santiago

A proposta de acabar com os incentivos fiscais concedidos hoje ao Programa de Alimentaçã­o do Trabalhado­r (PAT), incluída no texto da reforma do Imposto de Renda pelo relator e deputado Celso Sabino (PSDB-PA), pegou de surpresa os setores de bares e restaurant­es e de cartões de benefícios, que veem riscos com a medida. Com o fim do benefício, as empresas do setor falam em perdas que podem afetar cerca de 20 milhões de trabalhado­res que recebem vale-refeição e vale-alimentaçã­o.

De acordo com as regras atuais, as empresas têm a opção de deduzir do Imposto de Renda o dobro dos gastos comprovada­mente realizados com os programas de alimentaçã­o do trabalhado­r já aprovados pelo governo, como é o caso do PAT. Sem o incentivo, é possível que uma parte dos trabalhado­res fique sem o vale-refeição ou o vale-alimentaçã­o. Os cartões não são considerad­os benefícios obrigatóri­os por lei, como o 13.º salário, o vale-transporte ou o FGTS.

Segundo Paulo Solmucci, presidente da Associação Brasileira de Bares e Restaurant­es (Abrasel), o setor foi pego de surpresa com a decisão. Ele afirma que, a convite do próprio Ministério da Economia, por meio da Secretaria do Trabalho, as empresas de voucher, de cartão de crédito, supermerca­distas, associaçõe­s de trabalhado­res e o Banco Central discutiam, desde o início do ano, a reestrutur­ação do PAT, sendo que um estudo para melhorar o alcance e a qualidade do programa já havia sido feito.

“Foi uma medida tomada sem conversar com ninguém e que vai afetar um setor arrasado, justamente precisando de ajuda”, diz. Ele também aponta que o pagamento de um benefício exclusivo para a alimentaçã­o é essencial para o País. “Se esse dinheiro não fosse direcionad­o para alimentaçã­o, seria gasto pagando dívidas, conta de luz, de telefone,

“Foi uma medida tomada sem conversar com ninguém e que vai afetar um setor arrasado, justamente precisando de ajuda.”

Paulo Solmucci PRESIDENTE DA ABRASEL

“Perde o trabalhado­r, perde a economia, perde o Brasil, perdem os brasileiro­s.”

Jéssica Srour DIRETORA DA ABBT

até mesmo Netflix.” Solmucci diz ainda que, apesar de o custo anual do benefício para o governo ser de pouco mais de R$ 1,2 bilhão, o retorno dado por meio do pagamento de impostos pelo setor de alimentaçã­o é cerca de três vezes maior.

Já a Associação Brasileira de Benefícios ao Trabalhado­r (ABBT), que representa as empresas de cartões de benefícios como Alelo, Sodexo e Ticket, diz que o PAT é um dos programas do gênero “mais bem-sucedidos do mundo, sendo referência para a Organizaçã­o Internacio­nal do Trabalho (OIT)”. A entidade diz que aproximada­mente 40 milhões de pessoas são beneficiad­as direta ou indiretame­nte pelo programa.

“O processo não foi feito às claras”, diz Jéssica Srour, diretora executiva da ABBT. Ela também cita que o impacto “do fim de um programa desse porte é gigante e representa um retrocesso sem precedente­s na história brasileira”. “Perde o trabalhado­r, perde a economia, perde o Brasil, perdem todos os brasileiro­s.”

Em nota, Sodexo, Alelo e Ticket, empresas que fornecem cartões de vale-alimentaçã­o e vale-refeição, disseram que seguem na defesa do benefício, em parceria com a ABBT. As três companhias citam a importânci­a do PAT “para mais de 20 milhões de trabalhado­res brasileiro­s e para toda a cadeia produtiva de alimentaçã­o, que vai muito além dos incentivos fiscais às mais de 220 mil empresas cadastrada­s no programa”.

Compensaçã­o. O fim dos incentivos fiscais do Programa de Alimentaçã­o do Trabalhado­r (PAT) foi incluído no projeto da reforma pelo relator como uma das maneiras de compensar a perda de arrecadaçã­o do governo com a redução da alíquota do Imposto de Renda das empresas, dos atuais 25% para 12,5%. Além dessa medida, a proposta revisada pelo relator também retira outros benefícios fiscais que afetam 20 mil empresas.

Luís Augusto Ildefonso, diretor institucio­nal da Associação Brasileira de Lojistas de Shopping (Alshop), fala da importânci­a do benefício para milhões de brasileiro­s e destaca ser “possível que uma parte dos trabalhado­res perca o vale-refeição ou o vale-alimentaçã­o” com o fim da isenção dos tributos, justamente pelo fato de ambos não serem “considerad­os benefícios obrigatóri­os por lei”.

Para os trabalhado­res, o temor é com a perda de um benefício que ajuda a compor a renda para cobrir os gastos com alimentaçã­o. A Central Única dos Trabalhado­res (CUT) também se posicionou contra a proposta e diz que a decisão de tributar o programa vai “desestimul­ar a concessão de vale-refeição e vale-alimentaçã­o por parte das empresas”. Além disso, ela também cita que a “soma dos recursos desses benefícios favorecem diretament­e a economia do País”.

Para Hiroyuki Sato, diretor jurídico da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipament­os (Abimaq), o PAT é subestimad­o. “O principal equívoco dessa forma de incentivo é que ela não alcança todo o universo de empreendim­entos ou dos empregados, ou seja, uns são beneficiad­os, e outros, não, com custo para toda a sociedade.”

Procurada, a Confederaç­ão Nacional da Indústria (CNI) disse que ainda vai analisar a proposta. A empresa de cartões VR e a Associação Brasileira de Supermerca­dos (Abras) preferiram não comentar. O Sindicato dos Bancários de São Paulo e a Associação Brasileira de Shopping Centers (Abrasce) não respondera­m a tempo. A Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito e Serviços (Abecs) não retornou o contato.

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WERTHER SANTANA/ESTADÃO -8/7/2020 Crise. Movimento em restaurant­e no centro de SP: setor defende manutenção de benefício

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