O Estado de S. Paulo

3 PERGUNTAS PARA...

- José Alvaro Moisés, cientista político (USP) / LEVY TELES

1. O que motivou a decisão dos governista­s de adiar a votação?

Basicament­e, essa decisão reflete um interesse do governo de Jair Bolsonaro em manter o tema na agenda. Não obstante, a conjuntura que se criou com as minúcias que apareceram na CPI da Covid tem a ver também com o resultado das pesquisas nas últimas semanas, que mostram uma queda muito drástica da avaliação do presidente. É uma soma de fatores adversos ao presidente. Veja que, num certo sentido, o modo como o presidente usa este tema em função da campanha eleitoral. Ele está em plena campanha, o que é ilegal, mas o presidente usa o voto impresso para fazer ameaças à democracia.

2. Por que esse é um assunto que se tornou tão disputado?

A razão de fundo, é que, no sistema democrátic­o, embora ela não seja constituíd­a apenas por eleições, ela é um ponto absolutame­nte central, o coração da matéria. Por meio delas, os eleitores exercem a cidadania. Em outros sistemas, o soberano é o rei, o príncipe, o secretário-geral. Na democracia, os soberanos são eleitores. Mas essa soberania é feita quando os eleitores fazem a escolha. Se você ameaça o processo eleitoral, é uma ameaça à democracia, não às eleições. Não é improvável que Bolsonaro esteja antecipand­o uma derrota em 2022. Acompanhan­do a família de outros líderes populistas, ele incorporou o que ocorreu com Trump. A narrativa é que se perder a eleição, houve fraude.

3. O que uma derrota significar­ia para o governo?

O principal efeito da derrota vai ser o esvaziamen­to da ameaça às eleições e por outro lado a afirmação de que se as eleições são feitas pelo voto digital, esvazia a retórica e narrativa do presidente que se ele não ganhar a eleição, elas são fraudadas. A derrota mostrará, pelo contrário, que o sistema eleitoral não depende de pessoas que estão na disputa de dirigentes ou autoridade­s. A questão diz respeito à sociedade como um todo, ao País, e à Constituiç­ão, os elementos que fundam o Estado democrátic­o de direito.

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