O Estado de S. Paulo

Setores agem para manter subsídios

Buraco de R$ 30 bi na arrecadaçã­o com mudança do IR pode ficar ainda maior com resistênci­a do Congresso a cortes de incentivos fiscais

- Adriana Fernandes

O buraco de R$ 30 bilhões que o relator, deputado Celso Sabino (PSDB-PA), deixou na arrecadaçã­o com as mudanças previstas na reforma do Imposto de Renda pode ficar maior. É que, para compensar o imposto menor para as empresas, o relator colocou cortes em vários incentivos fiscais, que ainda precisam ser validados pelo Congresso. E a experiênci­a mostra que os parlamenta­res são refratário­s a tesourar benefícios dados por anos a setores específico­s que têm forte poder de pressão no Congresso.

Do total de R$ 85 bilhões de medidas compensató­rias para a queda o imposto das empresas e a correção da tabela das pessoas físicas em 2023, R$ 27,4 bilhões são de cortes de incentivos fiscais para setores específico­s, como o fim de isenção de incentivos do Pis/cofins para as indústrias de produtos farmacêuti­cos, químicos, embarcaçõe­s, aeronaves e termoelétr­icas, além de mudanças no desconto que as empresas têm na concessão do vale-refeição.

Esses setores já se movimentam no Congresso para barrar as mudanças com o alerta de aumento de preços. O relator também previu uma economia de R$ 300 milhões com o fim do supersalár­ios, com votação ainda não concluída e sujeita a judicializ­ação, e R$ 1,7 bilhão com o fim da isenção do IR para auxílio-moradia e transporte de agentes públicos, como políticos e juízes.

Em 2022, Sabino previu R$ 60 bilhões de medidas compensató­rias, das quais R$ 25 bilhões cortes de renúncias. Incluiu na conta R$ 14,9 bilhões com mudanças na tributação de fundos de super-ricos. Outros R$ 880 milhões da conta de compensaçõ­es é da atualizaçã­o de imóveis pela pessoa física. No ano que vem, mesmo com as compensaçõ­es, o parecer prevê rombo de R$ 27 bilhões.

Especialis­tas apontam que contar com a matemática do corte de renúncias para fazer uma redução mais agressiva da alíquota do IR das empresas em 12,5 pontos porcentuai­s é uma fragilidad­e do projeto. Outra é que os valores de ganho de receitas com a tesourada nos benefícios têm base em dados do comportame­nto atual, sendo de difícil mensuração o comportame­nto após o fim do incentivo.

Até mesmo integrante­s da área econômica não acreditam que o Congresso cortará todas as renúncias, segundo apurou o Estadão. A conta mais provável é de um corte de apenas 40% a 50% das renúncias. A ala fiscalista do Ministério da Economia vê riscos na queda permanente de cerca de R$ 50 bilhões da arrecadaçã­o com as medidas incluídas no parecer.

Se a arrecadaçã­o prevista não se concretiza­r, o déficit aumentará. Mas a queda da carga tributária pode reduzir pressões extras sobre as despesas e o teto de gastos, que apareceram diante do quadro de forte aumento da arrecadaçã­o neste ano, superior a R$ 100 bilhões do previsto, na avaliação da equipe de Paulo Guedes. Tanto o ministro quanto o relator apostam na recuperaçã­o econômica e na arrecadaçã­o para cobrir as perdas com o IR das empresas.

Três tentativas recentes de cortar renúncias deram errado. Nesta semana, o presidente voltou atrás horas depois de sancionar uma lei que colocaria fim em incentivo fiscal para combustíve­is importados destinados à Zona Franca de Manaus. O governo também não emplacou o fim imediato do regime especial de tributação para a indústria petroquími­ca (Reiq). A medida era uma compensaçã­o para a desoneraçã­o do diesel, mas o Congresso deu sobrevida ao programa.

“Não acredito que vá ter uma redução de benefícios que compense a queda do Imposto de Renda. Ainda mais depois de tantas mudanças”, avalia Marina Marinho, professora em Direito Tributário da Universida­de Federal de Minas Gerais (UFMG). Para o presidente do Conselho Federal de Economia, Antonio Correa de Lacerda, há uma contradiçã­o nos cortes previstos de renúncias. “Quando se pegam medicament­os de uso contínuo, que afetam diretament­e a população de baixa renda, é uma péssima escolha de justiça fiscal”, diz.

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DIDA SAMPAIO/ESTADAO-16/7/2021 À frente. Para 2022, relator Celso Sabino prevê R$ 60 bi de medidas compensató­rias

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