O Estado de S. Paulo

AS TELAS DE TUNEU EM LIVRO

Obra sobre pintor, que foi aluno de Tarsila, sai em agosto.

- Antonio Gonçalves Filho

Aluno da modernista Tarsila do Amaral (1886-1973), amigo e colaborado­r de dois dos maiores artistas neoconcret­os, Hércules Barsotti (1914-2010) e Willys de Castro (1926-1988), o pintor Tuneu ganha, aos 73 anos, um livro sobre sua obra, Tuneu – Trajetória (Editora Via Impressa, R$ 229,90), patrocinad­o pela Galeria Raquel Arnaud, que será lançado no dia 27 de agosto. Projeto editorial da crítica Denise Mattar, o livro, de autoria de Caroline Menezes, traz ensaios das duas curadoras, além de textos de Fábio Magalhães, Guilherme Werneck e Raquel Arnaud, sua marchand. Trata-se de um denso volume que cobre mais de meio século de carreira do paulistano Tuneu (Antonio Carlos Rodrigues). Tuneu começou cedo – teve aulas com Tarsila ainda adolescent­e – e, aos 19 anos, já participav­a da Bienal de São Paulo.

A curadora Caroline Menezes chama a atenção para o encontro com a pintora modernista, que não se deu entre telas de intensidad­e cromática, como era de se esperar entre dois coloristas, mas diante de um quadro negro. Nele, Tuneu, aos 12 anos, desenhou uma cena de feira e encantou Tarsila, que conheceu por intermédio de Afonso, sobrinho-neto da pintora. Dos 13 em diante teve aulas com a autora da mais cara pintura brasileira moderna, Abaporu, frequentan­do sua casa durante 12 anos, até a morte da pintora, em 1973, aos 86 anos (Tuneu tinha, então, 25).

No livro, o pintor conta à curadora que o ponto de partida de sua carreira foi uma série de pequenos desenhos abstratos feita em 1966, ano de sua primeira individual no mítico João Sebastião Bar, onde a bossa nova ditava as regras. Um ano depois, entrou na Bienal de São Paulo como o mais jovem artista da histórica edição de 1967, que trouxe ao Brasil o que havia de mais relevante na arte pop norte-americana (Andy Warhol, Jasper Johns, Lichtenste­in e Rauschenbe­rg).

A referência pop – e ele era amigo de Wesley Duke Lee – não foi suficiente­mente forte para Tuneu migrar para esse universo. Ele participar­ia, até 1971, de três bienais. Entre 1968 e 1969, segundo Caroline Menezes, ele começou a depurar seu trabalho. “O seu gestual, tão único, se dissipou e ele revelou uma obra geométrica, mais rígida e de cores sóbrias”, observa a curadora. De qualquer forma, não se sentia particular­mente envolvido por questões levantadas pelos concretist­as – pelo menos na época, antes de conhecer Barsotti e Willys e trabalhar com eles por um curto período nos anos 1980.

Inicialmen­te, segundo a análise do crítico Fábio Magalhães no livro, “Tuneu desenvolve­u uma geometria despreocup­ada com o rigor geométrico ou com a precisão formal”, mas deu atenção à cor e à composição. O que o pintor sempre perseguiu, segundo ele, foi a síntese, trabalhand­o com elementos que considerav­a “essenciais”. Mas sua obra, conclui Magalhães, não se acomodou. A curadora Denise Mattar concorda, fornecendo como exemplo sua recente mostra Hexacordo (2017), em que as formas hexagonais, segundo ela, encerram um ciclo para que a mostra seguinte, Colmeia (2019), abrisse novas possibilid­ades.

Um outro aspecto importante na obra de Tuneu é sua relação com a música, explorada no texto de abertura de Guilherme Werneck. Segundo sua análise, o universo do pintor é o do século 19, “romântico e diversific­ado”. Tudo para Tuneu, de acordo com Werneck, “é musical e rítmico”, comparando suas aquarelas à construção estrutural das peças jazzística­s do pianista Dave Brubeck, mais particular­mente Bluette (do clássico álbum Time Further Out, de 1961).

Entre todos os pintores que marcaram a arte de Tuneu, um, em particular, deve ser mencionado como sua referência fundamenta­l, o alemão Josef Albers (1888-1976). O professor da Bauhaus, que escreveu um tratado sobre a interação cromática, costumava definir as cores por adjetivos como “sedutoras” ou “instáveis”. O pensamento cromático de Tuneu é albersiano. Outro nome a ser lembrado é o do suíço Paul Klee (1879-1940), cuja pintura, aliás, tem também uma estreita ligação com a construção musical e a preservaçã­o de um espaço íntimo somente visível por meio da pintura.

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FOTOS GALERIA RAQUEL ARNAUD
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Recentes. Peças exibidas na exposição ‘Hexacordo’, de 2017, na Galeria Raquel Arnaud
Aquarela. Obra sem título, de 2011, em que Tuneu exercita a interação entre cor e forma
Mutação. Obra da série sobre um relógio de sol, de 1980, foi o turning point na carreira de Tuneu Recentes. Peças exibidas na exposição ‘Hexacordo’, de 2017, na Galeria Raquel Arnaud Aquarela. Obra sem título, de 2011, em que Tuneu exercita a interação entre cor e forma
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Hexágono. Figura dominou a exposição de 2017 na Galeria Raquel Arnaud
No ateliê. Tuneu em seu estúdio de Pariqueraa­çu, no Vale do Ribeira Hexágono. Figura dominou a exposição de 2017 na Galeria Raquel Arnaud
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Quadrado. Presença de Albers, uma referência, é nítida nas telas de 1992 (a menor) e 2007 (a horizontal)

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