Governos usam software militar para espionar civis
Segundo consórcio de imprensa, ao menos 37 celulares em 10 países tiveram seus dados expostos por meio do uso do programa de uma empresa israelense destinado a monitorar terroristas e grandes criminosos; ativistas e executivos também foram rastreados
O Pegasus, um spyware de uso militar licenciado por uma empresa israelense a governos para rastrear terroristas e criminosos, foi usado em ao menos 10 países para espionar celulares de jornalistas, ativistas, políticos e executivos de todo o mundo. A investigação foi feita pelo jornal americano The Washington Post e outros veículos de um consórcio internacional de imprensa.
O Pegasus, um spyware de uso militar licenciado por uma empresa privada de Israel a governos para rastrear terroristas e criminosos, foi usado em ao menos 10 países para espionar 37 celulares pertencentes a jornalistas, ativistas de direitos humanos e executivos de todo o mundo, de acordo com um investigação realizada pelo jornal americano ‘The Washington Post’ e um consórcio de imprensa, com parceiros como o britânico ‘The Guardian’ e o francês ‘Le Monde’.
Os telefones espionados aparecem em uma lista de 50 mil números concentrados em países conhecidos por se envolverem na vigilância de seus cidadãos e clientes da empresa israelense Grupo NSO, líder do crescente setor de espionagem por meio de spyware sem regulamentação.
A lista não identifica quem colocou os números ali e a motivação para espioná-los. Também não fica claro quantos dos telefones foram espionados, mas, segundo uma análise forense dos 37 celulares, há uma relação entre o contato com um dos 50 mil números e o início da espionagem.
A lista não identifica os clientes do grupo NSO, mas os relatórios indicam que muitos deles estavam concentrados em 10 países: Azerbaijão, Bahrein, Hungria, Índia, Casaquistão, México, Marrocos, Ruanda, Arábia Saudita e Emirados Árabes.
Segundo o The Guardian, a investigação sugere um “abuso generalizado e contínuo” do programa Pegasus, que, segundo o NSO, tem como objetivo o uso contra criminosos e terroristas. A Anistia Internacional e a Forbidden Stories, organização de mídia sem fins lucrativos com sede em Paris, inicialmente tiveram acesso ao vazamento, e o compartilharam com a imprensa.
Os veículos que tiveram acesso ao vazamento informaram que vão divulgar nos próximos dias detalhes sobre quem foi comprometido. A lista data de 2016 e inclui números de telefone de profissionais de imprensa de veículos de todo o mundo, como AFP, The Wall Street Journal, CNN, The New York Times, Al-jazeera, France 24, El País, Associated Press, Bloomberg, The Economist, Reuters e Voice of America.
Além disso, duas mulheres próximas ao jornalista assassinado por um esquadrão saudita em 2018 Jamal Khashoggi estão entre os alvos da espionagem (mais informações nesta página).
O uso do programa para hackear telefones dos repórteres da Al-jazeera e de um jornalista
marroquino havia sido relatado anteriormente pelo Citizen Lab, centro de pesquisas da Universidade de Toronto, e pela Anistia Internacional.
Na lista dos números, está o de um jornalista independente mexicano que foi assassinado posteriormente em um lavarápido. Seu telefone nunca foi encontrado e não está claro se ele foi hackeado.
Os alvos. Por meio de investigações e entrevistas, repórteres chegaram à identidade de mais de 1 mil contatos espalhados em mais de 50 países: diversos integrantes de famílias reais árabes, ao menos 65 executivos, 85 ativistas de direitos humanos, 189 jornalistas e mais de 600 políticos, como chefes de Estado ou governo, e autoridades governamentais, como ministros, diplomatas e militares.
O laboratório de Segurança que realizou a análise forense dos celulares afirmou ter examinado 67 aparelhos suspeitos de terem sido atacados. Desses, 23 foram espionados com sucesso e 14 mostraram sinais de tentativas de rastreamento.
No caso dos outros 30, os testes foram inconclusivos, na maioria dos casos porque o smartphone foi trocado.
Resposta. O grupo NSO considerou as acusações exageradas e infundadas e não confirmou a identidade de seus clientes, citando sua obrigação de confidencialidade, mas disse que são 60 agências de inteligência ou militares em 40 países.
O grupo se justificou dizendo que não opera o programa para os clientes e não se envolve com as atividades de inteligência de nenhum deles.
A descrição dos 37 celulares espionados entra em conflito com o propósito de licenciamento do programa Pegasus, que, segundo o grupo NSO, é apenas para a investigação de terroristas e grandes criminosos. As informações desses celulares colocam em dúvida a capacidade da empresa israelense de proteger seus clientes de abusos dos direitos humanos.
O Grupo NSO já esteve comprometido com a polícia por abusar de seus programas de informática.