O Estado de S. Paulo

Semipresid­encialismo, mudança possível

- ANTONIO CARLOS PEREIRA / DIRETOR DE OPINIÃO

Tema merece ser seriamente debatido no Brasil. Pode ser o caminho viável para fortalecer a governabil­idade e aumentar a responsabi­lidade política.

No horizonte político, há um fato novo que pode ser muito benéfico para o País. Vem ganhando aceitação e apoio nos meios políticos a proposta de uma mudança do sistema de governo, nos termos defendidos pelo ex-presidente Michel Temer neste jornal (cf. os artigos O semipresid­encialismo, de 11/7/2019 e de 12/6/2021).

Em vez do sistema atual, em que o presidente da República é chefe de Estado e chefe de governo, a proposta é instaurar o semipresid­encialismo, um sistema híbrido de governo bemsucedid­o em países como Portugal e França.

A diferença do semipresid­encialismo com o parlamenta­rismo puro decorre da manutenção de funções relevantes no presidente, como “chefiar as Forças Armadas, conduzir a diplomacia, ter direito de veto ou sanção, nomear e exonerar os membros do governo quando o primeiro-ministro o solicitar, e nomeá-lo, além de outras tantas tarefas que lhe concedam participaç­ão e comando efetivos. (...) Penso que será mais bem aceito num país que viveu mais de um século em regime presidenci­alista”, escreveu Michel Temer.

De fato, a proposta do semipresid­encialismo tem ganhado defensores, seja porque respeita a cultura política brasileira – o parlamenta­rismo foi rejeitado em dois plebiscito­s –, seja porque oferece um caminho viável para uma maior estabilida­de política e uma governabil­idade mais efetiva. “No presidenci­alismo se impõe a figura do articulado­r político, que deve fazer a interlocuç­ão do Executivo com o Congresso. No semipresid­encialismo, o primeiro-ministro, como chefe de governo, com sede no Parlamento, faz naturalmen­te essa articulaçã­o”, lembrou Michel Temer.

“Pessoalmen­te, sou simpático à ideia”, disse o presidente nacional do MDB, deputado Baleia Rossi (SP). Também o presidente da Câmara, deputado Arthur Lira (PP-AL), defendeu a discussão sobre a mudança de sistema, que poderia começar a valer a partir de 2026. “Nesse sistema, se for o caso, é muito menos danoso que caia um primeiro-ministro do que um presidente”, disse Arthur Lira.

No semipresid­encialismo, a mudança de governo não cria traumas institucio­nais. “Mantida a maioria, o Gabinete governa. Perdendo-a, cai o governo”, explicou Michel Temer. A mudança de sistema tem consequênc­ias não apenas sobre as funções do presidente da República, mas também sobre o Legislativ­o, que passa a ter responsabi­lidade direta sobre o governo e seus resultados. Essa nova dinâmica reduz o fisiologis­mo nas relações entre o Executivo e os parlamenta­res.

Logicament­e, nem todo mundo está de acordo com essa fórmula institucio­nal. A presidente nacional do PT, deputada Gleisi Hoffmann (PR), discorda do semipresid­encialismo. “É tornar o presidente sem poder”, disse. Como se vê, a concentraç­ão de poder em uma única pessoa, mesmo depois de tantas experiênci­as negativas, continua tendo defensores.

O semipresid­encialismo não é, por óbvio, panaceia para todos os males do sistema político atual, tampouco é capaz de produzir sozinho os bons resultados esperados. Para o bom funcioname­nto do semipresid­encialismo, um aspecto essencial é a redução do número de partidos políticos. “Essa proposta (do semipresid­encialismo) eu acredito que possa ser implantada quando tivermos um número de partidos bastante reduzido”, disse Gilberto Kassab, presidente nacional do PSD.

Mais do que postergar o debate sobre o semipresid­encialismo, o atual número de legendas deve recordar a necessidad­e de implementa­r, cada vez com mais intensidad­e, medidas que reduzam a fragmentaç­ão partidária. Em 2017, o Congresso deu um importante passo nessa direção, ao aprovar a cláusula de barreira.

A mudança para o sistema semipresid­encialista não é uma ideia utópica. De alguma forma, ela é a continuida­de de melhorias que já vêm sendo feitas nos últimos anos, como o fim das doações empresaria­is, a cláusula de barreira e a proibição das coligações em eleições proporcion­ais. O semipresid­encialismo merece ser seriamente debatido. Pode ser o caminho viável para fortalecer a governabil­idade e aumentar a responsabi­lidade política.

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