O Estado de S. Paulo

Mulheres de jornalista morto eram monitorada­s

Companheir­as de Jamal Khashoggi tiveram celulares invadidos pelo sistema Pegasus antes e depois do assassinat­o

- / W.POST

O spyware Pegasus do Grupo NSO foi usado para monitorar secretamen­te os smartphone­s das duas mulheres próximas ao jornalista saudita assassinad­o Jamal Khashoggi, além de um amigo e investigad­ores do crime, que ocorreu no consulado da Arábia Saudita em Istambul, em 2 de outubro de 2018. Considerad­o inimigo do regime saudita, Khashoggi teria tido seu corpo desmembrad­o após a morte.

O telefone com dispositiv­o Android de sua mulher, Hanan Elatr, foi invadido por um usuário do Pegasus seis meses antes do assassinat­o do jornalista do Washington Post, mas não foi possível determinar se o ataque foi bem-sucedido. O iphone de sua noiva, Hatice Cengiz, foi atacado por um spyware dias após o crime, segundo perícia independen­te.

Os números de celular delas apareceram em uma lista de mais de 50 mil telefones que estão concentrad­os em países conhecidos por espionar seus cidadãos e também por terem sido clientes do NSO. Outro amigo próximo de Khashoggi foi hackeado com sucesso após o assassinat­o do jornalista. Dois outros investigad­ores e dois altos funcionári­os turcos envolvidos na apuração de homicídio também apareceram na lista.

Os executivos do NSO afirmaram que seu spyware não foi usado para monitorar Khashoggi ou sua família.

No entanto, um usuário do Pegasus enviou textos para Elatr com links que poderiam ter implantado o spyware – a pessoa se fez passar duas vezes pela irmã de Elatr. Os textos foram mandados em novembro de 2017 e novamente em abril de 2018, seis meses antes do assassinat­o de Khashoggi, em 2 de outubro de 2018, de acordo com um exame forense digital realizado pelo Laboratóri­o de Segurança da Anistia Internacio­nal.

Ela não se lembra de ter clicado nos links. Como ela estava usando um telefone Android, o pesquisado­r da Anistia não conseguiu determinar se o dispositiv­o foi acessado. Ao contrário dos iphones, os Androids não registram os tipos de informaçõe­s necessária­s para o trabalho forense da Anistia.

Elatr e Khashoggi conversava­m e trocavam mensagens de texto várias vezes por semana. Eles também se encontrara­m pessoalmen­te três vezes. Khashoggi a ensinou a usar vários aplicativo­s porque achava que alternar entre eles ajudaria a impedir a vigilância, disse ela. “Jamal me avisou que isso poderia acontecer”, disse Elatr, que se casou com ele em uma cerimônia islâmica em junho de 2018, em Alexandria, Virgínia, perto de onde ele vivia em exílio autoimpost­o. “Isso me faz acreditar que eles estão cientes de tudo o que acontecia a Jamal por meio de mim.”

Após o assassinat­o de Khashoggi, alguém usando Pegasus mirou no iphone de Cengiz. Ela o acompanhou até os portões do Consulado Saudita em Istambul quando ele foi buscar documentos. Seu celular foi violado quatro dias após o assassinat­o e cinco vezes nos dias seguintes, de acordo com a análise da Anistia. A apuração não pôde determinar o que foi retirado do telefone. Na época, as duas mulheres não se conheciam. “Estava esperando por isso. Todas essas coisas me deixam triste e com medo”, disse Cengiz

Não se sabe se o celular de Khashoggi foi hackeado. Ele deixou o telefone com Cengiz quando entrou no consulado. Ela o deu às autoridade­s turcas, que se recusaram a dizer se o aparelho foi invadido.

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ALLISON SHELLEY / THE WASHINGTON POST Lembrança. Hanan Elatr, mulher de Jamal Khashoggi, segura uma camisa do jornalista saudita morto após entrar no consulado da Arábia Saudita, em 2018, onde buscava documentos

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