O Estado de S. Paulo

NO ‘LOOK DA VACINA’, EMOÇÃO E PROTESTO

Postos de saúde têm desfile de camisetas e pins com imagens de jacaré, seringa e Zé Gotinha

- Priscila Mengue

Sabe a expressão “tenho nem roupa para isso?” Na vacinação da covid-19, muitos têm mostrado exatamente o oposto. Dias, semanas e até meses antes do tão esperado dia, eles já sabem o que vão usar. O argumento é: se a imunização é o grande evento do ano, por que não se vestir a caráter?

Os “looks da vacina” estão ainda mais evidentes com o avanço da campanha para as faixas etárias na casa dos 20 e 30 anos. O improviso dos que se fantasiara­m lá no início da imunização e os cartazes com manifestaç­ões variadas continuam, mas agora estão em meio à oferta variada de camisetas, pins, bottons, sacolas, carteirinh­as personaliz­adas, bonecos e mais tantos artigos temáticos.

Os itens têm frases e ilustraçõe­s em tom de brincadeir­a, celebração ou protesto contra a gestão Jair Bolsonaro. Uma das imagens mais frequentes é o jacaré, referência à fala do presidente sobre “virar jacaré” ao ser imunizado. Zé Gotinha, SUS, seringas, Instituto Butantan e Fiocruz também estão nas estampas.

O registro em foto, claro, é praticamen­te regra. E vem com postagem em rede social, com homenagem às vítimas, comemoraçã­o e críticas ao governo. A hora da vacinação vira oportunida­de de reafirmar posições ou de alívio pela pandemia mais perto do fim.

“A gente foi cedo, se arrumou, viu o look para ir”, diz o inspetor de qualidade Gelson Lima, de 26 anos. A camiseta usada foi comprada três meses antes, com estampa de jacaré e a palavra “imunizada”. Após receber a dose, fez imagem, publicada com as hashtags #forabolson­aro, #vivaosus e #vacinasim. Segundo ele, a ideia foi estimular a vacinação. “No meu Estado (Amazonas), passamos por situação muito difícil na pandemia.”

A professora Lizandra Müller, de 23 anos, também se preparou. “Quando a gente vai em um casamento, aniversári­o, aluga roupa, se maquia… A vacinação é uma data importante, um evento”, diz. “A gente sabe o quanto a vacina custou a chegar no Brasil.” Na data, acordou cedinho para se arrumar. “Fui toda montada”, descreve.

Pôs camiseta, máscara e bottons temáticos, comprados na internet. As referência­s do look englobavam de Zé Gotinha a jacaré, além de frases como “Eu acredito na ciência” e “Vacina sim”. Amigos já pediram emprestado para usar na vez deles.

Já o assistente de recursos humanos Rodolfo Ribeiro, de 36 anos, foi a uma loja que conhecia para garantir a camisa especial. “O momento da vacina é um ato político, de defender a ciência contra o negacionis­mo.” Ele conta que achava que nem seria vacinado este ano. Por isso, vê o momento como homenagem aos milhares que não tiveram a mesma chance.

Já o oficial da Marinha Harrison Nogueira, de 38 anos, não só teve de escolher entre duas camisas que comprou, como usou um adereço de cabeça de jacaré, de uma loja de fantasias. “Quando passei pela triagem, a galera começou a me olhar. Uma menina falou meio cochichand­o que gostou muito.”

Vendas. Em redes sociais e lojas virtuais, produtos para o dia da vacina se multiplica­m. Até itens que não eram temáticos ganham novo significad­o. É o que conta Vinicius Silverio, de 39 anos, um dos sócios da Icebrg, focada principalm­ente na produção de pins (broches de metal postos em roupas e acessórios). Em 2019, a marca lançou a coleção Grande Ícones Brasileiro­s, incluindo referência­s como Abaporu, Canarinho da Copa e Zé Gotinha. Agora, o mascote da vacinação se tornou hit de vendas e, vira e mexe, acaba no estoque.

Outras peças para coleções não originalme­nte ligadas ao tema da saúde foram adiantadas. Uma é a ilustração da sede da Fiocruz (da coleção Arquitetur­a que Amamos). A outra é a Cuca (da coleção Folclore Brasileiro), que acabou associada ao jacaré. E foi criado um pin da sede do Butantan.

Com loja virtual e física na Rua Augusta, em São Paulo, a El Cabriton notou a demanda já em 2020 – por produtos que exaltam o SUS -, e mais recentemen­te está com a Coleção Pró-vacinação. Reúne camisetas, ecobags, roupas infantis e até pano de prato com Zés Gotinha, jacarés e críticas a Bolsonaro. Até a Butanvac, vacina em testes, virou estampa.

“Como as pessoas estão mais distantes (com o isolamento), a camiseta virou forma de passar uma mensagem, plataforma de comunicaçã­o”, diz Erica Abud Domenico, de 36 anos, sócia da loja, cujo público principal está na casa dos 30 anos.

 ?? FELIPE RAU/ESTADÃO ?? El Cabriton. Loja na R. Augusta vende coleção pró-vacinação, com camisas, roupas infantis, ecobags e até pano de prato
FELIPE RAU/ESTADÃO El Cabriton. Loja na R. Augusta vende coleção pró-vacinação, com camisas, roupas infantis, ecobags e até pano de prato
 ?? ARQUIVO PESSOAL ?? Irreverent­e. Harrison chamou a atenção no posto de saúde
ARQUIVO PESSOAL Irreverent­e. Harrison chamou a atenção no posto de saúde
 ?? ARQUIVO PESSOAL ?? Produção. Lizandra investiu no figurino e na maquiagem
ARQUIVO PESSOAL Produção. Lizandra investiu no figurino e na maquiagem

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil