O Estado de S. Paulo

Cada um na sua

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Forças Armadas devem lealdade ao País, não a presidente­s que vêm, vão e fazem besteiras.

Ogeneral Luiz Eduardo Ramos, chefe da Casa Civil, telefonou para a deputada Perpétua Almeida (PCDOB-AC) para manifestar apoio à proposta de emenda à Constituiç­ão (PEC) que limita, quase impede, a participaç­ão de militares da ativa em cargos civis da administra­ção pública. Apelidada de “PEC Pazuello”, ela foi feita para evitar novos Pazuellos, depois que o general da ativa Eduardo Pazuello se meteu a ministro da Saúde em plena pandemia, arranhando a imagem das Forças Armadas.

Ramos falou com autoridade. É general de quatro-estrelas, o maior posto do Exército, e seu sonho era passar um ano no governo e depois encerrar a carreira como comandante do Leste, com sede no Rio, onde serviu por 23 anos. Ao concluir que não poderia abandonar o governo, fez sua opção: passou para a reserva, sem chegar lá, um ano e seis meses antes do seu prazo para permanecer na ativa. Ou bem seria militar da ativa, ou bem ocuparia um cargo civil e político.

Além de dar o exemplo, o general não estava falando sozinho ao emprestar apoio à PEC. Como ele, generais e oficiais de diferentes patentes defendem a limitação de oficiais da ativa em cargos civis, particular­mente políticos. Não se tem notícia de Ramos dizendo isso, mas muitos, nos bastidores, acham que a medida vai fazer bem às Forças Armadas – que pagam alto preço por mergulhare­m tão fundo no governo do capitão insubordin­ado Jair Bolsonaro.

A PEC Pazuello, aliás, parece que vai de vento em popa, com apoio no Congresso Nacional e na sociedade. Eram necessária­s 171 assinatura­s de deputados federais, mas atingiu 189. E, segundo o Datafolha, 58% dos entrevista­dos são contra militares da ativa

Agora vai: opinião pública, Congresso e os próprios militares apoiam a ‘PEC Pazuello’

em cargos civis e 62%, contra a participaç­ão deles em atos políticos – como fez o próprio Pazuello, num palanque eleitoral de Bolsonaro.

Há pressão também para a PEC impedir que militares disputem cargos eletivos, podendo voltar à ativa depois. Pelo Estatuto dos Militares, artigo 82, o militar que opta por ser candidato à Câmara, ao Senado, prefeitura­s... fica agregado. Na prática, quem ganha vai para a reserva, quem perde volta. A ideia é proibir o vai e vem: se decidiu se candidatar, tem de ir automatica­mente para a reserva. E há quem defenda que o candidato não use sua patente na campanha. Em vez de “general fulano”, simplesmen­te “fulano”, sem a marca Forças Armadas.

Dito isso, há de outro lado uma espécie de consenso a favor de ressalvas para melhorar o projeto, que, como emenda constituci­onal, depende de três quintos de votos na Câmara (308) e no Senado (49), em dois turnos nas duas Casas. Deve haver exceções para que futuros governos, de direita, esquerda ou centro, tenham brechas para aproveitar oficiais com alto grau de qualificaç­ão em postos específico­s, predetermi­nados pela PEC.

É importante acabar com a farra do governo Bolsonaro, com militares em Meio Ambiente, Cultura, Educação, em toda parte. O que um general de intendênci­a da ativa tem a ver com a Saúde, numa pandemia infernal? Mas, mantendo funções de natureza militar, como a Secretaria de Assuntos Estratégic­os da Presidênci­a, e sem vetos a que engenheiro­s do Exército atuem na Imbel e engenheiro­s navais, na Emgepron, por exemplo. São empresas públicas de Defesa.

A PEC Pazuello vem na hora certa, quando o presidente não apenas mete 8.450 militares da reserva na administra­ção, segundo o site Poder 360, como usa a marca das Forças Armadas, refere-se ao “meu Exército”, acena com golpes e demite o ministro da Defesa e os três comandante­s militares, exigindo dos sucessores uma lealdade sem limites. Forças Armadas devem lealdade ao País, ao Estado, não a presidente­s que vêm, vão e fazem muito mais besteiras do que deveriam.

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