Hungria usou spyware para vigiar jornalistas e opositores
Segundo denúncia de organização francesa, mais de 300 telefones húngaros estavam em lista de vigilância
Na Hungria da era comunista, os cidadãos foram recrutados para espionar seus vizinhos e relatar quaisquer ameaças potenciais à polícia secreta. Na Hungria do primeiro-ministro Viktor Orbán, uma ferramenta de spyware foi implantada com efeito semelhante, monitorando pessoas com tecnologia que pode transformar smartphones em um tesouro de informações.
Mais de 300 números de telefone húngaros – conectados a jornalistas, advogados, grandes empresários e ativistas, entre outros – apareceram em uma lista que incluía números selecionados para vigilância por clientes do Grupo NSO, uma empresa de segurança israelense.
Parlamentares de oposição no Congresso húngaro exigiram a abertura de uma investigação sobre o uso do sistema Pegasus pelo governo. Os resultados da investigação levaram três parlamentares da Comissão de Segurança Nacional da Hungria a convocar uma sessão de emergência para questionar as agências do governo sobre seu potencial envolvimento na espionagem.
As denúncias foram feitas pela organização francesa de jornalismo sem fins lucrativos Forbidden Stories e publicados no domingo por um consórcio de imprensa formado por jornais como o The Washington Post, The Guardian e Le Monde. Segundo os jornais, pelo menos 180 jornalistas, 600 políticos, 85 ativistas de direitos humanos e 65 empresários foram hackeados com o Pegasus em várias partes do mundo.
Os registros não indicam quantos dos 300 números na Hungria foram comprometidos efetivamente. Mas o exame de seis telefones húngaros associados aos números da lista descobriu que três haviam sido infectados com o spyware Pegasus, uma ferramenta comercializada para governos pela NSO. Dois outros telefones mostraram sinais de tentativa de espionagem com o Pegasus.
O sexto telefone, do magnata da mídia independente Zoltan Varga, foi inconclusivo, possivelmente porque havia sido substituído.
A NSO negou uma correlação entre a lista de telefones e sua tecnologia. Ela acrescentou que não opera os sistemas que vende para governos e não tem acesso aos dados dos alvos de seus clientes. A empresa disse que não poderia revelar a identidade de seus clientes. Mas um ex-funcionário, falando sob condição de anonimato, confirmou que o governo húngaro era um deles.
Quando a infiltração do Pegasus é bem-sucedida, pode permitir acesso total a um dispositivo, permitindo que espiões revisem e-mails, textos e fotos, incluindo mensagens em aplicativos de comunicação criptografados como Whatsapp e Signal. Ele pode permitir que as pessoas ouçam conversas telefônicas e secretamente liguem câmeras e microfones.
A implantação do spyware contra membros da sociedade civil húngara sugere uma disposição das autoridades em reviver táticas consideradas proibidas desde a transição para a democracia três décadas atrás, ridicularizando as proteções de privacidade digital de longo alcance que a União Europeia promulgou.