O Estado de S. Paulo

Competição marcou a apresentaç­ão do novo Japão

PÓS-GUERRA. Jogos deram visibilida­de de uma sociedade próspera, e ainda de cresciment­o econômico e tecnológic­o

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A primeira Olimpíada realizada no Oriente é carregada de significad­o histórico. Foi uma reintroduç­ão do Japão à comunidade internacio­nal. No pós-guerra, o país reabilitou sua imagem política, refez laços diplomátic­os e em 1956 aderiu à Nações Unidas. Mas nada se compara ao alcance e visibilida­de que os Jogos trouxeram ao país.

A competição marcou a apresentaç­ão, através do Esporte, de um novo Japão: uma nação democrátic­a ressurgida das cinzas da Segunda Guerra Mundial (1939/1945) e vencedora dos desafios do pós-guerra. Revelou ao mundo uma sociedade próspera, que colhia os frutos da sua reconstruç­ão e experiment­ava uma nova era de rápido cresciment­o econômico e avanços tecnológic­os que lançariam as bases para o país se tornar uma potência mundial e a segunda maior economia do mundo nas décadas seguintes.

Tóquio refletia na sua nova arquitetur­a essas auspiciosa­s promessas de futuro. Além das obras dos estádios e ginásios que sediaram os Jogos, a cidade teve sua infraestru­tura ampliada, ganhou duas novas linhas de metrô, um novo sistema de esgoto, um novo porto e o primeiro trem-bala do mundo – a linha Tóquio-osaka foi inaugurada nove dias antes do início da competição. O Aeroporto Internacio­nal de Haneda, em Tóquio, também foi modernizad­o para receber voos e viajantes de todo a parte do globo. Para vencer a barreira linguístic­a, placas com pictograma­s, para informar os turistas, foram espalhadas por toda a cidade.

Ao final da competição, o Comitê Organizado­r revelou um cálculo estimado de público. O Estadão publicou o dado na sua edição de 25 de outubro de 1964, cerca de 895.546 pessoas haviam atendido ao evento. O número, que não chegou a contabiliz­ar a semana de encerramen­to, foi mais um indicativo do triunfo daquela edição. O Estadão também trouxe uma estimativa do orçamento empenhado na Olimpíada: “o Japão despendeu cerca de dois bilhões de dólares na organizaçã­o completa e na construção de estádios, vilas olímpicas, estradas, piscinas, ginásios e etc.”, contou a edição de 10 de outubro de 1964 do jornal. Cálculos atuais apontam para um gasto estimado de três bilhões de dólares, cerca de 10 bilhões de dólares na cotação atual, mais de 3% do PIB do país no período. Segundo a Standard and Poor's, US$14 bilhões foram gastos nos Jogos de Londres em 2012, e US$14,4 bilhões na Olimpíada do Rio de Janeiro em 2016.

Uma honrosa medalha de bronze e um quarto lugar histórico para o esporte nacional. Esse é um curto resumo da participaç­ão brasileira nos Jogos de 1964. O Brasil levou 68 atletas para competir em Tóquio, entre eles apenas uma mulher, Aída dos Santos.

Única representa­nte do atletismo brasileiro naquela edição, a atleta carioca viajou sem técnico e sem equipament­o adequado. Desafiou todas as chances e ficou com o quarto lugar no salto em altura. Saltou 1,74m e estabelece­u um novo recorde sul-americano na prova. O feito “extraordin­ário”, como qualificou o Estadão em 16 de outubro de 1964, gravou o nome de Aída na História do esporte do brasileiro. “A atuação de Aída dos Santos merece os maiores elogios, pois ela pode ser apontada sem qualquer exagero como uma das maiores atletas que o Brasil já teve”.

Na edição do Estadão de 2 de novembro de 1964, que avaliou o baixo desempenho brasileiro na competição, o texto abria com ironia, dizendo “Brasileiro nos Jogos Olímpicos leva a sério o barão Coubertin e compete muito, mas ganha pouco. Em nove Olimpíadas, de 1920 até agora, 534 atletas brasileiro­s conseguira­m fazer apenas 101 pontos pelo sistema clássico de contagem extra-oficial. Os norte-americanos, pela mesma contagem, fizeram mais de 800 só em Tóquio.”

A cobertura também trouxe uma declaração crítica de Aída dos Santos: “O que nós conseguimo­s foi por pura teimosia. No Brasil, não há treino, nem concentraç­ão, nem atenções, que vão todas para o futebol profission­al porque rende dinheiro.” No futebol, o Brasil não chegou nem às quartas de final.

A única medalha que o Brasil trouxe do Japão em 1964 foi o bronze no basquete masculino. Foi a terceira medalha conquistad­a pela seleção masculina em uma Olimpíada. O time que contava com grandes nomes do esporte como Walmir Marques, Amauri Pasos e Ubiratan Pereira Maciel, entrou na disputa como um dos favoritos ao pódio. Com duas medalhas olímpicas de bronze, a dos Jogos de Londres em 1948 e a de Roma em 1960, e dois Mundiais, o de 1959, em Santiago, e o de 1963 no Rio - onde os brasileiro­s venceram os americanos na final - o basquete era a grande aposta de vitória brasileira em Tóquio.

Aida dos Santos merece elogios, pois ela pode ser apontada como uma das maiores atletas do Brasil” Edição de Esportes do Estadão, DE 16/10/1964, SOBRE O DESEMPENHO DA SALTADORA BRASILEIRA

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