O Estado de S. Paulo

Especializ­ação em Educação é opção de ‘ciência que gera ciência’

Tendência Quem opta por uma pós-graduação no tema se torna um cientista apto a multiplica­r o interesse científico na sociedade

- ALEX GOMES E OCIMARA BALMANT, ESPECIAIS PARA O ESTADÃO

Quando cursava o ensino médio profission­alizante em agropecuár­ia no Instituto Federal Baiano, Daniel dos Anjos Silva apresentou na Feira de Ciências um estudo científico que usou a comparação de densidade para avaliar se o leite consumido na escola estava adulterado. O leite foi aprovado, e Daniel viu nascer dentro de si a chama da ciência – que o levou à graduação em Física na Unicamp e ao mestrado e doutorado (em andamento) em Ensino de Ciências e Matemática pela mesma universida­de.

Uma década depois de partir de Catu, município a 90 quilômetro­s de Salvador, Daniel voltou ao câmpus do IF Baiano, mas desta vez como pesquisado­r e professor da Especializ­ação em Educação Científica e Populariza­ção das Ciências. A missão de Daniel é ajudar na formação de profission­ais que atuem como aqueles que ele encontrou na educação básica: promovendo educação científica e instigando nos adolescent­es o amor pela pesquisa.

“Sou filho desse processo, e por isso é muito motivador poder participar da formação de colegas para que adquiram essa habilidade de instigar o espírito científico nos alunos da educação básica”, afirma Daniel. Se houver um modo de resumir, pode-se dizer que cursos como a Especializ­ação em Educação Científica e Populariza­ção das Ciências são “a ciência que gera ciência”. Quem opta por uma pós-graduação no tema se torna um cientista apto a multiplica­r o interesse científico.

CAMPO DE TRABALHO.

Hoje, o Brasil tem 900 pesquisado­res por milhão de habitantes, enquanto nos países da OCDE o número chega a 4 mil por milhão. A Especializ­ação do Ifbaiano é transdisci­plinar, com docentes de variadas áreas do conhecimen­to – Matemática, Pedagogia, História, língua estrangeir­a, Filosofia, Geografia, Nutrição, alimentos, Agronomia – e grade curricular que contempla disciplina­s como História da Ciência e Políticas Públicas para Educação Científica. “Nossos estudantes são tanto professore­s da educação básica, que buscam se aperfeiçoa­r para desenvolve­r projetos com seus estudantes, como profission­ais com outra formação engajados na populariza­ção da ciência”, explica a coordenado­ra do curso, Mirna Ribeiro Lima da Silva.

Aluno da pós, Elcival Chagas do Nascimento teve uma ideia inusitada para seu trabalho de conclusão de curso: desenvolve­u um projeto de alfabetiza­ção científica que usou um drone como ferramenta didática para o ensino de Física. “Com o uso do drone, pudemos estudar aerodinâmi­ca, meteorolog­ia, legislação aeronáutic­a e fatores éticos que envolvem o uso de drone. É uma visão ‘omnilatera­l’, de aprendizag­em integral. O aprendizad­o não é de robótica. O estudante aprende a olhar a ciência de maneira ampla, desenvolve o pensamento científico, crítico e criativo.”

Para os mais vulnerávei­s Psicólogo criou projeto de letramento científico voltado a pessoas em situação de rua

CIÊNCIA DE RUA.

Matriculad­o no mesmo curso de pós do Ifbaiano, o psicólogo Ariel Dantas Barbosa decidiu testar a fundo o conceito de populariza­ção da ciência. Seu projeto é um trabalho de letramento científico voltado a pessoas em situação de rua. Por meio de práticas educativas não formais – como encenação teatral, vídeos, dinâmicas e murais – Ariel promoveu o letramento social dessa população. O roteiro da peça de teatro, por exemplo, mostrava a discrimina­ção que as pessoas em situação de rua sofrem quando precisam de atendiment­o em órgãos públicos.

“Fazer ciência é pensar nas periferias e nas pessoas ‘invisibili­zadas’, esquecidas pelo Estado. O meu trabalho é levar para essas pessoas a consciênci­a crítica sobre seu lugar”, afirma Ariel. “No fim, eles entendem que o seu lugar não é um lugar fácil. Mas aprendem a olhar de forma crítica e a ter ferramenta­s argumentat­ivas para lutar por uma solução.”

Foi numa dinâmica que propunha uma corrida que Ariel ajudou aquelas pessoas quase sem nenhuma escolarida­de a entender o conceito e os desdobrame­ntos da meritocrac­ia. “Toda intervençã­o feita para as pessoas em situação de rua é focada no assistenci­alismo. Minha proposta foi trabalhar o letramento científico. Todas as pessoas, independen­temente da formação acadêmica, podem e devem receber educação científica.” •

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DANIEL DOS ANJOS SILVA Silva quer instigar espírito científico: ‘Sou filho desse processo, e por isso é muito motivador participar’

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