O Estado de S. Paulo

Ai que saudades do alimento barato

- Celso Ming celso.ming@estadao.com COMENTARIS­TA DE ECONOMIA

Aqui e no resto do mundo, os preços dos alimentos disparam. E disparam mais só porque dispararam. Veja as razões.

O Índice de Preços de Alimentos da FAO (ONU), que atingiu a máxima histórica em março, encerrou abril com média de 158,5 pontos – 36,4 pontos acima do registrado no mesmo mês de 2021 (veja o gráfico). Nestes quatro meses e pico deste ano, as cotações do trigo em dólares saltaram 45,7%; do milho, 36,5%; e as da soja, 23,1%.

Alimentos e combustíve­is são os itens que mais vêm puxando a inflação em todo o mundo. Neste ano, os preços dos alimentos que compõem o custo de vida medido pelo IPCA subiram 7,05%. Não são apenas os preços dos combustíve­is que seguem o critério de paridade internacio­nal (cotações em dólar convertido­s em reais pelo câmbio da hora). Também os dos alimentos seguem esse regime, mas ninguém reclama disso. Embora produzidos com custos em reais, os preços do óleo de cozinha, os das rações animais e os das carnes também sofrem o impacto das cotações da Bolsa de Chicago e do câmbio.

Três fatores explicam quase tudo nessa disparada. Os preços começaram a subir quando a economia mundial começou a se recuperar da pandemia e a demanda aumentou. E foram catapultad­os com a guerra na Ucrânia, país que possui terras de grande fertilidad­e, mas agora está devastado e paralisado pela invasão das tropas russas. Na última semana, a Ucrânia acusou o governo russo de sumir com alguns dos seus estoques de trigo.

A guerra produziu mais dois efeitos diretos: aumento da desorganiz­ação dos fluxos de comércio e queda da importação de cereais (trigo, centeio e semente de girassol) da Rússia, em consequênc­ia das sanções econômicas

O segundo fator de alta global tem a ver com problemas climáticos na China, na Índia e nos Estados Unidos, que castigam a produção, mas com impacto ainda a ser mensurado.

O terceiro fator que explica a disparada é a reação defensiva dos governos cada vez mais preocupado­s com a segurança alimentar. Se espalham pelo mundo o protecioni­smo comercial e o reforço dos estoques, para evitar desabastec­imento.

A alta só não é maior porque a China foi obrigada a desacelera­r sua economia para enfrentar o novo surto de covid. E porque, com a guerra, o resto do mundo também passa por certa redução da atividade econômica.

No Brasil, não há riscos de desabastec­imento. Não se espera nem mesmo falta de fertilizan­tes. As safras baterão novos recordes. Só os preços que foram para a lua.

Falta saber qual será o impacto eleitoral do brutal encarecime­nto do pão e do prato de comida do brasileiro. •

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