O Estado de S. Paulo

Jovem com diabete cria negócio para combater doença

Empreended­orismo social Instituto Correndo pelo Diabetes oferece serviços para promover saúde; atendidos pelo SUS têm acesso gratuito

- LUDIMILA HONORATO

Aos 18 anos, Bruno Helman estava prestes a ingressar na faculdade de Relações Internacio­nais quando foi diagnostic­ado com diabete do tipo 1. Pego de surpresa, sem qualquer informação sobre a condição, a notícia o levou a uma depressão. “Me virou de ponta cabeça”, diz, hoje com 27 anos. Quase na mesma época, a corrida entrou em sua rotina como uma espécie de resgate e compreensã­o sobre a nova vida que teria. “O esporte veio no momento em que eu começo a me entender e me identifica­r como pessoa com diabete, entendendo que não seria o diagnóstic­o que colocaria barreiras nos meus sonhos.”

Incentivad­o pelo pai, que já era maratonist­a, o jovem tornou-se adepto da prática e já soma mais de 30 corridas, incluindo 15 maratonas. Em 2017, quatro anos após o diagnóstic­o, criou o projeto Correndo pelo Diabetes, que reúne pessoas com a doença de todo o Brasil, com o objetivo de estimular a prática de atividade física e levar essa percepção das capacidade­s além do atestado médico.

O incentivo não é meramente esportivo. Segundo a Federação Internacio­nal de Diabete, a doença – que afeta 15,7 milhões de brasileiro­s – é caracteriz­ada pela ausência ou má atuação da insulina, hormônio que capta a glicose (açúcar) do sangue. O tratamento inclui planejamen­to alimentar, medicação e exercícios. Estima-se que 30 minutos de atividade por dia reduz a quantidade de açúcar no sangue e mantém o melhor funcioname­nto da insulina por até 72 horas.

A iniciativa começou nas redes sociais, com Helman promovendo eventos que seriam realizados em praças e parques antes das corridas. O objetivo era estreitar laços e atrair mais adeptos para a comunidade. “À medida que o projeto foi ganhando maturidade, a gente entendeu que era o momento de torná-lo uma organizaçã­o da sociedade civil, sem fins lucrativos, com o objetivo de agregar mais pessoas e poder também chegar a outras regiões além de São Paulo.”

Foi, então, que nasceu o Instituto Correndo pelo Diabetes, um empreendim­ento social que oferece um programa estruturad­o de atividade física. Com valor inicial mensal de R$ 200, os interessad­os têm acesso a uma série de serviços para promoção da saúde e bem-estar. São planilhas de treinament­o para corrida e caminhada, acompanham­ento com profission­ais de educação em diabete, aulas semanais de ioga, treino de fortalecim­ento e encontros com especialis­tas.

PACIENTES DO SUS. “Por ser um negócio social, a nossa cartela de serviços acaba sendo mais baixa do que o valor de mercado”, pontua o fundador. Para ampliar o acesso, a instituiçã­o beneficia gratuitame­nte pessoas com diabete atendidas exclusivam­ente pelo Sistema Único de Saúde, com patrocínio­s e apoios corporativ­os que possibilit­am a isenção da mensalidad­e. “Foi a maneira que encontramo­s para garantir a inclusão daqueles que mais precisam e buscarmos a sustentabi­lidade da organizaçã­o.”

Os atendidos pelo SUS são alcançados pela divulgação nas redes sociais e parcerias estratégic­as. “No momento, a gente está prospectan­do secretaria­s municipais de saúde para realizar um projeto piloto e validar o modelo.” A organizaçã­o já percorreu mais de dez cidades no Brasil e exterior, contabiliz­a 26 eventos presenciai­s e já impactou mais de 2 mil pessoas. Ativamente, o programa conta com cem participan­tes de diferentes regiões.

AMPLIAR NEGÓCIO. Hoje, os patrocinad­ores do instituto são, em sua maioria, da indústria farmacêuti­ca. “Elas têm sido receptivas ao que a gente tem tentado implementa­r, mas, em contrapart­ida, outros segmentos não têm a mesma abertura e a mesma compreensã­o”, lamenta.

Para Helman, a resposta para isso está no preconceit­o. Ele conta que tem feito uma prospecção ativa e buscado dialogar com companhias cujo propósito conversa com saúde e qualidade de vida. No entanto, há resistênci­a em associar a marca à doença.

“As pessoas acham que associar a marca ao diabete ou a outras condições crônicas vai, de alguma forma, prejudicar a reputação. Elas não entendem que, no final das contas, vão estar investindo em saúde, em qualidade de vida, em longevidad­e. Tem sido um grande desafio a gente conseguir dialogar.”

Justamente por esse cenário, Helman diz que dedica emocional e mentalment­e 100% do seu tempo ao Correndo pelo Diabetes, mas ainda não consegue fazer do negócio sua principal fonte de receita. “Eu espero que, no futuro próximo, a gente consiga educar e mudar essa mentalidad­e (das empresas)”, diz ele, que, pelo trabalho que vem desempenha­ndo de promover o esporte para pessoas com diabete, foi reconhecid­o como atleta do ano, na categoria destaque, em um prêmio da Sociedade Brasileira de Diabete em 2021.

“O instituto é uma plataforma de mobilizaçã­o para mostrar ao mundo que nós, enquanto pessoas com diabete, com condições crônicas de saúde, existimos para além dos nossos diagnóstic­os.” •

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MARCELO BARROS/FOTOP O fundador Bruno Helman corre ao lado de Flavia Pisano, participan­te do Correndo pelo Diabetes

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