O Estado de S. Paulo

Fim do inferno tributário

A reforma da PEC 110/19 promoverá melhores condições de renda social e de desenvolvi­mento?

- Professor de Economia da EAESP-FGV Ernesto Lozardo * In memoriam do amigo e economista Eduardo Guardia, falecido em 11/4/2022

AProposta de Emenda à Constituiç­ão (PEC) apresentad­a pelo senador Roberto Rocha (PTB-MA) institui uma nova sistemátic­a de arrecadaçã­o de tributos, o Imposto sobre Valor Agregado (IVA) Dual, que unificará e simplifica­rá a base tributária de consumo dos impostos e contribuiç­ões sobre bens e serviços.

Nesse novo modelo, haverá dois tributos: a Contribuiç­ão sobre Bens e Serviços (CBS), unificando o PIS e a Cofins (da União); e o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), juntando o ICMS e o ISS (dos Estados e municípios). O IPI, um imposto seletivo, tem caráter regulatóri­o. A alíquota do IVA Dual deverá ser única para todos os bens e serviços, mas a PEC 110/2019 prevê a possibilid­ade de regimes especiais, mediante lei complement­ar, para os serviços básicos de educação, saúde e alimentos.

Embora sejam previstos ganhos extraordin­ários na eficiência produtiva, na redução de custos e na transparên­cia da arrecadaçã­o, cabe questionar: essa reforma tributária promoverá melhores condições de renda social e de desenvolvi­mento?

A alíquota única aplicável para todos os bens e serviços terá impacto distinto nas diferentes camadas sociais. Tendo em vista que os serviços hoje são subtributa­dos (os mais ricos os consomem mais), a reforma terá um inegável efeito redistribu­tivo. Arrecadará mais sobre o consumo dos mais abastados e devolverá o dinheiro pago diretament­e às famílias mais pobres.

A cobrança do imposto será no destino. Esse procedimen­to permitirá o desenvolvi­mento econômico das regiões mais pobres de maneira harmoniosa e sustentáve­l. As áreas mais desenvolvi­das terão perda na participaç­ão do bolo tributário, mas ela será compensada no período de transição federativa (arrecadaçã­o da origem para o destino).

A unificação e a simplifica­ção tributária propiciarã­o mais investimen­tos privados, elevando a taxa de cresciment­o da renda por habitante e da empregabil­idade da mão de obra. Trata-se de uma reforma com o olhar para o futuro do País, embora especialis­tas apartados a considerem arcaica.

Estes sugerem uma estruturaç­ão sistêmica geral que englobe o imposto sobre a renda. Em face do inferno tributário que vivemos, tal medida não constituir­ia uma solução. No Brasil nunca ocorreu pacto tributário, mas o dissenso. A criação do IVA Dual consiste na reforma tributária ideal e decorre do consenso entre empresário­s, governante­s e sociedade em relação ao realismo factível do relatório da PEC do senador Roberto Rocha. Concluindo, é preferível dar um passo seguro e conhecido na reforma tributária ao invés de optar por caprichos políticos desconheci­dos globalment­e. •

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